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Por João Anatalino Rodrigues

História
No grau 25 os iniciandos recebem o título de Cavaleiro da Serpente de Bronze. Esta denominação é certamente proveniente da Bíblia, derivada do episódio em que Moisés, na época em os israelitas peregrinavam pelo deserto, mandou fundir uma serpente de bronze com o objectivo de curar as pessoas que fossem picadas por esse tipo de réptil.
Esta passagem consta das crónicas bíblicas e mostra bem o quanto o simbolismo da serpente era utilizado entre os povos antigos para a demonstração de poder, ou conotar qualquer tipo de malefício.
Diz o Ritual do grau que os israelitas, após a saída do Egipto, estavam peregrinando pelo deserto, sofrendo fome e sede. Então começaram a reclamar e criticar Moisés por tê-los tirado do Egipto para levá-los à morte no deserto. Ocorre que a determinação para que eles deixassem o Egipto e peregrinassem pelo deserto era do próprio Grande Arquitecto do Universo. As queixas dos israelitas foram tomadas como rebelião, razão pela qual Ele mandou contra eles uma praga de serpentes, cujas mordidas queimavam como fogo. Como muitos israelitas estivessem morrendo em consequência das picadas desses répteis, Moisés mandou fundir uma serpente de bronze e a colocou no centro do acampamento. Todo aquele que fosse picado por uma serpente sarava olhando para o ídolo de bronze. Esta é a interpretação exotérica da lenda [1].
A outra tradição que se refere à Serpente de Bronze remonta às Cruzadas. Conta-se que quando Godofredo de Bulhões capturou Jerusalém, ele teria fundado uma Ordem denominada Cavaleiros da Serpente de Bronze, cuja função seria a de proteger os peregrinos cristãos nas suas visitas à Terra Santa, dando-lhes também abrigo e cuidados médicos [2].
Sabemos que tal Ordem realmente existiu e foram duas e não uma, como é referido na tradição citada. Estas Ordens foram as dos Cavaleiros Templários, cuja tarefa era a protecção dos peregrinos que visitavam a Terra Santa e os Hospitalários, a quem incumbia prestar-lhes assistência médica e asilo. Eram Ordens com funções bem definidas, de carácter iniciático, sendo que ambas legaram à Maçonaria uma boa parte das suas tradições [3].
Outros significados
Jean Palou, por seu lado, confere ao grau 25 uma natureza cristológica e hermetista, fundamentado no episódio bíblico em que Moisés levanta no deserto uma serpente de bronze para servir de defesa aos hebreus peregrinos contra a mordida desses répteis, e cita também o Evangelho de São João, cap. III, vers. 14 e 15, em que Cristo é comparado à serpente de bronze de Moisés, no sentido de que ele salva as pessoas que nele creem, da mesma forma que a serpente de Moisés curava aqueles que eram picados por elas [4].
O que o grau releva, todavia, é fundamentalmente uma questão de fé. A serpente e o emblema do Cristo crucificado têm o mesmo significado, como bem lembrou Charbonneau-Lassay. Para os cristãos, o Cristo na cruz representa o mesmo que a serpente de bronze representava para os hebreus no deserto. Quem olhava para ela, e acreditava, ficava curado, da mesma forma que aquele que crê no sacrifício do Cristo crucificado alcança a cura do corpo e da alma [5].
Cagliostro, no entanto, defendia a inspiração egípcia do grau 25, a partir da tradição daquele povo em atribuir à serpente determinados poderes, relacionados com as energias que regem a vida do universo. Na visão daquele famoso Maçom, a simbologia da serpente, nos ritos iniciáticos ocidentais, seria equivalente a tradição védica da Kundalini, a serpente tântrica que representa a energia cósmica, e se manifesta nas pessoas através das chacras existentes no corpo humano, quando o iniciado pratica a kundalini yoga [6].
Os egípcios tinham em grande conta o poder da serpente. Ela representava situações que envolviam tanto o bem quanto o mal. Na Tuat, a terra intermediaria que a alma do morto deveria atravessar até atingir a luz, o monstro que mais os apavorava era exactamente a serpente Apépi, fera devoradora de almas, símbolo de Seth, o deus do mal. Mas a serpente também aparecia constantemente na iconografia egípcia como representação de poder. Em todas as pinturas, os faraós e as divindades aparecem usando a coroa ornada pela uraeus, a serpente enrodilhada, que representava o ciclo energético do universo, que a si mesmo se alimenta num fluxo ininterrupto.
Tradicionalmente a chamada “serpente de bronze” é uma alegoria que representa o ceptro real usado por Moisés, na condição de príncipe egípcio que era. Os reis egípcios usavam um ceptro folheado em bronze, em forma de serpente. Dizia-se que esse ceptro possuía propriedades mágicas, capaz de promover o rejuvenescimento das pessoas, da mesma forma que a serpentes “rejuvenescem” trocando de pele.
Nos rituais de sagração dos reis egípcios, os chamados festivais sed, era costume a realização de rituais em que a “lepra”, sinal de degeneração, era curada pelo toque do cajado mágico, promovendo a regeneração. Uma dessas cenas, de regeneração pelo cajado mágico é reproduzida na tumba de Kheruef, a camareira da rainha Tiye, esposa de Amenhotep III, pai do faraó Akhenaton. Moisés utiliza as duas alegorias, tanto da lepra que é curada, quanto da serpente de bronze, para mostrar aos hebreus o poder da sua doutrina regeneradora.
Na Maçonaria dos graus superiores, o Cajado de Abraão e a Serpente de Bronze fundem-se para formar a alegoria do Tau.
O Cajado de Aarão
Na verdade, o simbolismo da Serpente de Bronze tem origem com o episódio bíblico do Cajado de Aarão. Moisés pediu a Aarão e a cada um dos doze líderes das tribos de Israel que trouxessem ao Tabernáculo uma vara de vime e nela escrevessem o nome de cada um deles. Isto foi feito para que o Grande Arquitecto do Universo escolhesse um deles para ser o líder de todos, dizendo: “a vara de quem pela manhã estiver florida, esse será o líder e não mais suscitareis discórdias entre vós.”
E sucedeu que a vara que floresceu foi a de Aarão e isso confirmou a sua escolha como Sumo Sacerdote. E a Vara de Aarão, que é a Vara da Confirmação, também é uma alegoria que se liga à tradição da espada flamígera, pois é com ela que se confirmam todos os direitos adquiridos pelos Irmãos dentro das Lojas [7].
- Do livro “Mestres do Universo” – Ed. 24×7 – São Paulo, 2010
Notas
[1] Segundo a Doutrina Secreta, Jeová converte-se em serpente de fogo para “morder” os israelitas descrentes e em serpente de bronze para curar os arrependidos. Essa aparente dicotomia revela o carácter polarístico da Matéria e do Espírito e a luta pela vida entre os dois princípios manifestados no espaço e tempo. É a luta pelo equilíbrio cósmico que está ali representado.
[2] O significado esotérico é aquele informado no capítulo VI.
[3] A Ordem dos Hospitalários deu origem aos hospitais que hoje conhecemos como Santas Casas de Misericórdia. A esse respeito veja-se o estudo publicado no nosso site no Recanto das Letras.
[4] Jean Palou, op citado, pg. 189.
[5] Idem, pg.199.
[6] Exercícios que, na pratica Iogue tem por fim conduzir o iniciado a iluminação.
[7] Números, 17: 1,2,3,4
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Muito bom
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