(I)
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- O pensamento gnóstico
- O Cristo Gnóstico
- O Cristianismo místico
- As fraternidades gnósticas -Templários e Cátaros
- A Gnose a Maçonaria
- Um casamento por amor
- Do operativo para o especulativo
O pensamento gnóstico
Quando os teólogos da Igreja Romana transformaram o Cristianismo numa ideologia de massa e vincularam-na à política do Império Romano como religião oficial, a maravilhosa doutrina do Mestre de Nazaré deixou de ser uma verdadeira ponte entre o sagrado e profano para se transformar em mais um instrumento ideológico. E assim também aconteceu com o Islamismo, o Judaísmo, o Bramanismo e todas as demais religiões que foram apropriadas pelos governantes e utilizadas como instrumento político de educação e controle das massas.
Neste sentido, Jesus também deixou de ser o Cristo, aquele que religaria as almas humanas com o Céu, para se tornar apenas mais um difusor de ideologias. O Jesus do Cristianismo oficial transformou-se em mais um filósofo, contestável e doutrinariamente insatisfatório para os espíritos que buscavam uma realidade divina, original e descontaminada das impurezas trazidas pelas ideologias políticas e raciais, que estão no cerne de todas as religiões.
Assim pensavam os gnósticos e por isso floresceram as teses defendidas por esta escola de pensamento, como tentativas de recuperar aquele Cristianismo messiânico e mágico que as primeiras comunidades cristãs professaram e que fez a força do novo credo. Surgiram então as diversas teses que procuravam explicar o universo através das mais estranhas e bizarras concepções. Foi assim que nasceu o conjunto de doutrinas místicas que se convencionou chamar-se de Gnose.
A ideia era a de que os filósofos podem ser contestados, os deuses não. A Igreja Romana transformara a mensagem divina, trazida por Jesus, numa filosofia de vida acomodatícia e materialista, fundamentada numa doutrina vazia de conteúdo espiritual, cujo único propósito era garantir o poder temporal para os governos que a adoptassem e o poder espiritual para os membros do seu clero. Os cristãos, nos primeiros séculos do Cristianismo e principalmente depois que se tornou a religião oficial do Império Romano, eram duplamente escravos, pensavam os gnósticos, pois na vida profana eram subjugados pelo estado romano e na vida espiritual serviam a um clero corrupto, arrogante e ganancioso.
Foi contra a massificação da mensagem de Jesus, a sua politização e transformação em instrumento do poder secular que as correntes gnósticas de pensamento se insurgiram. Os gnósticos cristãos dos primeiro século queriam preservar a pureza do conhecimento iniciático contido na mensagem cristã. Não acreditavam em nenhuma verdade revelada por um Deus particular e preconceituoso, como lhes parecia ser o Deus do Velho Testamento. A verdade, segundo a sensibilidade que os dominava, estava na própria criação que o Verdadeiro Deus espalhara sobre o universo e não na mensagem de uma igreja, ou de um grupo em particular.
Destarte, se o Deus do Velho Testamento era assim tão contestável, aquele que esta Igreja anunciava como sendo filho dele não o seria menos, diziam algumas seitas gnósticas. Por isso era preciso desvincular a doutrina de Jesus do Judaísmo tradicional e apresentá-lo sobre uma óptica nova.
Desta forma, o Cristo judeu fundiu-se com as divindades solares das antigas religiões, especialmente egípcia e persa, e dai nasceu um novo Deus, palatável para gregos e romanos que relutavam em abandonar as suas antigas deidades para adorar o filho de um carpinteiro que eles mesmos tinham crucificado. Foi assim que o Cristianismo venceu em Roma e se tornou o credo oficial.
O Cristo Gnóstico
Embora a Igreja de Roma jamais tenha reconhecido este facto, é preciso dizer que o Gnosticismo contribuiu bastante para essa vitória. Não foram os ensinamentos dos apóstolos originais de Jesus que deram sedimentação ao credo que se instalou em Roma, mas sim a doutrina de Paulo de Tarso, enxertada pelas teses gnósticas, o verdadeiro alicerce da nova crença adoptada pelos romanos. O Cristo de Paulo não é mesmo dos apóstolos que conviveram com Jesus. Estes acreditavam que Jesus era o Messias judeu e tinha vindo para cumprir as profecias antigas, de restabelecimento do reino de Israel. Paulo transformou Jesus no Cristhos universal, salvador da humanidade e não apenas de Israel.
Este conflito doutrinário transparece claramente nas crónicas dos Actos dos Apóstolos e nas Cartas Paulinas. O Cristo dos apóstolos não é um “deus”, no sentido que lhe deu Paulo e os gnósticos, mas sim um profeta maior, no mesmo nível de Moisés ou Elias, ou o Maomé dos muçulmanos. São filhos de homens que foram escolhidos por Deus para realizar uma missão na terra. E ainda que acreditassem que Jesus era, de facto, o emblemático Messias, uma espécie de semideus ansiosamente aguardado pelo povo de Israel para redimir a sua nação, jamais se cogitou, entre eles, de atribuir ao seu líder o status de uma verdadeira divindade, no mesmo nível de Jeová, o Deus único e universal, como os cristãos fizeram com Jesus.
Aliás, para os judeus, a ideia de que Jeová tivesse um filho, de posição hierárquica igual à dele no panteão divino, era uma verdadeira blasfémia, uma heresia que só podia mesmo ser punida com a morte. Foi essa a principal razão que levou Jesus à cruz, aliada à questão política, que pesou muito na balança, quando se aventou a possibilidade de que Jesus pudesse ser, realmente, o propalado Messias das profecias.
Assim, não passava pela cabeça dos discípulos de Jesus fazer dele um Deus, com estatura paritária ao próprio Jeová, pois este era o Deus universal e único. Uma ideia dessas jamais seria aceitável no universo judeu, e a simples menção dessa possibilidade já constituía blasfémia das grossas, crime capital, punível com a pena de morte.
Mas esta hierarquia existia no Mitraísmo, pois os discípulos de Mitra tinham feito dele uma divindade com posição semelhante à da divindade suprema, Ahura Mazda. E foi, portanto, na religião mitríaca que Paulo de Tarso e os gnósticos que o seguiram, foram buscar a concepção de um Cristo Universal, salvador da humanidade, e não apenas um redentor dos judeus, como estes queriam do seu Messias.
A condição divina de Cristo, encarnado em Jesus, começa a aparecer na obra de Paulo de Tarso e encontra o seu maior defensor no gnóstico João, autor do Quarto Evangelho. E a partir daí esta ideia extrapolou para fronteiras que até Paulo e João jamais imaginariam.

O Cristianismo místico
Na verdade, o Cristo judeu só foi aceito pelas elites do Império Romano porque ele se identificava com Mitra, a divindade de maior prestígio entre os romanos na época em que Constantino elegeu o Cristianismo como religião oficial do Império. Esta foi uma jogada de mestre do Imperador, que adiou por mais de cem anos a queda do Império Romano no Ocidente e forneceu as bases sobre as quais o Império Romano do Oriente sobreviveria por mais um milénio. A religião mitríaca, como vimos, era profundamente mística e agasalhava muitas teses semelhantes àquelas que os gnósticos professavam [1].
Da mesma forma que os sacerdotes egípcios e os mestres das religiões orientais, os gnósticos pensavam que o conhecimento do mundo divino só podia ser atingido através de uma adequada iniciação, onde a prática ritualística pudesse ser combinada com fórmulas apropriadas de meditação e invocação da divindade.
Acreditando que a popularização de um conhecimento que só podia ser obtido pela prática iniciática acabava por abastardá-lo, os gnósticos formavam pequenos grupos sectários, e no mais das vezes transmitiam a sua doutrina por via oral e quase sempre através de símbolos e alegorias. Nisso imitavam as antigas sociedades iniciáticas do Oriente e esta tradição foi transmitida para os hermetistas, que depois deles fundaram várias seitas iniciáticas para a sua conservação e transmissão [2].
Os gnósticos não devem ser confundidos com mágicos ou divulgadores de heresias religiosas, embora nas suas práticas apelassem constantemente para o pensamento mágico. Os seus temas são naturalmente religiosos e não poderiam deixar de ser, dada à própria cultura na qual estavam inseridos. Constituíam, na verdade, grupos de livre pensadores que recusavam qualquer dogma e deduziam os seus conhecimentos das grandes leis da natureza. Cultuavam o saber pelo saber, sem temores escatológicos. Pretendiam criar uma ciência do divino, uma teologia mística, cujo objectivo era a descoberta dos caminhos para a salvação do homem através do conhecimento, em oposição ao caminho da Igreja, que era o da fé, absoluta e incontestável, nas interpretações dos seus doutores.
A base da filosofia gnóstica era uma visão unificada do universo, onde tudo estava contido em tudo, o que estava em cima era igual ao que estava em baixo, o que estava dentro igual ao que estava fora. Esta era, segundo acreditavam, a primitiva composição do universo e a ela a sociedade dos homens, como um todo, e o espírito humano, como indivíduo, deviam aspirar.
A função do iniciado − o verdadeiro religioso − passava a ser a descoberta dessas realidades para unificá-las no seu espírito, atingindo assim a definitiva iluminação que constituía, na verdade, a única salvação que o homem poderia almejar. Esta noção teve nos chamados filósofos neoplatónicos os seus mais ferrenhos defensores, mas também encantou os pitagóricos, que nela incorporaram a subtileza das suas concepções matemáticas e geométricas a respeito da estrutura do universo e da actuação das forças divinas na sua formação. É claro que vários doutrinadores eclesiásticos aproveitaram essas ideias para justificarem as suas concepções acerca da natureza de Cristo e da proposta escatológica do Cristianismo para a humanidade. Daí encontrarmos várias seitas dentro da própria Igreja Católica desenvolvendo doutrinas que agasalhavam as mais estranhas concepções religiosas. Eram tantas e tão bizarras que a Igreja de Roma as censurou, colocando a maioria delas na conta das heresias [3].
As fraternidades gnósticas -Templários e Cátaros
Os gnósticos dos primeiros séculos formavam comunidades calcadas na interacção mestre-aprendiz, acreditando que tal prática gerava a energia necessária para alimentar a chama sagrada do conhecimento do divino (gnosis). O conhecimento só podia ser transmitido por iniciação e não por um processo de memorização e dedução. A sabedoria se obtinha por iluminação e não pela aprendizagem académica.
Em função disso, os gnósticos desprezavam o clero secular, que pensava preservar e desenvolver o conhecimento copiando e imitando as obras antigas. Considerando como ”ovelhas perdidas” os membros do clero regular, que para eles eram meros padres, enquanto eles se consideravam “monges”, os gnósticos formaram comunidades iniciáticas que se resguardavam do apelo popular e realizavam interacção somente entre os membros iniciados. Nisso integravam a tradição dos Antigos Mistérios, cujos praticantes eram profundamente hostis à popularização dos assuntos sagrados, com o momento em que viviam, em que a mensagem trazida por Jesus ganhava as ruas e se transformava em ideologia de massas.
Esta mesma fórmula viria a ser utilizada mais tarde pelos Cavaleiros Templários, o que, de certa forma, contribuiu para o afastamento deles da Igreja Romana. É possível que a transformação desta Ordem em sociedade iniciática tenha sido um dos principais motivos da sua condenação. Afinal, a maioria das acusações feitas a eles envolviam teses gnósticas que a Igreja havia repelido e condenado antes como heresias. Abstraindo os motivos políticos e económicos, que pesaram bastante na balança quando da extinção da Ordem do Templo e da prisão dos seus membros, pode-se dizer que os Templários foram condenados e tiveram a sua organização extinta justamente por agasalhar entre as suas práticas algumas ideias consideradas heréticas. Situam-se entre essas práticas o culto à deusa Ísis ( a lua crescente), o culto ao ídolo Baphomet, à serpente Ouroboros, os seus rituais de iniciação e de elevação, que eram claras reminiscências de antigos rituais de fertilidade. Embora o processo movido pela Igreja contra a Ordem dos Templários tenha sido publicado e nele se revele a face francamente herética (na visão católica) desta Irmandade, o facto é que o verdadeiro carácter dos seus rituais e a natureza da sua filosofia nunca foi, de facto, revelada, permanecendo, até hoje, um verdadeiro mistério. Mas o que parece indiscutível é que os Cavaleiros do Templo podem ser classificados como verdadeiros gnósticos, tal como seriam os seus sucedâneos mais próximos, os cátaros [4].
A Gnose a Maçonaria
De qualquer forma, em tudo que se refere à Maçonaria, estas informações são de extrema importância quando se trata de conhecer a sua origem e entender a sua filosofia. Ela contém raízes muito profundas na Gnose cristã. E embora a Gnose, como sistema de pensamento, tenha sobrevivido à actividade predadora que contra ela a Igreja tem praticado através dos séculos, foi através da prática maçónica que ela ganhou corpo entre a elite intelectual que se formou após o período cultural conhecido como Renascença. Através da Maçonaria a sociedade ocidental conservou também a tradição iniciática da fratria e a noção altamente espiritualizada da utopia e da egrégora. Assim, o pensamento mágico dos gnósticos e a noção corporativista dos antigos clãs se uniram para dar sedimento à estrutura filosófica da Arte Real.
É, pois, nestes arquétipos – a noção de um mundo mágico e harmónico que já existiu um dia (a utopia), e na crença de que o pensamento humano pode alcançá-lo através do estudo e da prática virtuosa (o pensamento mágico) − que a Maçonaria, enquanto disciplina espiritualista se alicerça. E é para este fim que ela congrega os seus membros em egrégora (A Loja), buscando na realização desse simbolismo o mesmo resultado que as antigas corporações iniciáticas obtinham nas suas práticas rituais.
Um casamento por amor
A nossa convicção é de que a interacção da Maçonaria com a tradição hermética e os ideais da cavalaria é uma herança que já vem do tempo das cruzadas. Na Terra Santa foram ensaiadas as primeiras tentativas de se criar um rito simbólico que pudesse integrar as tradições dessas três grandes vertentes da cultura medieval. Afinal, cavaleiros, mestres construtores e filósofos adeptos do pensamento gnóstico e da alquimia conviviam na Terra Santa e em diversos territórios da Europa e do Oriente Médio. E de alguma forma, o fundamento de suas filosofias, o cerne de suas esperanças e o objectivo de suas práticas eram os mesmos.
Com o que sonhavam, por exemplo, os Cavaleiros Templários, senão com a instituição de um reino universal cristão, onde os homens fossem governados pelas virtudes exigidas de um cavaleiro? Não teria sido, certamente, com esse objectivo, que a Ordem do Templo se tenha desenvolvido e se tornado uma potência económica, política e militar tão poderosa que, em certo momento tenha preocupado os potentados da época e o seu próprio patrono, o Papa?
E qual era o sonho hermético? Não era simplesmente, como se supõe, o de descobrir, pela manipulação química dos minerais, o segredo da fabricação de metais preciosos. O objectivo dos alquimistas, na verdade, era o mesmo dos filósofos gnósticos, ou seja, o de obter um conhecimento, uma gnosis, através do estudo da natureza e dos seus processos de transmutação dos minerais.
Desta forma, acreditavam os hermetistas (tanto alquimistas como filósofos gnósticos), que o próprio iniciado poderia realizar uma transmutação espiritual capaz de dotá-lo de uma consciência superior. E isto realizar-se-ia através da Gnose (iluminação pelo conhecimento) e não pela fé, como sustentava a crença da Igreja oficial.
Por outro lado, sabe-se que determinados ofícios, como o de construtor, eram sacralizados. Através da profissão o praticante pensava poder aperfeiçoar o seu espírito, quer dizer, à medida que a sua obra evoluísse, à medida que ela se tornasse perfeita, ele também se aperfeiçoava interiormente, por que a obra material nada mais era que o reflexo do seu espírito.
Por isso é que os segredos da sua arte eram transmitidos, não de forma académica ou simplesmente empírica, como nas disciplinas e práticas profissionais laicas, mas sim, de forma iniciática. Os maçons medievais (pedreiros-livres), desde épocas imemoriais sempre guardaram ciosamente os segredos da profissão, só os transmitindo por iniciação. Desta forma, os irmãos operativos, que guardavam os segredos da profissão e somente os transmitiam aos seus aprendizes, e os alquimistas, solitários pesquisadores dos segredos da natureza, que viviam reclusos nos seus laboratórios, e os amantes da filosofia oculta eram praticamente sócios da mesma esperança cultural. Daí o casamento entre estas três vertentes da cultural medieval − Maçonaria, Gnose e Hermetismo− foi uma união natural e necessária. Foi um casamento por amor e por interesse mútuo.
Do operativo para o especulativo
Partidários de um mesmo segredo e de um método semelhante para a transmissão dos conhecimentos obtidos nas suas práticas, não é estranho que em certo momento histórico pedreiros e arquitectos profissionais e intelectuais amantes do pensamento mágico acabassem se fundindo e se tornando uma única cultura.
Evidentemente tudo isto era visto com muita desconfiança pela Igreja medieval. Em 1314, a Ordem dos Templários tinha sido extinta pelo Papa Clemente IV após um rumoroso processo onde os seus membros foram acusados, julgados e condenados pela prática de heresia, homossexualismo, magia negra e outros crimes. Quanto aos alquimistas e os cultores da Gnose, estes nunca foram vistos com bons olhos pela Igreja. Um bom número de praticantes desta Arte, bem como cultores desta filosofia foi parar nas masmorras e não poucos pagaram com as suas vidas por ousarem praticar crenças diferentes daquelas que a Igreja medieval patrocinava.
Mas as corporações de obreiros da construção eram toleradas e até protegidas pela Igreja e pelas autoridades seculares. Os mestres construtores gozavam de alta reputação na sociedade medieval e não sem razão; afinal, eram eles que erguiam as grandes catedrais, os castelos fortificados, os sumptuosos edifícios públicos e os palácios reais. Era do maior interesse, portanto, tolerar os profissionais da construção e os artesãos que as ornamentavam, mesmo com as suas ideias esotéricas e as suas práticas corporativas.
Junto aos canteiros de obras formavam-se as Lojas dos maçons operativos, onde, a par dos assuntos profanos referentes aos interesses da classe, também se faziam as iniciações, as elevações de grau, a comunicação, sempre iniciática, dos segredos da profissão aos iniciantes aprendizes e a elevação dos novos mestres.
Com a interacção entre pedreiros-livres, cavaleiros e cultores da tradição hermética, começaram a surgir junto às Lojas operativas, grupos de estudo que se ocupavam, não somente dos segredos da profissão de construtor, mas também de discutir outros pontos da cultura da época. Desde as ideias gnósticas sobre religião, até as teses sobre políticas de desenvolvimento económico e social e campanhas militares, estes grupos começaram a atrair a atenção dos “espíritos de classe”, no dizer de Pawels e Bergier, dando nascimento a novos centros de cultura e saber.
Estes grupos formaram os núcleos iniciais da chamada Maçonaria especulativa. A sua função era a especulação pura e simples, mas desta prática sempre se extraiam acções que repercutiam no mundo exterior [5].
Sabe-se que as bases da chamada Renascença e da Reforma religiosa foram lançadas bem antes do século XVI, quando estes movimentos efectivamente explodiram. Já nos séculos XIII, XIV e XV, em regiões como o Languedoc francês, em Frandles, nos Países Baixos, em alguns reinos alemães e principalmente no norte da Itália, uma antecipação da época moderna já vinha ocorrendo, com a consolidação das monarquias nacionais e o fim da Guerra dos Cem Anos.
Os efeitos da Guerra dos Cem anos foram diversos, como reconhecem a maioria dos historiadores. Um destes efeitos foi a noção de unidade nacional desenvolvida principalmente pelos ingleses e franceses, que os ajudou a consolidar a ideia de Estado nacional em oposição ao regime feudal, atomizado e dividido politicamente. Após o término da Guerra de Cem Anos, o feudalismo foi praticamente extinto na Inglaterra em consequência da Guerra das Duas Rosas, da qual emergiu a dinastia dos Tudors. Na Alemanha e na Itália o regime feudal se extinguiu no século XV, mas em consequência da estrutura política destes países, divididos entre estados governados por príncipes e repúblicas fortemente armadas, e também muitos estados pontifícios, sob a influência directa do Papa, não se conseguiu, como na França, Inglaterra, Espanha e Portugal, organizar de pronto as monarquias nacionais. Em consequência, a Alemanha e a Itália só viriam conhecer uma definitiva unificação política no século XIX [6].
O comércio e a indústria floresceram em função das cruzadas. O contacto com a civilização árabe e bizantina trouxe para a Europa novas ideias e uma cultura até então desconhecida começou a ser implantada nos territórios onde a influência da Igreja não era monolítica. Poderosas corporações de oficio foram fundadas pelos profissionais de cada profissão nas cidades mais populosas. Estas corporações, como as Hansas dos mercadores de Frandles, Alemanha e França, acabaram tornando-se núcleos de grandes nações. A Suíça e a Holanda são exemplos de países formados por associações de comerciantes.
As corporações de ofício não se pareciam, como comumente se pensa, aos modernos sindicatos. Na verdade, os seus objectivos eram mais amplos. Constituíam verdadeiras Fraternidades que cuidavam não só da vida económica dos seus membros, mas também da sua vida social e religiosa. Desempenhavam papéis equivalentes aos das associações religiosas e faziam também o papel de sociedades beneficentes, companhias de seguros, clubes sociais, partidos políticos, etc.
Dominavam um largo espectro da vida económica medieval e o seu poder e influência era levada em muita conta pelas autoridades religiosas e seculares. Cada corporação tinha seus próprios estatutos e regras, bem como o seu santo padroeiro. As famosas Old Charges (Os Velhos Deveres), que comumente se invoca como sendo um estatuto da Maçonaria operativa, nada mais são que regras prescritas para os membros das corporações de oficio dos construtores ingleses e escoceses. São regras que exigem destes profissionais determinado tipo de comportamento social, bem como estabelecem certos “deveres”, relativos à atitude deles como membros da corporação. Desta forma, em estados ainda não organizados, com legislação esparsa e atomizada, muitas vezes de carácter apenas consuetudinário, as regras corporativas acabavam sendo muito mais impositivas de comportamento do que aquelas emanadas das autoridades.
Deste caldo de cultura sairia, em breve, o pensamento reformador que daria início ao movimento que conhecemos pelo nome de Renascimento.
(Continua – Ligação para a Parte II)
Notas
[1] Mitra era o deus preferido das legiões romanas.
[2] As chamadas seitas gnósticas, na sua grande maioria tinham o carácter de verdadeiras Fraternidades.
[3] Ver Sarane Alexandrian – História da Filosofia Oculta, citado.
[4] Sobre os Cavaleiros Templários e a sua relação com a Maçonaria veja-se a nossa obra “Mestres do Universo” já citada. Sobre os cátaros e a influência da Gnose na doutrina agasalhada pela tradição maçónica, veja-se o nosso trabalho “Conhecendo a Arte Real, publicado pela Ed. Madras, São Paulo, 2007.
[5] O Despertar dos Mágicos, op citado, pg. 123. Entre estes “círculos do saber” situa-se a famosa Royal Society inglesa, famoso clube de intelectuais e cientistas fundado em Londres em 1660. Entre os fundadores encontram-se vários nomes ligados à ciência e ao esoterismo, entre ele Robert Boyle e Sir Isaac Newton. Christopher Wren, o famoso arquitecto também faz parte desta lista.
[6] Mac Nail Burns, História da Civilização Ocidental, Rio de Janeiro, Ed. Globo, 1971.
O tesouro dos maçons (II)
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A renascença
No inicio do século XVI começa então a abertura cultural denominada Renascença. Assiste-se a uma revalorização do homem a partir dos antigos modelos greco-romano de beleza e competência pessoal. O culto ao humano, eclipsado durante a Idade Média pela valorização do ideal ascético, começa a ganhar os principais centros intelectuais da Europa. A ciência renova-se pelo apelo à razão mais do que à fé. Teorias racionais de explicação do universo contrastam com as velhas ideias admitidas pela Igreja. Explode a Reforma Protestante desencadeada pela rebeldia do frade alemão Martinho Lutero.
No meio disso tudo acontece uma revalorização do pensamento hermético e das teses gnósticas. Filósofos como Giordano Bruno, Thomas Mórus, Marcilio Ficcino, Pico de La Mirándola e outros ressuscitam as ideias de utopias políticas e religiões solares, em contraste com a ideia dominante do catolicismo universal, centrada na filosofia de Aristóteles e no heliocentrismo de Ptolomeu. Outros filósofos e artistas, como Leonardo da Vinci, Erasmo de Roterdão e Nicolau Maquiavel lançam as bases de uma nova ética e uma nova moral, enquanto cientistas como Galileu Galilei e Copérnico descortinam novos horizontes para a ciência.
Toda esta efervescência cultural logo se faria sentir no território mais subtil dos sentimentos humanos, que é a religião. A corrupção do clero católico e principalmente as motivações políticas e económicas desencadearam a revolução protestante conhecida como Reforma, mas foi, sem dúvida, a onda de liberdade de pensamento que se espalhou pela Europa durante os anos da Renascença que destruiu o monopólio da Igreja católica sobre o espírito da sociedade ocidental. Deste caldo de cultura viria a surgir o frade Martinho Lutero para incendiar de vez o pensamento ocidental com as bases da sua Reforma Religiosa.
Martinho Lutero e os Rosas-cruzes
Martinho Lutero (1483 – 1546) foi o desencadeador do movimento conhecido como Protestantismo. Não há qualquer informação que ligue a figura do inspirador da Reforma religiosa à Maçonaria, nem qualquer referência que possa sugerir uma interacção dele com os maçons operativos. Mas, na altura em que ele dava início ao maior e mais importante cisma que o Cristianismo viria a sofrer nas sua história, estes já constituíam um importante fenómeno cultural, difundido por toda a Europa, principalmente na Alemanha, onde ele começou a sua pregação.
Em razão da liberdade de consciência e da condição de pedreiros livres que ostentavam, podendo mover-se livremente pelo território europeu sem os incómodos burocráticos a que estavam sujeitos os demais cidadãos, esses profissionais e os intelectuais que eles tinham admitido nas suas corporações, devem ter-se constituído em importante canal para as ideias do frade alemão. Assim, face às ligações já apontadas, que Martinho Lutero mantinha com os círculos místicos da Alemanha, não seria imprudente apontá-lo como simpatizante das ideias daquele grupo precursor que viria dar origem ao movimento Rosa-Cruz, fundado pelo alquimista Johannes Valentin Andreas, no início do século XVII, cuja influência na Maçonaria foi fundamental para o direccionamento que ela tomou enquanto fenómeno cultural.
No início do século XVII aparecem os Manifestos Rosas-cruzes. Noutras obras da nossa autoria já tratamos desse curioso facto cultural com mais pormenores [7]. Por enquanto é suficiente dizer que graças às pesquisas de Serge Huttin e Francês Yates sabe-se hoje que a Rosa-Cruz, como instituição, naquela época, jamais existiu. Tratou-se, na verdade, de um grupo de pensadores místicos, predominantemente alemães, que diziam estar de posse de grandes segredos capazes de mudar a face da história da humanidade [8].
Tais assertivas excitaram, como é óbvio, a imaginação popular e não poucos intelectuais se sentiram atraídos pela “Fraternidade da Rosa-Cruz”. Estes pensadores, na verdade, nada mais faziam do que divulgar teses e tradições herméticas desenvolvidas por alquimistas e filósofos gnósticos. Os seus segredos eram aqueles que os alquimistas diziam ter descoberto nos seus “magistérios”. Grupos destes “rosacrucianos” faziam parte activa das Lojas especulativas alemãs, francesas e inglesas e tinham introduzido nos rituais dessas Lojas símbolos, alegorias, evocações e ensinamentos extraídos da tradição hermética e gnóstica. O termo “rosa-cruz” tornou-se sinónimo de livre-pensador. Todo intelectual que não se conformava com a “saia justa” que as autoridades religiosas queriam impor ao pensamento se dizia, ou se julgava um “rosacruciano”. Voltaire, Isaac Newton, Leonardo da Vinci, Miguel Ângelo, entre outros, eram tidos como “rosacrucianos.”
Durante todo o século XVII as Lojas especulativas da Europa conviveriam com esta verdadeira Babel intelectual em que se tornara a prática maçónica. Maçons alquimistas, maçons gnósticos, maçons cavaleiros, cada qual, conforme escreveu H. P. Marcy, “interpretando à sua vontade as Velhas Constituições (as Old Charges), criando uma profusão de maneiras de fazer uma iniciação, de conduzir uma reunião, de interpretar os símbolos e os ensinamentos maçónicos.” [9].
“Esta diversidade,” prossegue o autor, poderia “destruir a unidade moral que permanecia como único vínculo entre os maçons aceitos. A confusão aumenta todos os dias e a velha instituição ameaça falir sem esperança de recuperação” [10].
Em tese, podemos dizer que os Manifestos Rosas-cruzes foram os correspondentes herméticos da doutrina professada na Maçonaria especulativa e anteciparam em mais de um século os estatutos da Ordem, porquanto agasalharam nas suas propostas a ideia de Irmandade que a ordem maçónica mundial iria perseguir nos seus objectivos [11].
Os maçons aceitos
Um sistema de pensamento que fosse tolerante o suficiente para agasalhar todas as vertentes do pensamento religioso e secular não se podia filiar em nenhum credo, nem podia propagar as suas ideias pela forma académica regular. Em algum momento, provavelmente no início do século XVII, a tradição hermética entrou nos ritos praticados pelos maçons das Lojas operativas, transformando-as em Lojas especulativas. Como isto se deu não é matéria pacífica, mas de forma geral se admite que este facto aconteceu pela admissão, entre os profissionais da construção, de membros não pertencentes às suas categorias.
Estes eram os chamados “maçons aceitos”. Entre eles se encontravam militares, filósofos, intelectuais, professores, membros do clero, comerciantes etc., pessoas que de alguma forma procuravam um meio seguro de expressar os seus pensamentos sem precisar de renunciar às suas crenças.
Não há consenso entre os historiadores de quem teria sido o primeiro Maçom especulativo, ou seja, a primeira pessoa não pertencente aos quadros profissionais dos pedreiros livres a ser admitida como membro nas suas Lojas. O mais antigo registro de uma iniciação desse tipo é o de John Boswell, lorde de Aushinleck, que em 8 de Junho de 1600 foi recebido como Maçom aceito na Loja Saint Mary’s Chapell (Loja da Capela de Santa Maria), em Edimburgo, na Escócia. Esta Loja teria sido fundada em 1228 no canteiro de obras preparado para a construção da Capela de Santa Maria, naquela cidade, que então era a mais importante da Escócia. Era costume, naquela época, a organização de Lojas entre os pedreiros, pois assim se chamavam às assembleias dos obreiros que se reuniam para discutir sobre os assuntos referentes às obras e à profissão.
Após a iniciação de Lorde Bosswel, o processo de aceitação de maçons não profissionais tornar-se-ia comum. Logo se espalharia pelos canteiros de obras da Escócia, Inglaterra, Alemanha, França e outros países, de tal maneira que ao final do século XVI, o número de maçons aceitos − então chamados de especulativos − ultrapassou os operativos. Assim, na primeira metade do século XVII, encontram-se registros de várias pessoas importantes na sociedade dos seus respectivos países sendo admitidas nas Lojas dos pedreiros livres. Nomes como os de William Wilson, aceito em 1622, Robert Murray, tenente-general do exército escocês, recebido, em 1641, na Loja da Capela de Santa Maria, que se tornou posteriormente Mestre Geral de todas as Lojas do Exército; o coronel Henry Mainwairing, recebido, em 1646, numa Loja de Warrington, no Lancashire, e o famoso antiquário e alquimista Elias Ashmole, recebido na mesma Loja e no mesmo dia (16 de Outubro) que o coronel Henry.
Na área da arquitectura, nessa altura, os maçons operativos já tinham perdido a maior parte do seu prestígio, uma vez que a forma arquitectónica tradicional deles, a gótica, havia caído em desuso, eclipsada pelo modelo neoclássico. Porém, em 2 de Setembro de 1666, um grande incêndio irrompeu na cidade de Londres, destruindo mais da metade da cidade − cerca de quarenta mil casas e oitenta e seis igrejas. Nesta ocasião, os maçons operativos foram chamados para participar do esforço de reconstrução da cidade, sob a direcção do renomado mestre arquitecto Christopher Wren, que foi logo iniciado Maçom. Foi no canteiro de construção da igreja de S. Paulo, presidido por ele, que em 1691, foi fundada a Loja São Paulo (em alusão à igreja), conhecida como Loja da taberna “O Ganso e a Grelha”, uma das quatro que, em 1717, iria, juntamente com as outras três Lojas londrinas, se unirem para a fundação da Grande Loja de Londres. Nasceria dessa fusão a Maçonaria moderna, na sua forma institucional [12].
Geralmente costuma-se atribuir a Elias Ashmole a introdução do hermetismo na Maçonaria. Este intelectual inglês, que entrou para a Ordem em 1641, conforme as suas próprias anotações, era um notável hermetista especializado em alquimia e estudioso das tradições da cavalaria. É impossível não pensar que um indivíduo com este perfil não tivesse prestado qualquer contribuição de vulto nesse sentido. Todavia, em 1641, como vimos, as Lojas maçónicas já praticavam ritos enxertados com a tradição hermética e “aceitavam” pessoas não ligadas ao oficio de construtor. E esta prática já vinha de longa data, a se acreditar nas pesquisas de Jean Palou e Robert Ambelain [13].
Por outro lado, a primazia de John Bosswel como sendo o primeiro Maçom aceito de que se tem notícia tem sido contestada por alguns autores que afirmam que numa Loja de Bolonha, Itália, já existia, no Século XIII, dez irmãos admitidos nessa condição. Esta informação estaria contida na chamada Carta de Bolonha, datada de 1248, o que faz deste documento o mais antigo texto maçónico até hoje recenseado.
Efectivamente, a publicação da Carta de Bolonha, presumindo que se trata de um documento verdadeiro, coloca em xeque as teses de que a Maçonaria especulativa teria origem principalmente nas Ilhas Britânicas, a partir da admissão de Lorde Bosswel e outras figuras importantes da sociedade inglesa e escocesa. Este documento, oriundo de uma Loja italiana, mostra que a tradição de ordenar como companheiro Maçom profissionais de outras categorias já era usada no século XIII, e não se iniciou no século XVI como usualmente se pensava [14].
Assim, o que se pode presumir é que Ashmole e o seu grupo de hermetistas entraram para a Maçonaria como consequência dessa prática, mas não se constituíram, de forma alguma, na sua causa. É possível que Ashmole tenha de algum modo, executado um trabalho de organização, desenvolvimento e propagação dos ritos maçónicos na nova formulação que as Lojas especulativas inglesas estavam praticando, desde que nelas se introduziram os cultores da tradição hermética, mas disso, como de resto, não temos provas que confirmem essa assertiva.
A Constituição de Anderson
Foi para por um fim a esta confusão que as quatro Grandes Lojas de Londres se fundiram no ano de 1717, dando início à chamada Maçonaria moderna. Moderna porque a partir deste acontecimento a Ordem maçónica, que era um conjunto de homens que se reuniam para praticar a arte do livre pensar, ganhou um regulamento, como se o pensamento pudesse ser regulado. M. Lapage, bastante sagaz a respeito, comentou lastimosamente que “a partir do dia nefasto em que (…) a Maçonaria se deu chefes e regulamentos gerais, (…) os maçons rejeitaram a mais bela ideia maçónica, isto é,“ o Maçom livre na loja livre [15].
Evidentemente, a tentativa dos maçons londrinos, de por ordem na casa, (Ordo ab Chao) não foi aceita pacificamente no mundo maçónico. Fosse na Alemanha, ou em França, onde as tradições templárias e herméticas tinham deitado raízes profundas nas práticas maçónicas, uma chamada de ordem, feita especialmente por ingleses, só podia mesmo causar repulsa e consternação. Nem os trabalhos de Désaguliers, Ramsay, Radclyffe e outros chamados “pais da Maçonaria moderna” foram suficientes para acalmar os ânimos. Maçonarias Escocesa, Francesa, Alemã, Martinista, de Boillon, etc. eram títulos dados a diferentes ramos que se espalhavam pelas Ilhas Britânicas e pelo continente europeu e americano nos meados do século XVIII, dando origem a uma profusão de rituais, sistemas e filiações que se dividiram em Ritos propriamente ditos, como o Rito Escocês Antigo e Aceito, o Rito Escocês Rectificado, o Rito Adonhiramita, O Rito da Estrita Observância, o Rito de Heredon, o Rito de Mênfis, O Rito de York, Rito Templário, de Misrain, etc.
Hoje, pacificada a disputa que se estabeleceu entre as diversas confissões maçónicas, disputas que no mais das vezes reflectiram os embates políticos que deram origem ao mundo moderno, podemos dizer que esta luta continua, entretanto, no terreno conceitual. Há maçons que propugnam por uma Maçonaria mais actuante nos assuntos políticos e sociais, ora agindo filantropicamente, ora participando de cruzadas políticas em favor desta ou daquela ideia. Há os maçons que vêem a Ordem como uma escola de pensamento onde se deve cultivar exclusivamente moral e ética, e há também os que levam a sério a ideia de uma Maçonaria simbólica e iniciática, nos melhores moldes dos especulativos anteriores a 1717.
Para nós o que fica não é a filiação a esta ou aquela linha de pensamento ou acção, mas sim a ideia de que a Maçonaria, como filosofia de vida e exercício espiritual, é um conjunto de arquétipos emuladores de virtude e catalisadores dos mais nobres sentimentos que uma pessoa pode desenvolver. E é nesse sentido que se deve estudá-la e praticá-la. As consequências que daí são extraídas ficam por conta dos objectivos de cada Irmão. O Tesouro Arcano que ela contém pode ser aproveitado por todos os Irmãos, independente da concepção que ele faça da Arte Real. O carácter sem mácula (erguer templos à virtude) e a luta contra toda forma de opressão ao espírito humano (cavar masmorras ao vício) são a pedra filosofal a ser encontrada pelo Maçom. A via escolhida é opção de cada um [16].
Notas
[7] Conhecendo a Arte Real, citada.
[8] Serge Hutin – História da Alquimia – Cultrix, São Paulo, 1987
― Frances Yates, O Iluminismo Rosa-Cruz, Cultrix, São Paulo, 1967
[9] Jean Palou, op citado, pg. 35.
[10] Idem, op citado pg. 48.
[11] São vários os trabalhos alquímicos que tratam da filosofia Rosa-Cruz. Os dois manifestos mais famosos, entretanto, são o “Fama e Fraternitatis” e o “Confessio Fraternitatis”, ambos publicados pela primeira vez em 1614 e 1615 respectivamente. Os Manifestos Rosas-cruzes falam da criação de uma “Fraternidade mundial de sábios”, congregada para a prática do bem e o desenvolvimento das ciências, objectivo que também faz parte dos postulados da Maçonaria.
[12] Jean Palou – A Maçonaria Simbólica e Iniciática, op citado.
[13] Idem, pg. 78.
― Robert Ambelain – A Franco-Maçonaria, Ibrasa, São Paulo, 1999.
[14] Eugénio Bonvicini – Maçonaria do Rito Escocês – Ed. Athanor – Roma, 1988.
[15] Ibidem, pg. 50
[16] Alusão à prática da alquimia, segundo a qual a pedra filosofal pode ser obtida pela via seca ou pela via húmida.