Bibliot3ca FERNANDO PESSOA

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As gravuras como parte do discurso maçônico

Tradução J. Filardo

Por Victor Guerra

Gravura de Johann Martin Bernigeroth (Leipizg 1745)

Ao Irmão Vincent Rocamora pela sua inspiração e ao P. Langlet pelos seus ensinamentos.

Não sei por que os maçons somos, em geral, muito inclinados a desenvolver mil argumentos tangenciais sobre as várias questões rituais, diante da menor oportunidade de fazê-lo.

A prova disso foi apresentada recentemente no desenvolvimento do artigo sobre a Câmara do Meio, onde a maioria dos estudiosos ignorou o paradoxo central da questão e sair pela tangente e, assim, poder expandir longamente o conceito de “meio” como centralidade do universo, evitando assim entrar no coração de Como era possível que uma Câmara do Meio fosse de Mestres?

Em geral, evitamos saber quantos pés o gato em questão tem, antes de procurar informações para poder contestar os paradoxos que surgem, pois a pessoa vaga pelos mundos simbólicos como lugares mais propensos à recreação intelectual diante dos quais há pouco a dizer.

Estes não são temas fáceis de trabalhar com imagens, que o diga o Irmão Vicente Rocamora, que experimentou com uma série de artigos: a Maçonaria em suas imagens, que teve cerca de 4 deles publicados no Blog La Taberna del Ganso.

É claro que para tentar essas proposições e aproximações você precisa de material de apoio, bibliografia, gravuras, e esse material em língua espanhola não existe. Não que na França exista muito mais, só conheço um bom trabalho sobre o assunto, e será  aquele que sigo aqui como exemplo e guia, do excelente trabalho de Philippe Langlet:  Lecture d’Images de la Franc-maçonnerie.

Desde que fui Aprendiz sempre me interessei muito pelas imagens maçônicas, sejam elas os chamados Painéis de Grau, sejam as gravuras, que também não são abundantes e textos contendo explicações plausíveis.

Entre as gravuras está a série comumente atribuída a Gabanon, inclusive eu a utilizo para ilustrar alguns dos meus artigos. Gosto particularmente da série intitulada Costumes dos maçons em suas Reuniões, principalmente para a recepção de Aprendizes e Mestres, que são atribuídas a Léonard Gabanon, autor do Catecismo dos Maçons (1740), cujo nome verdadeiro corresponde ao violinista Louis-Antonie Travenol (1698-1783).

No entanto, todas essas gravuras parecem ser inspiradas em outras “tão raras e de origem anônima”, que geralmente estão ligadas ao mundo alemão, segundo Klaus C. F. Feddersen (1982).

As placas gravadas que aqui exponho trazem a assinatura de J. Martin Bernigeroth, (1713-1767) gravador de Leipzig, e são estas, ou algumas cópias delas que ilustram o livro de Travenol, o que é reafirmado e confirmado pela dedicatória do cartão: Dedié au trés Galant, trés sincere et trés verídiques Frere profane[1]Leonardo Gabanon. Auteur du Catehcisme…,embora em outras cartas existam algumas outras variantes em termos de ortografia em dedicatórias semelhantes.

Mas não é objetivo deste artigo definir a autoria dessas gravuras, e sim tentar através delas abordar a definição conceitual do espaço maçônico nelas  representado, uma vez que individualmente elas compõem um quadro que observado cuidadosamente nos fornece muitas informações, e como um todo fazem parte do complexo discurso maçônico.  Embora, em geral, essas gravuras sejam vistas como algo ilustrativo, complementares ao texto de Gabanon-Travenol, e não como algo didático e informativo dentro do contexto maçônico.

Uma das gravuras que vamos analisar é a primeira da chamada série Bernigeroth.

Trata-se da entrada ou recepção de um candidato a maçom, que é o que ilustra esse post, embora existam algumas outras séries que são consideradas como “B” ou até houve outra qualificada como “C”, embora mais tarde outras cópias tenham sido reproduzidas por clonagem de personagens com roupas diferentes ou deslocados espacialmente, ou tenham sido impressas em cores.

Um exemplo do que estou expondo é o que Vicente Rocamora mostra, nesse desenho que ele representou em seu blog, e ele pretendeu mostrar as semelhanças entre algumas séries e outras.

Mas vamos ao objeto do trabalho que se pretende apresentar neste artigo, que trata da Iniciação de um leigo na Maçonaria, conforme anexo.

A Composição

Trata-se de uma obra de gravura muito geometrizada, utilizando o estilo italiano para sua composição, e como ponto de construção a Proporção Áurea, o autor colocando-se do lado direito da loggia vista do eixo Oeste-Leste, ou seja, o gravador estaria colocado na Coluna Sul, deixando em sua perspectiva um grande campo de visão que permite ver toda a cena e até mesmo ampliando desta forma o núcleo central que seria ocupado pelo Tapete de Loja.

O Espaço

O que a gravura nos mostra é uma sala eclética (neutra), que poderia muito bem ser a sala de estar de um dos participantes do evento, uma sala comum dentro de um ambiente burguês, portanto, isento de qualquer simbologia maçônica.

É uma sala sem janelas, onde três lâmpadas muito esmaecidas pendentes do teto e, portanto, a luz existente durante a cerimônia, pelo menos na parte central da pintura, vem dos três grandes candelabros localizados na sala e colocados em três cantos do Tapete da Loja, um deles colocado no canto a nordeste, outro no canto sudoeste (ocidente) e finalmente outro no canto sudeste. Em seguida, entraremos nessa composição, significado e orientação e a que sistema ritual essa composição e posicionamento se refere.

No salão, a parede que fecha a sala, a dos fundos, podem-se distinguir colunas, uma ou duas cortinas, embora não haja tapeçarias, há um grande painel central decorado, talvez um espelho atrás do Venerável e alguns candelabros presos à parede.

Naquela parede dos fundos, atrás do grupo principal de personagens e abaixo do painel decorado, pode-se ver um grande canapé ou sofá, tudo muito borrado, embora dependa de qual série de gravuras estamos manuseando.

O espaço lógico é definido na gravura pela composição de três grupos de personagens, em cada um deles há quatro figurantes principais que dão sentido a cada cenário, então de forma primordial estaria O Painel da Loja que mostra sua importância, pelo tamanho, que marca e delimita o espaço que forma junto com os personagens,  isto é, o contexto maçônico da loja, e o faz de forma marcante e importante, pois não há nenhum elemento que nos impeça de ver sua configuração como tal. Mais adiante desenvolverei alguma reflexão sobre o tabuleiro ou tapete da loja que estamos vendo.

As Personagens

Na pintura ou gravura que observamos, temos cerca de 12 figuras que podemos considerar como “principais” e que considero como tal por estarem em primeiro plano, e então teríamos mais 5 caracteres secundários com pouca definição, que formariam, como já expliquei, três grupos de quatro pessoas. O primeiro grupo seria o estabelecido a partir do Guarda do Templo (portando uma espada), o 2º Vigilante conduzindo o profano, concluindo com o 1º Vigilante ao lado do Candelabro de sudoeste. Então haveria a panóplia central, com outros 4 personagens centrais, mais os secundários, e finalmente haveria outro grupo composto a partir da personagem localizada atrás do candelabro de nordeste (Orador), ao lado do Venerável Mestre, e cuja composição terminaria com a personagem (Secretário) posicionada atrás do 2º Vigilante ao lado do candelabro de sudeste.

A algumas das personagens desta composição podem ser atribuídas algumas qualidades ou posição dentro do contexto da loja pelas anotações na parte inferior da gravura, mas primeiro algumas notas de contexto.

Os participantes da reunião parecem ser “pessoas de bons costumes”, nobres e burgueses da sociedade da época, conforme denotado, por exemplo, por suas perucas no estilo de Luís XIV, outros simplesmente usam seus cabelos longos. Suas roupas indicam que eles seguem o padrão de moda “francês” muito em voga na Europa naquela época, vestindo ternos ou casacos com um certo voo da cintura para baixo até o joelho, usando calças apertadas até o joelho, com meias e sapatos da época

Roupas com pregas e botões, e o ocasional babado nas mangas, e com uma distinção como a figura 8 (Guarda do Templo) e a do Venerável Mestre, que usam um laço ou gravata borboleta. Portanto, de acordo com o teor dessas vestes, poderia muito bem ser uma indumentária maçônica desenvolvida na França, ou em um lugar próximo.

Embora P. Langlet introduza uma dúvida, e se pergunte: vendo a roupa tão semelhante entre os personagens, poderia ser que fosse uma loja de um regimento? Há elementos que podem sugeri-lo, mas ficaremos com a dúvida.

Em geral, os presentes na Sessão usam um avental maçônico, um pouco longo e arredondado na parte inferior, como ainda é usado na França, embora mas não tão longos. No caso da gravura, as representações dos aventais dão a impressão de que sejam feitos de tecido ou couro branco; a maioria dos presentes os usam colocados sobre a roupa e, no caso daqueles que usam sobretudos, eles têm seus aventais amarrados por baixo.

O que pode parecer bobagem, mas essa coisa de usar avental dentro ou fora do paletó já levou a algum debate: Se é por cima ou por baixo do paletó?

(A numeração da figura não corresponde à numeração original da gravura. Foi acrescentada pelo autor para permitir a explicação do status dos maçons presentes)

Status

Todos os presentes são Mestres Maçons, exceto o profano (Recipiendário), conforme mostram seus respectivos aventais, que podemos ver parecem estar “normalizados”, já que todos usam o mesmo modelo ou similar, exceto a personagem de nº 8 onde a abeta do avental é claramente visível. ( essa diferença significaria alguma coisa?)

Portanto, todos tendem a uma certa uniformidade quando se trata de comparecer aos trabalhos. Não sei se eles estão vestidos com suas melhores roupas, mas é claro que eles estão elegantemente vestidos para a cerimônia de recepção maçônica que está ocorrendo diante de nós.

Na gravura vemos que alguns dos Mestres portam uma espada, embora não todos, nem aqueles que a carregam, seu uso nem sempre é apreciável, já que eles não usam a clássica faixa de porta-espadas, embora não seja menos verdade que em outras gravuras podemos ver o porta-espada preso em seus diferentes modelos.

Entre as figuras que portam espada, estão figuras 1 (Guarda do Templo) 6, 7, 9 e 11,

Em relação ao desempenho de cargos que podem ser identificados na gravura são:

  • Figura 1.- Guarda do Templo Interior com espada levantada e apresentada na mão direita e mostrada como tal nesse lado, esta figura que também mostra uma pessoa jovem está em segundo plano.
  • Figura 2.- 2º Vigilante, ele usa sua joia pendurada em uma fita e, como tal, sua joia o identifica como o referido oficial. Ele acompanha o recipiendário a quem conduz gentilmente até a borda do Tapete da Loja. Este oficial usa o martelo cilíndrico pendurado na cintura do lado direito, o que pode nos parecer estranho já que não há mesas para o exercício do cargo pelos oficiais. Essa peculiaridade aparece na revelação Maçon Demasqué, onde se indica que alguns oficiais tais como o 2º Vigilante ou o 1º Vigilante, que não é visto aqui vão “Trazem pequenos malhetes presos na cintura”.
  • Figura 3.- Profano ou recipiendário. Ele será descrito mais adiante.
  • Figura 4.- 1º Vigilante, descrevemo-lo como tal colocando-o ao pé da coluna “J”; ele não parece estar usando malhete, mas entre a manga larga com punhos e o candelabro, não é possível distinguir se ele também usa o martelo em sua cintura.
  • Figuras 5 e 6. Não há nada que identifique esses maçons como uma qualidade a ser desenvolvida, embora seu porte os faça se destacar no grupo central de participantes da cerimônia de recepção de um profano.
  • Figura 7.- Tesoureiro, de seu peito pende uma pequena chave, e não parece que seu homônimo Hospitaleiro seja encontrado nesta foto de personagens.
  • Figura 8.- Orador, ele é identificado em outras gravuras por suas insígnias circulares como o Orador, nos rituais franceses ele é sempre colocado à esquerda do Venerável, embora aqui ele pareça ocupar a posição de Capelão da Maçonaria Anglo-Saxônica. Ele é o único em que se percebe a abeta sobre o avental.
  • Figura 9.- Um maçom eclesiástico, a quem alguns dão a função de Orador, embora em outras gravuras o maçom nº 8 apareça como o Orador, mostrando uma pequena insígnia redonda em seu peito.
  • Figura 10.- O Venerável Mestre, com um chapéu de loja como é costume dos modernos, com um tricórnio, em outras gravuras ele é representado com um bicórnio.
  • Figura 11.- É uma figura que também chama a atenção porque está ao pé de um dos candelabros que guarnece o Tapete de Loja à maneira dos Modernos, e bem ao lado do Secretário, de modo que é possível pensar: Quem é ele, e que função ocupa?
  • Figura 12 – O Secretário, juntamente com os Vigilantes e o Venerável Mestre, é mais reconhecível pelas duas penas que pendem de seu peito. Mas há uma pergunta: sobre o que ele está escrevendo…?

Para indicar uma posição um tanto estranha, embora a mesma composição e conduta do profano exija, é que os dois vigilantes estejam situados a sudoeste. Pode-se considerar que ocorresse uma carência de oficiais dentro de uma concepção mais atual dos ofícios em loja, mas deve-se ter em mente que naqueles primeiros momentos eles não parecem ter oficiais, tais como Mestres de Cerimônias, Hospitaleiro, Grande Experto etc. Essas concepções ainda são muito simples no desenvolvimento das estruturas maçônicas, e é por isso que sentimos falta de algumas figuras, tais como os diáconos.

Por outro lado, observa-se que todos eles, com exceção do Venerável que tem assento e mesa, os demais estão de pé e não possuem mesa ou pedestal para cumprir as qualidades que hoje emprestamos aos referidos oficiais, o que indica que as cerimônias eram muito simples e rápidas, passando depois ao trabalho de mastigação.

Volto à figura do Venerável, que está usando um tricórnio, em outras gravuras ele é mostrado usando bicórnio. No Rito Moderno o Venerável Mestre usa um gorro de rua durante toda a sessão, nesse caso o Venerável mostra aquele que era comumente usado, ou seja, o tricórnio.

Por outro lado, tem, como já mencionamos, uma gravata do tipo borboleta amarrada ao pescoço, elemento que o distingue, pois também parece ser colorida; em sua mão direita ele mostra um malhete, e em sua pequena mesa, ao contrário de outras gravuras que mostram mesas grandes, aqui estamos diante de uma pequena mesa sobre a qual não há espada, exceto por um livro que parece ser o ritual, embora muitos estudiosos venham a insistir que é a Bíblia aberta no Evangelho de São João.  Conforme explica Perau (1700-1767), é bem possível que seja esse o caso em termos das referências textuais aos rituais, mas olhando para o Venerável e a posição do livro e como ele está situado, estou bastante inclinado a pensar que são as anotações rituais para realizar corretamente a cerimônia em andamento.

Outra questão é que, dado o desenvolvimento da sessão, há outro livro, no caso a Bíblia, que seria exposto diante do profano para que este faça seu juramento, mas pela percepção sugerida pela gravura não parece que o livro que está sob as mãos do Venerável seja uma Bíblia.

Se fosse um livro com mais representatividade ou com mais importância conceitual, teria sido exposto ao resto da loja, seja sobre uma mesa um pouco maior ou sobre o pequeno altar aos pés do Venerável, a fim de destacar o aspecto mais “sagrado” do livro.

Agora vamos entrar em detalhes maçônicos mais específicos:

O Profano ou Recipiendario.

O profano que entra na loja, para colocar-se aos pés do Tapete ou Painel da Loja, que é acompanhado pelo 2º Vigilante, apresenta o porte de um jovem, pouco desafiador e delicado.

Nem nu nem vestido

Como profano que se apresenta diante da loja para ser recebido como Aprendiz Maçom, ele apresenta o característico triângulo da nudez que marca o rito maçônico, nem nu nem vestido, e despido de metais, que é a figura mostrada na gravura.

Esta estampa mostra uma recepção característica do uso moderno, ou seja, mostra o recipiendário com a cabeça descoberta, vendado, vestindo a camisa aberta mostrando o seio esquerdo descoberto e a manga da camisa do lado esquerdo enrolada, e o joelho direito descoberto, mostrando o pé direito em um chinelo, embora na gravura mostre os dois pés como meio descalços. Nesse sentido, Três Golpes Distintos (1760), no contexto dos Antigos, indica que o (recipiendário) “não estará nem nu, nem vestido, nem pés calçados ou nus”, que é como o profano parece se apresentar, além de não usar a corda característica em volta do pescoço, elemento singular dos Antigos que o REAA conservou para a iniciação maçônica.

O pé esquerdo descalço nos leva a Jasão, e também tem reminiscências bíblicas que alguns autores, digamos, reinterpretam dessa forma: “ao tirar o calçado do pé esquerdo, o profano aceita sua propensão à insensibilidade moral e ao egoísmo que permite o benefício direto, imediato e cego” (F.J Ortega).

O Painel ou Tapete da Loja

A parte principal da cerimônia que estamos testemunhando na contemplação da gravura é essencialmente desempenhado pelo Painel da Loja, também chamado Tapete da Loja, ou Tapete de Chão, em torno da qual são colocadas as personagens maçônicas da gravura, marcando parte de seus três cantos que ocupam: a sudoeste o 1º Vigilante, o Orador no canto Noroeste que parece mostrar seus pés em um semi-esquadro,  e a Figura 11, que marcaria o canto Sudeste, embora esta última seja mais uma observação do que uma realidade documentada.

Estamos então diante de uma grande tabuleiro de cerca de 3 metros de comprimento, supostamente um tecido ou tapeçaria. No passado ele era desenhados com giz no chão, mas isso estava em decadência quando a casas dos nobres entraram em cena. Apareceram então as chamadas tapeçarias de loja ou de chão, como neste caso onde nos é mostrada uma tapeçaria de grandes dimensões, de tecido, em que nos são mostrados elementos simbólicos. Mas primeiro devo dizer que essa representação feita pelo gravador Bernigeroth, datada de 1745, não corresponde à descrição feita pelo Abade Perau em seu ritual, embora não saibamos a que correspondem essas imprecisões, seja devido ao esquecimento do gravador, seja porque estamos realmente lidando com a representação ortogonal de um dos primeiro Tapetes de loja representadas na França.

Então temos os 7 degraus misteriosos e depois os pavimentos de mosaico, com alguns símbolos à direita, de cada lado da coluna, que eu não identifico.

As duas grandes colunas são adornadas com um monograma que as identifica como “J” e “B”, que são colocadas sob a concepção dos modernos, já que “J” (Jaquin) está situado na coluna do Norte, e “B”, Boaz, na coluna do Sul.

Ambas atravessam a porta de entrada do templo, e são encimadas por dois capitéis idênticos, bem como suas bases, momento em que encontramos a legenda sob o pilar J, de “Força”, e no lado do pilar B a qualidade “sabedoria” e “beleza” associada à estrela ou a uma coluna imaginária.

Na altura intermediária dessas colunas singulares, que presidem toda a concepção maçônica, está a primeira janela, encimada em forma semicircular, e acima dela a legenda “beleza”, que no decorrer do tempo ocorreria e viria a formar a triangulação clássica do REAA, representando estas qualidades de: força, sabedoria e beleza com base em novas colunatas, sobre as quais será desenvolvido todo um corpus interpretativo, muito característico do sistema ritual do REAA. A tradição moderna e francesa atribui sabedoria ao Venerável, força ao primeiro Vigilante e beleza ao segundo Vigilante. Outras atribuições, variadas nos ritos escoceses, são incorretas e não significativas. Somente o VM encarna Salomão em Loja, e Salomão em si simboliza Justiça e Sabedoria

Acima da legenda “beleza” é colocada no topo ligada ao elemento que ocupa um espaço central, como a estrela que parece mais flamejante.

Do lado direito desta encontra-se uma janela retangular, não sendo possível identificar o que está localizado no lado esquerdo da estrela, que pode ser a prancha de traçar.

A estrela que temos aqui é simples (filante) não se materializou na complexidade mostrada pelo chamada Flanboyant, um pouco mais tarde, aqui não há 5 pontos, nem a misteriosa letra G em seu interior. Nesse sentido recomendo a leitura da obra A Estrela Flamígera, a estrela dos construtores [2]. Portanto, estamos diante da primariedade de graus e símbolos, então veremos como essa Estrela muda sua forma e conceito, e como aparece um certo simbolismo ligado a números, passos, viagens, idade etc.

Acima desses três elementos há outros três, o símbolo do 2º Vigilante, o nível de fio à esquerda da janela um pouco diferente na extremidade superior, e do outro lado o símbolo do 1º Vigilante.

Mas vamos falar sobre essas janelas características, e por que elas são representadas de forma desigual. A existência das janelas, estas estão registradas em Maçonaria Dissecada (Prichard -1730) da seguinte forma:

  • Existem janelas fixas em sua loja?
  • Sim
  • Quantas?
  • Três
  • Como são posicionadas?
  • Leste, Sul e Oeste
  • Para que servem?
  • Para iluminar os homens que vão trabalhar, os que trabalham e os que vêm do trabalho

Em geral, são janelas barradas, no entanto, no tabuleiro digamos que estão compartimentadas em 6 quadrados, mas são orientadas como as vemos no tabuleiro que coincide com o que está exposto em Prichard, que por sua vez deriva do que está exposto no Livro dos Reis VI. 4 que as descrevem dentro do templo de Salomão,  mas esses elementos não estão presentes em todos os ritos, tais como o RER ou Emulação.

Alguns autores os consideram uma sobrevivência do mundo operativo em trabalhos especulativos, e às vezes uma comparação puramente prática, embora os antigos catecismos indiquem que seu significado estaria relacionado à “razão, ao Espírito e à boa vontade do Venerável Mestre, pelo qual os Cavaleiros da Ordem realizam seus ensinamentos”

O que os estudiosos simbólicos vêm nos dizer é que os significados na conformação dessas janelas já denotam uma série de explicações singulares: “A janela semicircular significaria a passagem do plano terrestre para o plano celeste, como viria a representar a janela inferior colocada a oeste; no entanto, a do sul, retangular, passaria a significar receptibilidade terrestre, e a do leste nos colocaria em comunicação com a parte sagrada da loja.”

De qualquer forma, o P. Langlet, em Ritos Maçônicos, publicados em espanhol pela Editora Kompás, faz uma interessante exposição que também será consultada para a explicação do ternário da nudez.

A título de separação entre esses elementos teríamos a lenda “fidelitas moribus unitas” algo como; unidade e fidelidade no comportamento, que seria o que seria exigido do receptor assim que recebesse a luz.

Fechando a parte oriental, na extremidade superior do tapete da loja, estão a Lua à esquerda, o Esquadro no centro e o Sol à direita, formando assim o ternário das três grandes luzes: a Lua, o Sol e o Esquadro representando o Venerável Mestre, e que é a articulação usada pelos Modernos.

Note-se ainda que entre a legenda e estes três elementos centrais existe a pedra bruta à esquerda associada à coluna “J” e a pedra cúbica associada à coluna “B” e que é encimada pelo machado.

Todos esses elementos já simbolizados para o trabalho maçônico são delimitados no topo por uma corda de nós em “8” ou de amor com um nó de cada lado, logo estes cresceriam até apresentarem uma série de nós que houve quem os fizesse coincidir com os 12 signos do zodíaco, o que vem nos mostrar a mutabilidade de alguns elementos simbólicos na Maçonaria. Esta corda é encimada com a famosas “houppes” ou seja uns bordões, um em cada extremidade da corda, que neste caso é como se pode ver muito pequeno e viria a representar um empréstimo da Maçonaria operativa, querendo recordar a corda de nós dos Mestres Construtores Operativos, e é a primeira vez na França e neste tabuleiro que a corda do nó está representada.

Até agora não a mencionamos, mas devido ao acima exposto e a presença da estrela flamígera, os estudiosos afirmam que este tapete de loja é de Aprendiz-Companheiro. Talvez prossiga desse momento de transição até um terceiro grau?

Altar ou Pedestal de Juramentos

A leste, na parte superior do tapete da loja, há um banquinho ou pequena mesa, situada aos pés do Venerável Mestre, que viria a significar uma espécie de pedestal que na maçonaria continental logo se tornou um Altar, e que em outra maçonaria mais liberal indica a existência de um altar de juramentos  ou de promessas, sobre as quais não há espada, mas os empréstimos da maçonaria operativa, dois elementos simbolizados como o Esquadro e o Compasso, que, como podemos ver, não eram sobrepostos, mas o esquadro desempenha um ponto central sobre a mesa, sendo o compasso fechado, certamente para abri-lo no momento em que o Aprendiz-Companheiro precisar dele para segurá-lo contra seu peito nu no momento de fazer a promessa ou juramento.

Nesse sentido, essas gravuras são muito interessantes e até as comparam a outras para ver a chegada de novos elementos simbólicos à Maçonaria, ou a complexidade ritual que a própria Maçonaria foi adquirindo e exigindo para o desenvolvimento de seu corpus simbólico. A esse respeito veremos como a mesa ou altar é substituída por almofadas,  (RER) e este se vai enchendo de elementos simbolizados.

Candelabros

Outros elementos a serem levados em conta para a filiação como rito assimilado ao modo de trabalho dos Modernos é a presença dos candelabros, ou colunas, localizados de acordo com a descrição dos usos dos Modernos, constituem um esquadro que tem como base o Oriente e não o Ocidente, e representam o sol, a lua e o Mestre da Loja. A posição inversa, baseada no Ocidente, é escocesa.

Estes eram conhecidos como candelabros altos, porque têm quase 2 metros de altura, e sua base é triangular, eles também eram chamados de candelabros de altar, e seu uso era muito difundido fora dos contextos religiosos.

Neste caso, eles representam os três grandes pilares localizados na pousada com a orientação N-E e S-E e o outro a S-W.

A Título de Conclusão

É evidente que este trabalho poderia ser ampliado e complementado com a sinalização simbólica hermenêutica e descrição dos elementos que estão na gravura, que como se supõe possuem diferentes conceituações e explicações, nada mais resta do que abrir um par de dicionários maçônicos para construir todo um mundo simbólico que explique a coisa toda.  De qualquer forma, quis ser muito eclético nos significados simbólicos, mesmo parecendo exceder, também para deixar espaço para que cada um possa, a partir desse tipo de reconstrução, preencher com novas contribuições os interstícios que eventualmente ficaram.

De qualquer forma, não é intenção deste artigo entrar nessas questões, mas mostrar como uma imagem, através do exercício da observação, pode articular parte do discurso ritual e conceitual que a Maçonaria manuseia, e cujo exemplo deve servir para Aprendizes e Companheiros, entrarem no complexo mundo do simbolismo maçônico

Notas