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A Egrégora

Publicado em FREEMASON.PT

Por: João Anatalino Rodrigues:

Egrégora

A primeira jóia do Tesouro Arcano que encontramos na Maçonaria é a chamada Egrégora [1]. É através desta estrutura tipicamente arquetípica, que habita no Inconsciente Colectivo da humanidade desde os seus primórdios, que o objectivo espiritual buscado pelo iniciado nos Mistérios da Arte Real se realiza.

Egrégora, (do grego egrêgorein) significa velar, vigiar. É um termo que designa o antigo costume grego de “concentrar” o povo numa assembleia, com a mente voltada para um determinado objectivo. Era um costume muito utilizado em época de guerra ou de grandes acontecimentos importantes da vida do povo grego. Com o tempo, este costume tornou-se uma verdadeira tradição popular, invadindo todos os segmentos da vida do povo helénico, sendo praticada na religião, através dos festivais conhecidos como Mistérios [2], nos desportos, por ocasião das famosas Olimpíadas, e até na política, quando as assembleias eram convocadas na praça pública (ágora) para resolver assuntos importantes para as cidades gregas..

Este tipo de costume já pode ser verificado entre os gregos mais antigos, como se percebe nas obras de Homero, particularmente a Ilíada, onde as assembleias dos povos argivos, “concentradas” para planear a guerra contra os troianos, nos mostram como funcionava o espírito da Egrégora entre os gregos.

A existência de entidades denominadas egrégoros tornou-se objecto de uma crença que hoje constitui base para métodos de  treino nas empresas e nos grupos de influência na moderna sociedade. Acredita-se que os egrégoros são centelhas de energia espiritual manifestadas pelas mentes em estreita união, e que estes podem influenciar os acontecimentos no mundo físico.

Estas “entidades” estão presentes em todas as colectividades, sejam nas mais simples associações, ou mesmo nas assembleias religiosas, geradas pelo somatório de energias físicas, emocionais e mentais de duas ou mais pessoas, quando se reúnem com qualquer finalidade. Neste conceito cabe, inclusive, o famoso ensinamento de Jesus, segundo o qual “ele estaria no meio” de qualquer grupo que se reunisse em seu nome.

Desta forma, podemos dizer que todos os agrupamentos humanos formam os seus egrégoros particulares. Por isso nós os encontraremos nas empresas, nos clubes, nas igrejas, nas famílias, nas equipes esportivas, e em todas as associações de pessoas onde as energias físicas e espirituais dos indivíduos são eliciadas para “trabalhar” por um resultado.

A ideia é a de quando um grupo se reúne e promove sinergia, a energia que é gerada por ele fabrica uma espécie de corrente que influencia o meio em que ela actua. Ela seria a força que dá efectividade a um grupo de oração, a uma equipe esportiva, aos grupos de trabalho, etc.

Desta forma, egregóros podem ser vistos como esferas de energia, emanadas dos indivíduos agrupados e ligados mentalmente por um objectivo comum. São como átomos que se agrupam e formam uma “central de energia”, que aproveita aos objectivos do grupo e também favorece a cada um dos indivíduos pessoalmente.

Hoje o conceito de Egrégora esta disseminado por todas as actividades que envolvem trabalho de grupo. Num hospital, por exemplo, todo o ambiente é preparado para formar uma “central” destinada a concentrar energias para a cura dos pacientes. Numa fábrica, uma empresa comercial, uma equipe de futebol, os exercícios colectivos, as orações comunitárias, os momentos de reflexão e concentração, são estratégias usadas para arregimentar a energia do grupo.

Assim, uma Egrégora caracteriza-se pelo espírito de congregação, que é formado pela soma das manifestações mentais emitidas pelo grupo e que a todos beneficia, individual e colectivamente. Daí este termo ser constantemente utilizado na prática maçónica.

A Egrégora maçónica

A Maçonaria é uma estrutura mental arquetípica, cuja origem repousa na ideia de que existe uma ordem social perfeita que pode ser realizada pela união dos homens de boa vontade. Esta união promove o aprimoramento dos espíritos nela congregados, como resultado da Egrégora que resulta da sinergia obtida pela reunião dos Irmãos, a qual é sustentada pelas qualidades pessoais que cada um deles trás para o grupo.  Esta Egrégora promove, de um lado o desenvolvimento colectivo, permitindo a realização dos seus objectivos, e de outro o enriquecimento ontológico de cada um dos indivíduos dele participante.

Sabemos que como ideia, a Maçonaria é contemporânea das primeiras civilizações. Desde os tempos mais antigos, os povos que alcançaram os mais altos estágios civilizatórios, cultivam a tradição de preservar a sua cultura, os seus conhecimentos e as suas conquistas através da reunião, em Egrégora, de grupos específicos de indivíduos que comungam de interesses mútuos. Estes grupos formam-se por cooptação, procurando reunir, da forma mais nivelada possível, os “iguais” dentro de uma sociedade, fundamentados na crença de que aqueles que estão mais envolvidos com determinado sistema é que tem maior interesse em preservar os seus valores.

É neste amplo espectro, que funde religião, política, mitologia e história, que iremos encontrar, por exemplo, as antigas manifestações culturais conhecidas como Mistérios, que vários autores maçons costumam invocar como sendo as estruturas mais antigas da Maçonaria.  Aqui caminhamos nas sombras e só podemos fazer conjecturas baseadas em analogias entre os ritos praticados por aqueles povos e os símbolos comuns compartilhados por eles e pela Maçonaria moderna, mas é certo que existe uma ligação e uma relação de antecedente e consequente entre essas manifestações espirituais dos antigos povos e a Arte Real hoje praticada. E o vínculo que os une é justamente a ideia da Egrégora, sendo a prática iniciática presente em todos eles nada mais que uma estratégia desenvolvida para captar a energia emanada do grupo e dirigi-la para a consecução dos seus objectivos.

Com o tempo esta ideia evoluiu para uma prática social que resultou na formação dos grupos diversos dentro das sociedades. Assim, a Egrégora, que em princípio tinha uma conotação religiosa e servia ao próprio sistema de governo praticado nesses antigos tempos, fragmentou-se e passou a ser usada por grupos particulares na defesa dos seus interesses corporativos. O egregôrein tornou-se uma estratégia de organização social e ganhou uma aplicação prática na forma de corporações associativas, formadas para os mais diversos fins.

Nasceram assim as associações de classe, as corporações obreiras, os partidos políticos, os clubes sociais, mas agora já despregados da concepção original, que hospedava um misto de religiosidade, componentes raciais e até política de estado. O objectivo passou a ser a defesa das próprias conquistas do grupo, a sua preservação como sistema corporativo e o desenvolvimento e o compartilhamento de valores culturais, económicos e sociais.

Situam-se neste espectro as antigas corporações de obreiros, tipo “Collegia Fabrorum” dos romanos, as Corporações de Ofício da Idade Média (guildas) e as chamadas Lojas operativas dos pedreiros medievais, famosos construtores de igrejas e edifícios públicos, dos quais o termo Maçom foi emprestado. Todas estas corporações tinham, na estrutura nuclear dos seus fundamentos, uma noção de Egrégora a uni-los.

Notas

[1] A Egrégora é a ideia que enforma a tradição cultivada pelas equipes esportivas, especialmente as de futebol, de se concentrarem antes das partidas. Na Maçonaria ela está presente um na tradição da “corrente da união”, quando é transmitida a “palavra semestral”.

[2] Mistérios, aqui são identificados como festivais iniciáticos que os povos antigos costumavam praticar para honrar os seus deuses e obter as suas graças.

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