Bibliot3ca FERNANDO PESSOA

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Consolidação das estruturas da Maçonaria brasileira e Portuguesa no Século XIX

Jair Barbosa Araújo*

Resumo

Durante o século XIX, a maçonaria brasileira e portuguesa já havia se tornado uma instituição de abrangência internacional. Este fenómeno se deu em função da consolidação das suas estruturas em instituições federadas. Nos dois casos esta estruturação foi fortalecida pelo processo de unificação de suas Potências. No caso do Grande Oriente Lusitano Unido a união ocorreu em 1969 com a fusão de três das quatro obediências existentes em Portugal: Grande Oriente Lusitano, a Federação Maçónica Portuguesa, o Grande Oriente Português e parte do Supremo Conselho do Grau 33 – que funcionaram sob influência da maçonaria de matriz francesa. Para seu funcionamento, foi de fundamental importância o reconhecimento de outros Orientes, a exemplo do Grande Oriente do Brasil. Como vimos, essa conjuntura foi fundamental para emergir o principal veículo de comunicação entre as maçonarias do Brasil e de Portugal: O Boletim do GOLU, fonte primária de investigação neste estudo.

Por este motivo, nos interessamos por fazer um levantamento das principais notícias veiculadas neste impresso, notadamente, com destaque para os acontecimentos vivificados no Brasil e que foram recepcionados pela maçonaria portuguesa. Para isto, fizemos um levantamento em todos os Boletins publicados no período de 1969-1909, disponíveis em acervos públicos e particulares. Em seguida classificamos as notícias: a) Visitas de personalidades ilustres da política brasileira em solo luso; b) Ajuda mútua (visitas recomendadas, Viagens subsidiadas com aporte financeiro maçónico, Abono de dívidas de maçons nas lojas, Donativos maçónicos para despesas oriundas dos conflitos e Informes fúnebres); c) Miscelânea das notícias vinculadas nos boletins, nomeadamente: Cisão da Ordem, guerras e Emancipação dos servos, Exaltação da República do Brasil e Ecos (ressonâncias de incentivos) para república em Portugal. Porém, fez-se necessário caracterizar o Boletim como fonte histórica, elencando todos os elementos que o compõem relacionando-o com documento histórico.

Por meio desta investigação podemos demonstrar a existência não só de um diálogo permanente entre o GOLU e GOB, mas também uma relação de reciprocidade e de influências daquilo que acontecia no Brasil e era divulgado em Portugal, como os movimentos que vislumbravam a democracia e a liberdade política, consubstanciado na afirmação do republicanismo. Uma vez sabermos que a maçonaria foi participe tanto da formação como do desfecho da República nos dois lados do Atlântico.

Texto completo da tese disponível na íntegra em https://core.ac.uk/download/pdf/19132550.pdf

Conclusão

Com este trabalho conseguimos demonstrar que o Boletim Official do GOLU possibilitou a comunicação entre as Potências Maçónicas brasileira e portuguesa, nomeadamente entre o GOB e o GOLU. Por seu meio, pudemos detectar que os Ecos que chegavam do Brasil foram usados nos trabalhos deste Oriente como forma de manter e mostrar a aproximação que existia entre as duas maçonarias. Distribuídos de forma cronológica, os Ecos que encontramos permitiram-nos surpreender o processo político ideológico que compôs a irmandade dos pedreiros livres em Portugal, desde a formação da estrutura do Grande Oriente Lusitano Unido (1869) até sua paulatina republicanização nos finais de oitocentos. Em simultâneo, também foi possível verificar seus impactos e impressões na maçonaria, e conseguiu-se registrar alguns momentos relevantes das relações entre os dois países.

De facto, tendo em vista a amplitude de temas do Boletim, podemos dizer que o estudo realizado comporta diversos tipos de enfoque[1]. Cada um dos Ecos observados bastaria para explicar as peculiaridades da maçonaria portuguesa no início da contemporaneidade. Esta comprovação nos revelou a própria importância da nossa fonte primária de pesquisa e, ainda, a pujança da sua própria história. Conforme colocamos no primeiro capítulo, este periódico contém não só factos e emoções que marcaram a trajetória política e ideológica da instituição, mas também a comprovação do seu uso como instrumento estratégico de propaganda e controle por parte do GOLU.

Na mesma importância foram as fontes secundárias nos períodos em que o Boletim deixou de ser editado, ou quando este sofreu interrupções momentâneas. Referimo-nos aos jornais veiculados da época. Selecionar as ligações das informações do Boletim com estas fontes de pesquisa exigiram que fossemos cautelosos nas reflexões sobre as matérias noticiadas. Isto só foi possível porque os diretores desta imprensa diária eram também membros da maçonaria portuguesa, a exemplo do A Vanguarda, dirigido por Magalhães Lima que ocupou o grão mestrado do GOLU por um longo período.

Quanto aos acontecimentos históricos que povoaram as páginas do Boletim Oficial do GOLU, elegemos os que estavam relacionados com nosso tema e analisamos diante do cenário em que estes se desenvolveram. Em todo caso, demos primazia às notícias que falavam de temas referentes aos factos sociais e políticos ocorridos no Brasil Império e, posteriormente, Republicano. Tratamos de suas incidências associadas à cisão ocorrida entre o GOL de Lavradio e de Beneditino, de questão religiosa, de abolição da escravidão, de visita de autoridades brasileiras, do trânsito de membros nos Orientes, de ajuda mútua, entre outros temas.

Nestes destacamos como principais questões: a) o caso do dissídio entre Lavradio e Beneditinos, que teve as pranchas publicadas no Boletim, e serviu para comprovarmos as trocas de informações entre os orientes português e brasileiro com seus efeitos, revelando, em grande medida, o poder de interferência do GOLU na maçonaria brasileira, que tem como pano de fundo o debate que envolve a questão do constitucionalismo da ordem, a sua cultura jurídica, a sua administração e a sua relação com instituições diversas; este caso é emblemático, pois confirma que as dissidências na ordem eram fruto das incidências política ideológicas que atraiam as elites políticas da época no mundo profano; b) questão religiosa, no episódio de interdição das irmandades do Pará e Pernambuco, na qual houve uma forte reação por parte dos maçons portugueses que não tardaram, além de apoiar a maçonaria brasileira, em usar o ocorrido para protestar contra o congregacionismo em Portugal, pelo Boletim o GOLU protestava contra uma atitude típica do jesuitismo; c) durante o processo que culminaria com o comércio de escravo, o Brasil teve, por vezes, seu nome citado como sendo uma pátria de progressista. d) no trânsito dos maçons que se davam de forma constante e não intenso e tinha na razão de sua existência inúmeras motivações – trabalho, turismo, em missão aos Orientes em estudo, prestigiar eventos, etc.; d) no auxílio mútuo que, por exemplo, sempre vigorou entre seus membros, realidade que não foi estranha à intensificação de emigração, que tem como ocorrência de movimentos de torna viagem. Todos estes acontecidos foram permeados por todo um debate político ideológico onde o GOLU, mediante cada grão mestrado, deu um tratamento específico. Para entendermos este facto, levamos em consideração a presença, nesse cenário, de lutas políticas de diversos teores, que tinha o envolvimento das questões religiosas e das republicanas. Por conta disto, a reciprocidade entre os irmãos e os orientes, no Brasil e em Portugal, ocorreu de forma muito intensa.

Desta forma, por meio de uma interpretação analítica de suas histórias, fizemos uma adequação desses acontecimentos de modo a posicionar o Brasil como sendo interlocutor, e Portugal receptor. Nessa história, enveredamos por entender os efeitos das mudanças no Brasil na ordem portuguesa a partir da sua realidade peninsular. Pois mesmo que desde a instalação da Ordem no Brasil houvesse sempre a presença da influência portuguesa, no 153 período que aqui privilegiamos, intensificou-se a troca de informações maçónicas brasileiras em Portugal.

A elaboração e publicação do Boletim só foram possíveis devido a criação do GOLU. Foi sua estrutura intelectual e financeira que viabilizou confecção, distribuição e pessoas para ler suas tiragens. Igualmente, sua ambiência repleta de debates político e ideológico, comprometeu sua utilidade, pois o material a ser publicado dependia do grupo que detinha o comando do Oriente. Por esta razão, na primeira fase do GOLU (1869), sua edição foi marcada pelas interferências de personalidades que lideravam as principais facções monárquico-liberais. No entanto, a partir de novecentos e depois 1909, passou pela interferência do grupo mais progressista e alinhado com o republicanismo na sociedade portuguesa. Na verdade, foi sobrevivendo toda esta trajetória, de 1869 a 1909, que o imprenso conseguiu guardar as histórias que culminaram com a vitória do pensamento liberal laicista, positivista e republicano em Portugal.

Quanto aos acontecimentos do Brasil transmitidos no Boletim, podemos dizer que estes foram contribuidores para, sob seu intermédio, possibilitar a oportunidade de discutir e propagar temas mais progressistas no GOLU, sobretudo pelos grupos mais engajados nas ideias liberais, laicista, positivista e republicanas. Serviu, em última análise, como meio de contestação contra os desmandos do monarquismo constitucional ligado a clero católico em Portugal, que tolhia a liberdade de pensamento e expressão.

 

NOTAS

[1] Durante nosso estudo sobre os ecos da maçonaria brasileira em Portugal identificamos muitos subtemas que poderão ser melhor investigado em trabalhos futuros como: a maçonaria portuguesa e a escravidão brasileira, os emigrantes maçons portugueses que regressaram do Brasil, a república brasileira como modelo seguido em solo luso, entre outros.

 

*ALUNO: JAIR BARBOSA ARAÚJO

ORIENTADOR: Professor Doutor Fernando Catroga

Título da Dissertação “BOLETIM OFFICIAL do GOLU: diálogo da Maçonaria Portuguesa e Brasileira (1 8 6 9 – 1 9 0 9)”

Trabalho de conclusão do Mestrado em História Contemporânea e Estudos Internacionais Comparativos da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra

2 comentários em “Consolidação das estruturas da Maçonaria brasileira e Portuguesa no Século XIX

  1. Só não entendi porque Jair Barbosa mencionou em sua dissertação de mestrado que D. Pedro II foi iniciado maçom com tanta convicção (embora não tenha mencionado fonte). D. Pedro II nunca foi maçom: de onde ele tirou isso?

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  2. Só não entendi porque Jair Barbosa mencionou em sua dissertação de mestrado que D. Pedro II foi iniciado maçom cm tanta convicção (embora não tenha mencionado fonte). D. Pedro II nunca foi maçom: de onde ele tirou isso?

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