Bibliot3ca FERNANDO PESSOA

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O Grau de Mestre

Tradução J. Filardo

Por Armand Pouille

Alcançar o mestrado não é fácil. O Companheiro, consciente de tudo o que o separa do ideal, mede por isso mesmo a distância a ser percorrida para alcançá-lo; daí as viagens a serem feitas e impostas a ele para descobrir o mundo e compreender seus princípios. Simbolicamente, a obtenção do grau de mestre é representada pela morte de Hiram.

A Lenda de Hiram e a Passagem ao grau de Mestre

A Maçonaria fez de Hiram o arquiteto do Templo de Salomão. Hiram foi creditado por organizar o trabalho no Templo de uma maneira justa, proporcional entre salários e capacidade. Para tanto, dividiu os operários em três classes distintas: os Aprendizes que se reuniam em frente à coluna “B” para receber suas instruções, suas provisões e a justa recompensa por seus trabalhos. Os Companheiros eram chamados a assumir o posto com o mesmo propósito perto da coluna “J”. Finalmente, os Mestres eram autorizados a se reunir dentro do Templo.

Cada uma dessas categorias tinha seus “mistérios”, de modo que um trabalhador pudesse ser reconhecido à primeira vista como um Aprendiz, um Companheiro ou um Mestre. Certas palavras pronunciadas na atitude e com os gestos necessários desempenhavam um papel importante a este respeito.

Mas, alguns trabalhadores se acharam superiores ao status que lhes foi atribuído. Entre eles, alguns Companheiros convenceram-se de que o grau de mestre lhes era devido, enquanto persistia-se em recusar-lhes esse supremo avanço de que se consideravam dignos. Cegos por seus defeitos, vítimas da mediocridade de suas inteligências, iludiram-se quanto à extensão de sua educação. Esses miseráveis queriam receber um salário que não mereciam. Eles decidiram obter o controle pela violência, envolvendo outros Companheiros em uma trama hedionda.

A fim de obter o reconhecimento do grau de Mestre, os três Companheiros malignos golpearam Mestre Hiram até a morte, sem terem obtido a palavra sagrada. Cientes de seu delito, eles decidiram enterrá-lo.

Assim, informado do crime dos maus Companheiros, o candidato ao grau de Mestre vê o resultado de uma conspiração na qual poderia ter se envolvido sem seu conhecimento. O candidato tem a certeza de que não tem nada a se recriminar? Ele se mostrou respeitoso o suficiente com a tradição maçônica personificada por Hiram? Não se censura por se ter mostrado intolerante e por ter odiado seus adversários, suspeitando de sua boa-fé? Ele quer ser Mestre apenas para prestar mais serviços aos outros? Está el pronto para perder o interesse por sua própria pessoa, ou está fascinado por alguma miragem de vaidade? Seria ele estimulado pelo orgulho de comandar e brilhar em posição eminente? Se sentir-se puro de coração, o futuro Mestre pisará sobre o cadáver do Mestre encontrado e estendido a seus pés sem estremecer?

A Quinta Viagem

A maçonaria inicia-se em duas etapas, pois os graus de Aprendiz e Companheiro se sucedem para realizar todo o programa preparatório em dois graus, completado pela iniciação definitiva que o grau de mestre representa. Este não pode ser conferido desde o início, porque é a continuação lógica dos progressos anteriormente realizados. É necessário ter um conhecimento profundo dos dois primeiros graus para aspirar o terceiro, daí a necessidade de voltar ao ponto de partida original, a fim de embarcar a partir daí em uma nova direção.

Quando o Companheiro é julgado digno da iniciação suprema, ele é conduzido à entrada do templo para realizar uma caminhada simbólica reversa. Isso deve ser visto como uma alusão à renúncia que leva ao grau de mestre, que exige o sacrifício de todas as ilusões, mesmo que seja fruto da iluminação iniciática adquirida. Para se tornar um Mestre, é necessário ter um conhecimento profundo de todo o ensino dos dois primeiros graus, daí a obrigação de repetir toda a carreira já percorrida. Trata-se, portanto, de refazer seus passos, a partir da estrela flamejante (assimilada à rosácea, que nas catedrais, ilumina-se ao entardecer, acima do portal entre as torres figurativas das colunas J e B).

Só esta estrela da compreensão ilumina o Companheiro em sua retrospectiva que se realiza no caminho da quinta viagem, dedicada à contemplação. Voltando a si mesmo, o iniciado medita sobre o valor de suas próprias concepções. Plenamente edificado quanto à impossibilidade de possuir a Verdade, que não pode ser contida em nenhuma fórmula, o Companheiro deve, no entanto, agir com certeza. É por isso que, ao voltar, redescobre as ferramentas de sua quarta jornada: esquadro e régua, cujos significados são a aplicação em todas as coisas das medidas de equidade (esquadro) e do desejo profundo e constante de fazer bem (régua). Mas não basta que o futuro Mestre seja exemplar em sua disciplina pessoal. Ao tornar a pedra cúbica, ele influencia seu ambiente.

Às vezes, deve agir vigorosamente, para levantar as massas mais pesadas e sacudi-las em sua inércia. Ele precisa da alavanca que é colocada em sua mão, assim que o rebaixamento o traz de volta aos trilhos de sua terceira jornada como Companheiro. Se nada pode resistir à energia da vontade (alavanca) aplicada com retidão de intenção (régua), é importante, nessas questões, que o abstrato e o concreto não se confundam. É por isso que a segunda viagem deve ser refeita, inspirando-se na régua e no compasso, na linha reta e no círculo. O compasso é o instrumento por excelência do Mestre, pois somente o senso de realidade pode levar ao grau de mestre. O futuro Mestre também deve aprender a comandar manejando o maço que golpeia o cinzel.

Por isso, não hesitou em fazer sua primeira jornada como Companheiro, sabendo muito bem que nunca teria que parar de trabalhar em seu próprio aperfeiçoamento. Como poderia comandar os outros, se não tivesse conseguido se controlar? Toda maestria começa em si mesmo; ser o próprio senhor abre caminho para todas as soberanias. O Companheiro admitido para completar sua jornada iniciática deve oferecer sérias garantias. Trabalhador pontual, zeloso, inteligente, seus Mestres respondem por ele. Ao buscar o grau de mestre, ele não cede a nenhum motivo de vaidade ou ambições básicas, pois pede para aperfeiçoar-se apenas para trabalhar mais utilmente, prestar maiores serviços e fazer com que seus irmãos menos instruídos se beneficiem da competência que deseja adquirir.

Um novo Mestre

Aqui ele é, de fato, digno de ser alçado ao grau de Mestre. Nada que o assalte com instintos brutais mal sufocados, a sobrevivência de um atavismo distante, pode influenciá-lo. Ele só é Mestre se dominar tudo o que ameaça escravizá-lo. Já Aprendiz, soube conter suas paixões para raciocinar com estrita imparcialidade. Tendo se tornado um Companheiro, ele se propôs a domar a fera feroz que ruge em seu peito. Para conquistar o Mestrado, ele deve completar a posse absoluta de si mesmo, a ponto de conter até mesmo apetites legítimos, sacrificando todas as satisfações pessoais ao ideal supremo do bem geral e do progresso universal. Ninguém se levanta a menos que consinta em se humilhar.

Assim como somente a morte simbólica voluntária permite que o profano renasça na via superior da Iniciação, também ele deve morrer uma segunda vez para conquistar as prerrogativas do Mestre. Uma vez que ele passou por suas provações, o novo Mestre se identificou com Hiram (uma identificação de acordo com a doutrina dos Mistérios da Antiguidade).

Hiram é a inteligência que anima a tradição maçônica: ele vive novamente em aparência e espírito no novo Mestre assim que este compreende todo o mistério da Maçonaria, percebendo exatamente a razão de ser de seus usos simbólicos. O novo Mestre agora é homenageado como se Hiram tivesse nele reencarnado. De repente, o local do funeral é subitamente transformado em um santuário resplandecente de Luz.

A verdade sobre o mito de Hiram Na iniciação nada conta, exceto o que é realizado internamente. Devemos, portanto, transformar o símbolo em realidade. E o verdadeiro mito de Hiram. Primeiro, nenhum dos antigos manuscritos maçônicos alude à trágica morte do arquiteto do Templo de Salomão. Por outro lado, nenhuma menção ao cerimonial de recepção do terceiro grau é anterior a 1723. Nessa época, quando foi publicada a primeira edição do Livro das Constituições, o grau de Mestre era totalmente desconhecido. Será uma pessoa anônima que irá compor do zero a dramática história do assassinato de Hiram por três Companheiros malignos, determinados a arrancar-lhe fraudulentamente os segredos da maestria. Não foi senão em 1733 que as Lojas de Londres introduziram o mito de Hiram em seu ritual.

Publicado na revista FM-Maçonnerie

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