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As pessoas ficam menos religiosas quando as sociedades se tornam mais igualitárias?

Tradução José Filardo

Quando países adotam uma política social progressista, isso tende a criar um declínio na crença religiosa. Por quê?

Amanda Marcotte 25 de junho de 2012 |

Lenta mas seguramente, o monopólio histórico da religião sobre a mente humana está se estillhaçando. Em sua superfície, o motivo parece simples: a ascensão da democracia secular e especialmente do conhecimento científico deve incentivar mais pessoas a desistir da religião.

De fato, pesquisa recente do Centro Nacional de Pesquisa de Opinião da Universidade de Chicago mostra que o quadro em nível mundial é muito mais complexo do que isso. Enquanto o ateísmo está em ascensão em muitos lugares do mundo, outros estão vendo um aumento da religiosidade, criando uma situação onde os níveis de crença e não crença variam muito dependendo da cultura. Muito disso tem a ver com a história e cultura, mas um segmento intrigante pode ser retirado do quadro, que é o que parece ser uma forte correlação entre altas taxas de ateísmo e países que priorizam a igualdade econômica e fazem maiores investimentos em uma forte rede de segurança social, como, por exemplo, a França e os Países Baixos.

Poderiam políticas liberais ajudar a criar descrentes? Pesquisa anterior indica que, quando os países adotam uma política social progressista, isso tende a criar um declínio na crença religiosa. A teoria, muitas vezes chamada do “tese da secularização” é que a combinação de boa educação dos seus cidadãos e o fato de que os cidadãos podem confiar no governo ao invés da Igreja para o alívio da pobreza significa que mais pessoas se afastarão da religião. Mas poderiam as razões ir mais fundo do que isso? Poucas pessoas baseiam sua escolha de acreditar em Deus ou não em algo tão simples, como se eles podem ir para a Igreja ou o estado em momentos de necessidade. Talvez seja mais que a insegurança econômica em si que aumente o desejo de acreditar em Deus. E se os ateus querem minimizar o poder que a religião desempenha na sociedade, devem eles começar por exigir uma sociedade mais igualitária e segura?

Existe um corpo pesado de pesquisas demonstrando que quanto mais estresse e incerteza as pessoas enfrentam, mais provável se empenharão naquilo que os psicólogos chamam “pensamento mágico”: superstição, oração, crença no sobrenatural. Em 2008, Jennifer Whitson e Adam Galinsky publicaram um trabalho em Science demonstrando que, quando você remove a quantidade de controle que as pessoas têm sobre sua situação, elas tendem a se envolver mais na “percepção de padrão ilusório,” que é o processo psicológico que cria a crença no sobrenatural. Outra pesquisa mostrou os reais efeitos desta tendência psicológica, mostrando, por exemplo, que pessoas vivendo em zonas de guerra tendem a se envolver mais em pensamento mágico, tais como carregar consigo amuletos da sorte ou acreditar no poder da oração, do que aqueles que não vivem em zona de guerra.

Podemos observar esses efeitos em situações comuns, onde as pessoas sentem falta de controle. Tomemos, por exemplo, o fã de esportes que geralmente é uma pessoa racional, mas, no entanto, se recusa a lavar sua camiseta favorita por medo de que isso fará sua equipe perder. Ou a pessoa geralmente não supersticiosa que, quando jogando dados em um cassino, sopra sobre os dados antes de os rolar para ter boa sorte. Quando não temos controle sobre os resultados, às vezes, tentamos recuperar a sensação de controle, imaginando que realmente estamos exercendo controle através de meios sobrenaturais invisíveis. Religião tem muito mais tradição e poder por trás dela do que as superstições de todos os dias, mas psicologicamente, o processo pode ser semelhante. As pessoas procuram meios sobrenaturais para exercer controle sobre situações que elas não podem influenciar através de meios do mundo real.

Viver em um país com um rede de segurança social ruim e alta desigualdade de renda significa, para a maioria dos seus cidadãos, viver uma vida perseguida por constante insegurança e perda da sensação de controle. As pessoas se preocupam mais com perder seus empregos, e se elas perdem seus empregos, elas se preocupam mais sobre com tornar-se desabrigados ou de outra forma cair na pobreza. Pessoas sem a garantia de acesso aos cuidados de saúde preocupam-se mais sobre o que vai acontecer a elas se ficarem doentes. Pais em lugares onde o sistema de ensino é de má qualidade preocupam-se mais sobre o que vai acontecer aos seus filhos. Quanto menos controle eles sentem sobre seu próprio destino, mais tentador é evocar um Deus que pode salvá-lo em uma sociedade que não incomoda com eles.

Não é tanto que as pessoas acreditem que a Igreja virá em seu socorro em uma emergência. É que a crença em Deus lhes dá uma sensação de controle que lhes falta em suas vidas reais.

Dados esses padrões, faz sentido que a Rússia estivess, juntamente com Israel, no topo da lista dos países que tiveram o maior aumento na religiosidade nos últimos 20 anos. Uma grande parte disso, é claro, é devido ao fim do comunismo e de suas proibições sobre religião, permitindo que as pessoas retomassem a fé. Mas, outros países anteriormente comunistas, como o Republica Checa e a Polônia, não viram tal aumento do número de crentes. Na verdade, a República Checa assistiu a uma onda de ateísmo na década passada.

Naturalmente, os dois países não poderiam ser mais diferentes para os cidadãos comuns pós-comunismo. A Rússia tem sido um turbilhão de dificuldades políticas e econômicas, tornando-a um lugar notoriamente estressante para viver. A expectativa de vida na Rússia gira em torno de 68 anos, cerca de 10 anos menos que o padrão em nações ocidentais mais estáveis e prósperas. A República Checa, por outro lado, foi elogiada pela ONU por seu notavelmente elevado índice de desenvolvimento humano, que é a abreviação da medida da estabilidade e padrão de vida para o cidadão médio de um país. A expectativa de vida lá chegou a 77 anos, quase alcançando os países como Alemanha e França.

Ateus que não estão satisfeitos em simplesmente não acreditar, mas que também querem aumentar a secularização da sociedade e o número de ateus, precisam se posicionar atrás de uma agenda política progressista. Neste momento, os Estados Unidos está assistindo uma explosão na desigualdade de renda, alto desemprego e cortes cada vez mais graves na rede de segurança social. O resultado inevitável disso é mais estresse e mais sentimentos de perda de controle entre os americanos comuns. Se eles não vão encontrar a segurança e a proteção no mundo real, eles voltarão suas esperanças para um ser sobrenatural.

A ligação da religião com o poder está firmemente entrelaçada com as desgraças econômicas das pessoas. Se queremos construir uma sociedade mais secular, o primeiro passo é construir uma sociedade mais justa.

Amanda Marcotte co-escreve o blogue Pandagon. Ela é a autora de It’sa Jungle Out There: The Feminist Survival Guide to Politically Inhospitable Environments.

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