Ivan A. Pinheiro[1]
Maçonaria & Sociedade (M&S) e Maçonaria & Política (M&P) são temas guardachuvas utilizados para abrigar e desenvolver assuntos que, pela contribuição potencial que encerram deveriam, é a minha opinião, estar sob o escopo dos interesses da Ordem, mais específica e objetivamente, ser levados a e debatidos em Loja. É o caso da filmografia, seja na forma de Documentários, Séries, Curtas, Filmes ou outras produções audiovisuais (a exemplo dos cartoons), a ser selecionada e explorada à luz dos objetivos pretendidos conforme demonstram os ensaios já realizados por Pinheiro (2023; 2025), respectivamente as Séries “La Casa de Papel” e “Adolescência”. A primeira, em razão dos seus elementos simbólicos, porque pode ser explorada como um exercício de análise, interpretação e desvelamento de significados; já a segunda chama a atenção para os ganhos em razão da maior facilidade de apreensão dos conteúdos quando as sessões, notadamente as para progressão de grau, são realizadas sem interrupção – prática que se de um lado requer memorização, ensaios e treinamentos, o que implica em elevado comprometimento do Quadro da Loja, de outro contribui (pela carga de emoções que desperta) sobremodo para eternizar a lembrança dos momentos mais significativos na trajetória dos Iniciados.
Pelos temas que traz, o filme “A Onda” é mais uma oportunidade para reflexões, estudos e debates. Embora a temática central do filme seja a política (formas e sistemas de governo, estratégias dos agentes, etc.), e que por conseguinte torna-se o foco da esmagadora maioria dos comentaristas, o filme também oportuniza perceber algo que habitualmente não é claro e fica imperceptível à maioria: os mecanismos de transmissão que conectam os vínculos e as relações familiares à macropolítica nacional. Ignorar essas conexões pode ser danoso à sociedade.
O filme, talvez pelas exigências (conhecimento de História e outros temas) e pelo desconforto que proporciona ao convidar à reflexão e à tomada de posição, não poderia mesmo ser um blockbuster (a exemplo de Titanic, Indiana Jones, Avatar, Barbie e outros), sendo antes, um cult. E exatamente por isso, há um aspecto para o qual merece, de pronto, ser chamado a atenção e levantar a primeira questão: há 2 (duas) versões do mesmo filme, e menos de 30 anos separam ambas – uma, a americana, é de 1981, a outra, alemã, é de 2008. Não tendo sido o primeiro, um campeão de bilheteria, que motivos teriam levado e justificariam uma segunda filmagem? Caberá ao leitor decidir, mas não sem antes receber alguns indicativos e a sugestão de assistir a ambas.
Segue-se que além dos méritos do próprio filme, o fato de haver 2 (duas) versões traz à pauta um novo nível de considerações: em havendo diferenças (e há) entre as versões, quais seriam as motivações e os objetivos do produtor-roteirista-diretor ao introduzi-las? Teriam sido as mudanças ambientais (na conjuntura social, política, econômica, tecnológica, etc.) as responsáveis pelas iniciativas? Cabe(ria) promover a releitura e a ressignificação dos conteúdos em geral? O desafio deste ensaio é explorar esses temas e subtemas sem incorrer em demasiados spoilers, pelo menos não mais do que já está disponível nas plataformas de streaming a exemplo do YouTube.
Preliminarmente é importante esclarecer que o filme não é de todo uma ficção, pelo menos não no sentido usual, de uma história 100% inventada, pois trata-se da narrativa, em forma de drama cinematográfico, de um experimento social ocorrido em 1967, na cidade de Palo Alto, Califórnia – USA; nestes termos a criatividade ficcional fica também por conta da dramaturgia representada pelos atores-chaves, personagenstipo (a intelectual crítica, o problemático-estranho, o indiferente, a turma do rebanho, etc.). Mais especificamente, tudo se passa em uma escola secundarista – equivalente ao nosso II Grau, ensino médio -, em uma turma mista, perfil classe média e tem início a partir de uma provocação básica: haveria condições, à época (na data dos experimentos e, por extensão, nas das respectivas filmagens) surgir e ter êxito um novo A. Hitler e que promovesse um novo holocausto? Em outros termos: poderia surgir e ascender um governo autoritário de caráter fascista sem que, tempestivamente, se lhe opusessem resistência a nenhuma das suas iniciativas? Embora divergentes as opiniões (as respostas preliminares) não se distanciam muito da incredulidade, todavia, a depender das condições… Tudo ocorre basicamente em uma sala de aula e no âmbito de um programa de estudos que no Brasil seriam vistos como tópicos de Ciência Política ao abrigo de uma disciplina de História. E para responder às questões o Professor decide por uma estratégia inusitada: ao invés de aulas teórico-expositivas lastreadas nos principais autores e pesquisas, sem esclarecer e alertar os alunos (admite-se que isto poderia comprometer o projeto) decide pela realização de um experimento: estimular e reproduzir as condições que podem levar à emergência de um governo com as características apontadas – o nazifascismo.
Tendo como pano de fundo esse cenário, embora a temática seja a mesma, as diferenças entre as 2 (duas) versões têm início desde a primeira cena: das circunstâncias que levaram à realização da disciplina à caracterização do Professor e mesmo à duração do experimento – na segunda é de apenas uma semana enquanto na primeira decorrem 3 (três) até o término do experimento. Considerando que na Sétima Arte cada detalhe tem importância e guarda significado intencional, quem assistir as 2 (duas) versões terá a oportunidade de observar e refletir a partir das diferenças que se sucedem e de algum modo estimulam o alargamento do espectro das possibilidades de leituras e interpretações dos significados. Se há a mensagem direta e objetiva do texto (diálogos), há também as mensagens subliminares escamoteadas e transmitidas a partir dos cenários, dos microambientes, cores, músicas, perfil dos atores (físico, etnia, postura, etc.), indumentárias, objetos expostos, ênfases, sequenciamento, ritmo, etc. que, então, não passam de símbolos à espera de exercício exegético que, não se pode excluir, são também subjetividades em busca das suas contrapartes na sociedade. Por fim, no que tange às diferenças, o clímax é reservado para o final, quando então, na segunda, o carácter ficcional supera em larga margem a realidade do que efetivamente ocorreu durante o experimento, o que leva a crer que, mais do que uma mensagem, o produtor, o roteirista e o diretor não pouparam esforços, talvez, para emitir um alerta.
Há também, e não poderia deixar de haver, os enredos paralelos que complementam o principal, notadamente o das relações interpessoais entre os alunos da turma, com os das outras turmas, mas também os dos personagens e os seus familiares, com a administração da escola e com a comunidade do entorno urbano que, na segunda versão, também resulta afetada.
Diferenças ora deixadas à parte, em ambas as versões o Professor, nos limites do seu laboratório (a sala de aula), ora conduzindo, ora estimulando a livre iniciativa dos alunos, procura recriar as condições que estão na base dos movimentos políticosideológicos mais extremados: a liderança, a hierarquia, a obediência, a unidade, a disciplina, propósito e foco de ação. Superadas as primeiras e tênues resistências, a adesão foi rápida e se expandiu a ponto de atrair alunos de outras turmas, o que também gerou problemas com o corpo docente.
Nessa dinâmica, os elementos objetivos sempre mencionados na literatura (Schwarcz, 2019) como agentes catalisadores e situados na gênese desses movimentos, a exemplo das crises econômicas e sociais[2], embora presentes ocupam espaço de menor importância frente aos subjetivos e emocionais, notadamente o identitarismo – senso de pertencimento e sentido, no caso, o de contribuir para a existência e a causa do grupo. Nesses termos, os instrumentos de trabalho do Professor não são(foram) os livros, nem as estatísticas ou os estudos de caso, mas antes um exercício de dramaturgia ancorado em iniciativas simbólicas revestidas de forte apelo emocional no sentido a lograr o envolvimento e comprometimento da turma: regramentos, postura (autocontrole, ordem unida), formas de comunicação (típicas da caserna), indumentária (à semelhança dos uniformes), identidade imagética (a Onda) e sinais audiovisuais interna corporis. Nos limites de uma dramatização cinematográfica (47 minutos na primeira versão e 1:47 h na segunda), em maior ou menor grau são explorados alguns dentre os elementos que, na visão de Stanley (2018), estão na raiz e integram a estratégia dos movimentos fascistas: a propaganda, o anti-intelectualismo, a hierarquia, a lei e a ordem; em outros termos, constituem a gramática e sintaxe dos movimentos sociopolíticos. Todavia,
O sintoma mais marcante da política fascista é a divisão. Destina-se a dividir uma população em “nós” e “eles”. Muitos tipos de movimentos políticos envolvem tal divisão. Por exemplo, a política comunista utiliza como arma as divisões de classe. Para fazer uma descrição da política fascista é necessário descrever a maneira muito específica pela qual a política fascista distingue “nós” e “eles”, apelando para distinções étnicas, religiosas ou raciais, e usando essa divisão para moldar a ideologia e, em última análise, a política. Todo o mecanismo da política fascista trabalha para criar ou solidificar essa distinção (Stanley, 2018, p. 15).
Ao explorar as emoções ao invés de a razão (embora muitos percebam racionalidade nas iniciativas), nos primeiros momentos o Professor consegue coordenar e dirigir a turma no sentido aos objetivos pretendidos que, mesmo sem se reconhecer, em curso espaço de tempo já começa a atuar como uma célula ideológicapolítica. Efetivamente, um dos elementos mais marcantes, porque claramente explicitado em ambas as versões, é o “nós” e o “eles”: quem está no grupo (nós) vs quem está fora do grupo (eles). Schwarcz, que analisa as raízes do autoritarismo brasileiro, após referir à atual maré conservadora, qualifica o “nós vs eles” e chama a atenção para as consequências:
Afinal, uma certa demonização das questões de gênero, o ataque às minorias sociais, a descrença nas instituições e partidos, a conformação de dualidades como “nós” (os justos) e “eles” (os corruptos), a investida contra intelectuais e imprensa, a justificativa da ordem e da violência, seja ela produto do regime que for, o ataque à Constituição e, finalmente, o apego a uma história mítica, fazem parte de uma narrativa de mais longo curso, a qual, no entanto, tem grande impacto no nosso contexto nacional e contemporâneo (Schwarcz, 2019, p. 25-6).
Em leitura ampliada, mas que não foge à representação, o “nós”, qualificado por Schwarcz como “os justos”, também são os corretos, os que sabem, os que têm os melhores propósitos, os bem intencionados entre outros adjetivos, todos positivos, enquanto que “eles” são identificados com os respectivos opostos; escolha, pois, o seu lado: o da virtude ou do vício, o do bem ou o do mal? A dualidade, sabe-se, tende à polarização: amigos vs inimigos, situação na qual o diálogo, quando não impossível (porque inimigos devem ser eliminados) requer a mediação, circunstância que também é determinante para cada grupo tenda a ficar limitado à sua “bolha”, sem desenvolver a indispensável empatia para enfrentar o contraditório e pela via da reflexão crítica buscar o entendimento, superar as intransigências e atingir um novo grau de amadurecimento enquanto pessoa.
Não há (havia) espaço, nem mesmo na segunda versão, a mais longa, para que todos, entre outros elementos sejam (tenham sido) devidamente explorados; todavia, um se revelou demasiado saliente porque presente em ambas: os sinais da violência justificada contra o “eles”, inclusive quando entre “eles” se encontram(vam) os afetos mais próximos – os familiares. E cabe esclarecer: justificada e legal porque baseada no quadro normativo deliberado e aprovado pela maioria, ou seja: em um espaço democrático. O drama se aproxima do clímax quando entre “nós” surge uma dissidência, que de pronto é contestada, constrangida (pela maioria) e merecedora de todo o tratamento destinado a “eles” – os inimigos – a exemplo do impedimento, da exclusão e, no limite, à eliminação. A dissidência, representada pela intelectualidade – a voz da consciência crítica, da razão -, sem apoio, é facilmente sufocada pela Onda – de “nós”, passa então a ser considerada como “eles”.
Por oportuno, merece ser salientada uma sutileza de extrema relevância, pois “hierarquia”, “lei” e a “ordem” (citados por Stanley e Schwarcz) são partes constituintes e praticamente inerentes a todos os sistemas sociais, o que contribui e facilita (pela normalidade que encerra) a aceitação dos sistemas autoritários quando ainda em gestação e mesmo quando já em busca de afirmação e consolidação.
Finalmente, entre outros, Casara (2020) esclarece e alerta:
Basta lembrar que o Estado Fascista italiano e o Estado Nazista alemão também se apresentavam como Estados de Direito. Aliás, a cada dia com mais frequência, atos concretos de autoritarismo atendem à legalidade (ainda que por desvios hermenêuticos), razão pela qual se torna importante reconhecer a existência de uma “legalidade autoritária”[3][…] Impossível negar o distanciamento entre os conceitos de legalidade e democracia. O respeito à legalidade é condição para a vida democrática, mas não a assegura (p. 59-60);
É necessário ressaltar que a própria democracia, em especial a sua dimensão formal que se manifesta a partir do princípio da maioria, contém em si mesma, escondida, latente, as condições à sua aniquilação (p. 61).
É nesse contexto e em curto espaço de tempo, seja sob a liderança do Professor (primeira versão) ou quando em parte e democraticamente compartilhada (segunda versão), que se opera uma transformação ou, mais apropriadamente, uma transvaloração: o grupo deixa de ser uma turma escolar e passa a atuar, cegamente, como uma agremiação política e ideológica à espera dos comandos emanados pela liderança. É quando o mal, a segregação e a violência (em suas variadas manifestações) se normalizam como banalidades, tal como Hannah Arendt4, em seus diversos pronunciamentos, após estudar o nazifascismo, já havia estabelecido. Dúvida e curiosidade: teria o Professor se inspirado na filósofa?
Os sinais de alerta, aqui e ali, revelam que o experimento, a contragosto dos alunos, deveria ser encerrado, e também porque as respostas às questões iniciais, que não são explicitadas em nenhuma das versões, mas antes dadas a apreender, já estão estabelecidas e são afirmativas: sim, estão presentes, ainda que em forma latente (como salientado por Casara), tanto as condições para o surgimento exitoso um novo A. Hitler quanto para a reedição do holocausto.
Este texto ficaria demasiado se extenso se fossem apresentados e discutidos todos os aspectos do experimento, como é o caso dos enredos paralelos que atuam como afluentes do rio principal, razão pela qual apenas na forma de tópicos são destacados abaixo, seja para oportunamente serem explorados ou para, desde já estimularem as reflexões dos leitores:
- por vezes, o que é visto como posicionamento político e consciente na arena pública, é antes um subproduto inconsciente das relações familiares, gestado e amadurecido na intimidade da vida privada. Traumas e desejos, eventualmente perversos ou mesmo manifestações patológicas ocultas no subconsciente (diagnosticadas ou não) podem estar apenas à espera da oportunidade para aflorarem e serem postos em execução, sendo grande o potencial de risco quando se trata do exercício de cargo ou função pública – a propósito, vide Lobaczewski (2014); ademais,
- já há tempos, é sabido, um conjunto de fatores contribui para distorcer a percepção e mesmo a noção de maioria enquanto manifestação da vontade efetiva ou opinião dominante – no âmbito da esfera política, mas não exclusivamente porque também aplicável ao ambiente corporativo -, vide, por exemplo, Tullock, Seldon e Brady (2005). O medo do isolamento social (do grupo de referência)[4], bem como o receio das ações ostensivas (ataques e represálias de todo tipo) promovidas por terceiros (inclusive anônimos) têm efeito direto e deletério nas liberdades para a manifestação pública das opiniões pessoais, o que não só distorce a percepção acerca do que seja, afinal, a vontade majoritária, quanto a sua própria constituição – vide, por exemplo, Noelle-Neumann (2017).
Com efeito, mutatis mutandis, ambas as situações emergem em “A Onda”.
Por fim, não há como deixar de pensar: e se o mesmo experimento, ou algo análogo fosse realizado hoje, quais seriam as expectativas dos resultados, as respostas às mesmas perguntas?
À época da primeira filmagem (1981) ainda não existiam as redes sociais digitais[5], e durante a segunda (2008) as grandes operadoras (Orkut e Facebook) ainda estavam, embora com celeridade, dando os primeiros passos e superando as barreiras tecnológicas. Mesmo as mentes mais preparadas encontram dificuldades para imaginar, a partir dos recursos atualmente disponíveis, a começar pela multiplicidade e diversidade de plataformas7, os limites do potencial para a formação de opinião e a mobilização social – para quaisquer finalidades, desde para o apoio em momentos de calamidades, como o foi, entre tantos, o da enchente do Rio Grande do Sul (2024), mas também para levar aos Poderes do Estado o grupo político (e a ideologia) de interesse. E tudo, cabe ressaltar, em um átimo – com um click. E se às plataformas, e algumas já dialogam, estiverem combinados algoritmos e chatbots operados por Inteligência Artificial generativa que identificam preferências (mas também contribuem para formálas) e induzem comportamentos a partir da exploração das emoções, das carências e fragilidades? O cenário, como reconhece Harari (2024), é inimaginável. Embora a partir do mesmo núcleo temático, arrisca-se a afirmar que os desdobramentos e o final de uma terceira versão seriam mais dramáticos do que os da segunda, que já são assustadores, frente à primeira. Os riscos parecem evidentes.
Os jovens, crianças ou adolescentes, sempre foram alvos mais fáceis e por isto preferenciais para as lideranças com intuito reformador, não apenas porque lhes falta conhecimento, maturidade, são plenos de instabilidade emocional, inseguranças, incertezas, atuam antes a partir de sínteses intuitivas do que de análises, mas também, senão sobretudo, porque ainda estão em processo natural de formação, em busca da identidade própria, de (algum) sentido, de um ideal, de uma causa a servir ou até mesmo de uma razão para viver; portanto, estão francamente mais abertos e suscetíveis. Todavia, lamentavelmente, o que se observa é que há muitos (e o contingente, há indícios, tem aumentado) que chegam à fase adulta sem ainda tê-los encontrado, o que tem contribuído para ampliar o público-alvo dos algoritmos indutores de comportamentos, o que os torna, então, massa manipulável a serviço dos ideais e interesses de terceiros, ainda que “apenas” para aumentar os respectivos mercados de consumo. É a consagração do que Ortega y Gasset (s.d.)[6], há um século, denominou o que se revelaria profético: o “homem-massa”.
E salvo melhor juízo, a Maçonaria poderia, se atuasse mais analítica e criticamente, trazer maiores contribuições ao debate já instalado na sociedade. A bem da verdade, aos poucos vão se constituindo 2 (duas) Maçonarias: 1) a primeira, que não sem alguma ironia com a História, poderia ser chamada de a dos Antigos, permanece presa às tradições, à docência ritualística das Lojas, limitada ao “quarto de hora de estudo” e com a interdição de determinados temas, como é o caso do ora apresentado; enquanto que 2) a segunda, vista então como Moderna, é a virtual, à distância – onde cargos, graus, comendas e mais são indistinguíveis –, dinâmica e vigorosa reúne os Irmãos de todos os lugares (algures e alhures), onde os trabalhos e os debates crescentemente têm sido diversificados e qualificados. Esse fenômeno, o das 2 (duas) maçonarias, que muitos certamente resistirão afirmando que a Maçonaria é a mesma, porém, agora, com 2 (duas) vias de expressão, já está a merecer estudos (avaliação e prospecção) mais aprofundados; mas não deixa de surpreender a lembrança de que se não fosse a pandemia (CoVid-19) e o pioneirismo da ARLS Lux in Tenebris, 47[7], talvez, hoje, não houvesse a pujança existente na, então, segunda via de expressão. Tradição não é sinônimo de imobilismo e inércia, como aliás, dia a dia revela a História.
Finalmente, no contexto da Maçonaria, este texto pretende ter chamado a atenção para as lições que podem ser extraídas da História: primeiro para a oportunidade e a engenhosidade, em plena “guerra fria” (quando os corações e as mentes eram disputados pelos polos ideológicos), de um Professor ter desenvolvido o experimento social que resultou roteirizado para o cinema; em segundo, para as condições que podem levar ao surgimento do evento histórico que deu causa ao experimento – a emergência do nazifascismo. Como já foi posicionado em vários textos das Séries mencionadas no título, tem-se o entendimento de que a História, a Filosofia e a Ciência Política, no contexto da Ordem, não obstante as relevâncias per se, elas são propedêuticas, efetivas plataformas para o voo das reflexões e ensinamentos que, por sua vez, ao invés de se esgotarem em diletantismos e elogios auto referentes, devem ser (como aliás, orienta “A Onda”) convertidos em ação prática no ambiente contemporâneo. Portanto, não basta ler e reproduzir a História, quando então não passa de pseudoconhecimento; a História, além de ser apreendida no seu devido tempo-espaço (momento histórico), deve, pela via da reflexão crítica ser trazida à contemporaneidade e explorada na forma de exercícios prospectivos à luz de um ambiente em permanente mudança e inovação. Assim, por mais relevantes e mesmo indispensáveis que sejam[8]Platão, Aristóteles, Sto. Agostinho, Sto. Tomás de Aquino e tantos outros à formação dos maçons, me pergunto se não é passada a hora de, não mudar, mas atualizar e complementar o Programa de Ensino da Ordem (afinal, a Maçonaria é uma Escola) e incluir F. Nietzsche, Ortega y Gasset, Z. Bauman, R. Kurzweil, E. Noelle-Neumann, Harmut Rosa, Yuval N. Harari, Byung-Chul Han entre outros. Ademais, ainda que muito do legado dos Antigos ressoe na atualidade, a exemplo do Mito da Caverna e da Fábula do Anel de Giges, é importante não perder de vista que a sua grandeza – de Platão, Aristóteles e outros – e a importância do legado que deixaram deve-se: não só, mas tanto pelas suas ideias – inovadoras e revolucionárias, sim – quanto pela coragem e ousadia de terem contestado os consensos, o status quo, o establishment, bem como por terem inaugurado novos percursos de pensamento. A Maçonaria não pode se deixar contaminar pela síndrome do “faça o que eu digo (disse) mas não faça o quê e como eu faço (fiz)”.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CASARA, Rubens R. R. Estado Pós-Democrático – neo-obscurantismo e gestão de indesejáveis. 6ª. Ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2020. ISBN 978-85-200-09505.
HARARI, Yuval Noah. Nexus – uma breve história das redes de informação, da Idade da Pedra à Inteligência Artificial. São Paulo: Cia. das Letras, 2024. ISBN 978-85-3593781-7.
LOBACZEWKI, Andrew. Ponerologia – psicopatas no poder. Campinas, SP: Vide Editorial, 2014. ISBN 978-85-67394-14-5.
NOELLE-NEUMANN, Elisabeth. A Espiral do Silêncio – opinião pública: nosso tecido social. Florianópolis: Estudos Nacionais, 2017. ISBN 978-85-94261-00-7.
ORTEGA y GASSET. A Rebelião das Massas. Lisboa: Relógio D´Água, s.d.
PINHEIRO, Ivan A. A Maçonaria, os símbolos, a filmografia e o quotidiano. Disponível em Freemason: https://www.freemason.pt/maconaria-simbolos-filmografia-quotidiano/, publicado em 06.06.23, acesso em 26.10.25.
PINHEIRO, Ivan A. Maçonaria & Sociedade: as lições d`Adolescência. Disponível em Freemason: https://www.freemason.pt/maconaria-sociedade-as-licoes-dadolescencia/ e em Maçonaria com Excelência: https://www.maconariacomexcelencia.com/post/maconaria-e-sociedade-as-licoes-dadolescencia, publicado em 26.04.25, acesso em 26.10.25.
SCHWARCZ, Lilia M. Sobre o Autoritarismo Brasileiro. São Paulo: Cia. das Letras, 2019. ISBN 978-85-359-3219-5.
STANLEY, Jason. Como Funciona o Fascismo – a política do “nós” e “eles”. Porto Alegre: L&PM, 2018. ISBN 978-85-254-3820-1.
TULLOCK, Gordon; SELDON, Arthur; BRADY, Gordon L. Falhas de Governo – uma introdução à teoria da escolha pública. Rio de Janeiro: Instituto Liberal, 2005. ISBN 8585054-62-X.
Notas
[1] MM, Pesquisador Independente, e-mail: ivan.pinheiro@ufrgs.br. O autor não só agradece a leitura e as considerações do Irmão Lucas V. Dutra, Mestre Maçom do Quadro da ARLS Presidente Roosevelt, 75, Or. de São João da Boa Vista, jurisdicionada à GLESP – Psicólogo, Professor Doutor em Psicologia, Especializado em Maçonologia (UNINTER), e-mail: dutralucas@aol.com, como também reafirma a sua responsabilidade pelo conteúdo, erros e omissões remanescentes. Porto Alegre-RS, 02.11.25.
[2] Desemprego, inflação, acentuadas desigualdades (de renda, gênero, étnica, etc.), violência, degradação dos costumes, intolerância, corrupção, etc.
[3] Destaque no original. 4 1906 – 1975.
[4] Realidade também constatada em meio a vários grupos religiosos, de orientação dogmática ou ideológica cada vez mais perceptíveis no seio da Ordem.
[5] E o combo vem completo: fake news, assassinato de reputações, cancelamentos, etc. 7 WhatsApp, Instagram, Facebook, YouTube, TikTok, Telegram, LinkedIn e outros.
[6] Consultado, o Google informa que o livro originalmente foi publicado em 1929.
[7] Fundada em 25 de setembro de 2020 e jurisdicionada à Grande Loja Maçônica do Estado de Rondônia (GLOMARON).
[8] Pelo menos é o que se espera(ria) à luz dos textos de apresentação, sobretudo os das Potências Maçônicas estabelecidas no Brasil.
Compre Livros sobre Maçonaria – clicando em
LIVRARIA DA BIBLIOT3CA

