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Eu trabalhei no programa americano de drones. O público deve saber o que realmente está acontecendo

Tradução José Filardo

Poucos dos políticos que tão descaradamente proclamam os benefícios dos drones têm a menor ideia de como eles realmente funcionam (e não funcionam).

Por  Heather LinebaughThe Guardian

 

Um drone Elbit Systems Hermes 450.
Um drone Elbit Systems Hermes 450. Foto: AFP / Getty Images

Sempre que leio comentários de políticos defendendo o programa Unmanned Aerial Vehicle Predator and Reaper – vulgarmente chamados drones – eu gostaria de poder fazer-lhes algumas perguntas. Eu começaria com: “Quantas mulheres e crianças você já viu incinerados por um míssil Hellfire?” E: “Quantos homens você já viu rastejando através de um campo, tentando chegar até o edifício mais próximo para obter ajuda enquanto sangra de pernas decepadas” Ou ainda mais incisivamente: “Quantos soldados você já viu morrer ao lado de uma estrada no Afeganistão porque os nossos UAVs [drones] sempre tão precisos não foram capazes de detectar um IED [dispositivo explosivo improvisado] que aguardava seu comboio? ”

Poucos destes políticos que tão descaradamente proclamam os benefícios de drones têm ideia real do que realmente se passa. Eu, por outro lado, vio essas cenas terríveis em primeira mão.

Eu sabia os nomes de alguns dos jovens soldados que vi sangrar até a morte do lado de uma estrada. Eu assisti a dezenas de homens em idade militar morrer no Afeganistão, em campos vazios, às margens de córregos e alguns mesmo em frente ao complexo onde suas famílias estavam esperando que eles voltassem para casa da mesquita.

Os militares norte-americanos e britânicos  insistem em  afirmar que este é um programa especial, mas é curioso que eles sentem a necessidade de fornecer  informações falhas, pouca ou nenhuma estatística sobre mortes de civis e relatórios distorcidos de tecnologia sobre os recursos dos nossos drones. Esses incidentes específicos não são isolados, e a taxa de vítimas civis não mudou, apesar do que nossos representantes da defesa gostariam de nos dizer.

O que o público precisa entender é que o vídeo fornecido por um drone geralmente não é claro o suficiente para detectar alguém portando uma arma, mesmo em um dia cristalino com nuvens limitadas e luz perfeita. Isto torna incrivelmente difícil para os melhores analistas identificar se alguém tem armas, com certeza. Um exemplo vem à mente: “A transmissão é tão pixelizada, e se for uma pá e não uma arma?” Eu sentia essa confusão constantemente, assim como meus colegas analistas de drones. Sempre me pergunto se nós matamos as pessoas certas, se colocamos em perigo as pessoas erradas, se destruímos uma vida de civil inocente devido a uma imagem ruim ou ângulo distorcido.

Também é importante para o público compreender que existem seres humanos operando e analisando as informações fornecidas por esses drones. Eu sei porque eu era um deles, e nada pode prepará-lo para uma rotina quase diária de voar missões de vigilância aérea de combate sobre uma zona de guerra. Os proponentes dos drones alegam que os soldados que fazem este tipo de trabalho não são afetados por observar esse combate, porque eles nunca estão diretamente em perigo físico.

Mas aí é que está: Eu posso não ter estado no solo no Afeganistão, mas eu assistia partes do conflito em grande detalhe em uma tela durante dias a fio. Eu conheço a sensação que você experimenta quando vê alguém morrer. Horripilante é pouco. E quando você está exposto a isso repetidamente, isso se torna um pequeno vídeo, incorporado à sua cabeça, em repetição contínua, causando dor e sofrimento psicológicos que esperamos que muitas pessoas nunca experimentem. Operadores de drones são vítimas não só das memórias assustadoras desse trabalho que eles carregam consigo, mas também a culpa de estar sempre um pouco inseguro de quão precisas eram as suas confirmações de armas ou identificação de indivíduos hostis.

Claro, somos treinados para não sentir isso e combater tais sentimentos, e tornar-se amargo. Alguns soldados procuram ajuda em clínicas de saúde mental fornecidas pelos militares, mas estamos limitados ao que podemos falar e onde, devido à confidencialidade de nossas missões. Acho interessante que as estatísticas de suicídio nessa carreira não são relatadas, nem são os dados sobre quantos militares trabalhando como operadores de drones são fortemente medicado para depressão, distúrbios do sono e ansiedade.

Recentemente, o jornal The Guardian publicou um comentário do Secretário de Estado da Defesa da Inglaterra, Philip Hammond. Eu gostaria de poder conversar com ele sobre os dois amigos e colegas que eu perdi dentro de um ano após deixar o serviço militar, por suicídio. Tenho certeza que ele não foi notificado desse pequeno detalhe do programa secreto de drones, ou ele certamente daria uma olhada mais de perto em todo o escopo do programa antes de defendê-lo novamente.

Os drones no Oriente Médio são usados ​​como arma, e não como proteção, e enquanto o público permanecer ignorante quanto a isso, essa grave ameaça à santidade da vida humana – em casa e no exterior – continuará.

 

Um comentário em “Eu trabalhei no programa americano de drones. O público deve saber o que realmente está acontecendo

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