Bibliot3ca FERNANDO PESSOA

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Sobre as Lojas (Maçônicas) de Estudos e Pesquisas – IX

Por Ivan A. Pinheiro[1]

É chegado o momento de resgatar, reunir e ampliar as considerações sobre alguns tópicos dispersos por entre os números anteriores desta Série – Sobre as Lojas (Maçônicas) de Estudos e Pesquisas (LEP)[2]. Por exemplo, tecidas considerações sobre a mentalidade e o perfil dos integrantes do Quadro da Loja (Pinheiro, 2025), entre outras, as seguintes questões se levantam: como reuni-los e colocá-los a trabalhar, e para fazer exatamente o quê? E, por favor, que não se entenda “colocá-los” como algo prescritivo, autoritário e ideias correlatas, mas antes o emprego de estratégias, técnicas e instrumentos motivacionais com vistas a harmonizar os objetivos individuais, da Loja e, por que não(?), da Potência, posto que, como em várias ocasiões já foi afirmado, a LEP não deve(ria) ser considerada como uma entidade isolada, mas antes parte de um ecossistema, ainda que as suas raízes (na maioria das vezes) estejam firmadas na livre iniciativa de uns poucos empreendedores, o que, sem trocadilho, significa que surgiram “de baixo para cima”.

Em que pese as propaladas autonomia e liberdade existentes no contexto das Lojas Simbólicas, efetivamente, de fato elas são restritas, ora pelas questões doutrinárias e ritualísticas, ora contidas pelo aparato normativo das Potências, desde que, é claro, tudo seja rigorosamente observado; neste contexto os desvios, se continuados, podem ocasionar disfuncionalidades, gerar excentricidades e até mesmo irregularidades[3]. Já no universo das LEP, sem prejuízo, a autonomia e a liberdade encontram um espaço mais alargado para o exercício da flexibilidade criativa. Assim, ao invés de uma prescrição rígida, pronta e acabada enquanto recomendação para a organização interna ao longo de uma trajetória, o que à primeira vista seria o mais adequado, o que se segue, a exemplo de um guia de orientação sugestiva, é um contínuo de possibilidades abertas à reflexão, à complementação e ao devido ajuste nos casos concretos.

Conforme já mencionado (Pinheiro, 2025a; 2023), antes de constituírem como uma LEP, os precursores, ainda em caráter experimental[4] podem se organizar e trabalhar no formato de um Grupo ou Centro de Estudos (G-CE); este, por sua vez, pode ou não ser originário do Quadro da Loja Simbólica-mãe, complementado ou não com integrantes de outras Lojas Simbólicas (LS)[5]. Essas unidades podem então ser as células seminais, a gênese, o primeiro estágio no sentido à constituição da futura LEP, já então com Carta Constitutiva e sujeita a todos os regramentos e formalidades emanados da Potência e dos órgãos reguladores – as autoridades civis. Por tudo o que já foi dito, são desaconselhadas, de raso, as iniciativas voluntaristas, quase passionais porque lastreadas tão somente nos laços de fraternidade, mas que passam ao largo dos estudos de viabilidade que contemplem os vários aspectos pertinentes ao empreendimento.

 Trabalha-se, pois, com a perspectiva de um gradiente que inicia com uma modelagem mais simples (G-CE) e evolui até o reconhecimento como uma LEP. Em razão das diferenças já constatadas entre as LEP, seja por experiência direta do autor, mas também a partir das manifestações espontâneas ou provocadas já colhidas entre os Irmãos, Pinheiro (2025a, b) estabeleceu uma categorização das LEP: há as “lep”, as “Lep”, as “LEp”, e por último as “LEP”. Como, em última análise, o debate que se segue se dá em torno de Lojas-conceitos, tipos genéricos (ideias com alguma abstração) ao invés de casos concretos, o que então fora denominado como “lep” na sequência foi substituído por G-CE.

Como todo modelo, trata-se de uma representação esquemática, portanto, de uma realidade deliberadamente simplificada com o intuito de, simultaneamente, (1) enquadrar as diversidades agrupando-as em alguns poucos tipos, sem (2) perder a visão compreensiva (da totalidade) do fenômeno; assim, pelo contraste das diferenças é estimulado o pensamento analítico-crítico quando frente ao caso concreto. Também é típico aos modelos dessa natureza acentuar as características-tipo (genéricas) situadas nos extremos, não obstante a maior frequência de casos se verifique a meio caminho; no caso em tela os extremos são representados pelos G-CE e pelas LEP. Ademais, não se aplica aos tipos, quando comparados, qualquer juízo de valor, as diferenças devem antes ser consideradas etapas ou estágios de desenvolvimento, amadurecimento, com especificidades e complexidades crescentes, bem como, acredita-se, repercussão e reconhecimento junto ao público-alvo em razão das entregas proporcionadas.

Uma das questões centrais no estudo das Organizações[6], e só não é a primeira porque requer estudos preliminares, diz respeito à pergunta: quem surge primeiro, a estratégia ou a estrutura organizacional?[7] Ora, partindo do marco zero e sem quaisquer restrições[8], não há dúvida de que a resposta é o planejamento estratégico que viabiliza a concretização da Missão institucional; neste caso a estrutura (física, equipe, tecnologia, tempo, patrimônio, recursos financeiros, etc.) é então ordenada no sentido à implementação do planejamento e ao atingimento dos objetivos e metas. Todavia, passado algum tempo, não necessariamente muito, a administração perde graus de liberdade e as atualizações estratégicas subsequentes, em alguma medida, serão delimitadas, quando não condicionadas pelas estruturas então já existentes. Contudo, é um equívoco atribuir à (última) estrutura vigente a condição de ser uma camisa de força, pois aquela, à luz da revisão estratégica, deliberada, também pode ser revista e reestruturada. Ademais, não raro uma alteração imprevista, por vezes compulsória e irreversível na estrutura (a exemplo da perda de um recurso-chave: uma liderança, uma fonte de financiamento, mudança legislativa, imprevistos de toda natureza – enchentes, incêndios, etc.) obriga à revisão de ambas, da estratégia e da estrutura. Essa é uma lei universal, à qual são submetidos os indivíduos e também as Organizações de toda a natureza; portanto, ignorá-la não é de bom alvedrio.

 Por óbvio que seja, não custa relembrar esse aspecto, sobretudo no âmbito de uma Organização reconhecidamente conservadora como é o caso da Maçonaria, tão ciosa das suas Tradições mesmo quando já se perderam nos tempos as causas, as motivações e a razão de ser de alguns dos seus usos e costumes. Nesse ambiente, não só negar, mas efetivamente lutar contra qualquer proposição de mudanças (inovações), independentemente dos argumentos a favor, mas que não têm como resistir à alegação de que “aqui sempre foi feito assim”, é uma realidade muito frequente. Todavia, como afirmava Heráclito[9], tudo flui, tudo está em permanente devir; assim, a circunstância de a Tradição possuir valor intrínseco não elide que ela, permanentemente, seja sopesada frente às possibilidades de inovação e renovação (Pinheiro, Dutra e Filardo, 2025), senão por outros motivos (sobreviver!), pelo que proclamou outro sábio da Antiguidade, Aristóteles[10]  – virtus in medium est. Assim, o modelo esquemático, a seguir explicitado, é também uma lembrança de que sempre há espaço para, em resposta às mudanças ambientais, melhorar (ser mais eficaz, efetivo e eficiente à luz da Missão institucional), quiçá crescer; em síntese:

  1. G-CE: a informalidade caracteriza este estágio, quando não há qualquer traço de institucionalidade. Os Irmãos, todos Mestres, muitos já Mestres Instalados, reúnem-se, literalmente, por puro diletantismo, comportam-se como efetivos filósofos: sabem que não chegarão à sabedoria, mas estão dispostos a despender algum tempo e recursos para se afastarem da ignorância. As agendas são livres e flexíveis quanto:
    1. ao conteúdo – a escolha do tema (problema) a ser debatido é decidida pela maioria, podendo ser um tema de ocasião e sem qualquer preocupação com a eventual utilidade ou interesse de terceiros (uma LS, a Potência), etc.;
    1. ao cronograma – as datas são acordadas conforme as disponibilidades e as conveniências da maioria;
    1. ao local – não há endereço fixo, assim, o ponto de encontro pode ser escolhido por rodízio entre os participantes ad hoc;
    1. cada um traz ao grupo de acordo com o seu background, seja ele acadêmico, profissional ou constituído pelas vivências em geral;
    1. as atividades se desenvolvem sem preocupações com registros ou emprego de métodos;
    1. os custos são individuais e, quando for o caso, rateados entre os participantes – tudo gira em torno dos CPF[11];
    1. finalmente, não há compromisso, mas nada impede o compartilhamento e a divulgação junto à comunidade maçônica acerca dos eventuais saberes adquiridos ou refinados nos encontros;
  2. Lep: o segundo estágio corresponde à fundação e ao recebimento da Carta Constitutiva com autorização para atuar como Loja de Estudos e Pesquisas:
    1. se a etapa anterior (enquanto G-CE) foi bem sucedida, ser uma “Lep” surge antes e acima de tudo como uma condição necessária, identificada pelo Quadro, para o atingimento dos (novos, mais exigentes e elevados) objetivos, metas, bem como assunção de responsabilidades e compromissos. De regra, o ponto de partida é institucionalização das atividades no contexto do ecossistema maçônico (a começar junto à Potência), o que tem início com o seu reconhecimento como Pessoa Jurídica, cujo CNPJ[12] adquire, então, primazia sobre os CPF dos integrantes; caso contrário, qual o sentido de constituir uma Lep?
    1. é quando têm início, por exemplo, outras formalidades: dia, horário e local fixos (tornados públicos) para as reuniões que então devem ser antecedidas de convocações e ter as suas atividades registradas (atas). A Lep deve ainda atender às demais exigências, tanto as internas à Potência (Constituição, Regimento e demais marcos regulatórios, eleições para a escolha da Administração, dar publicidade aos seus atos, prestar contas, etc.) quanto as externas emanadas pelo poder público, ao qual se submete em razão da sua condição como Pessoa Jurídica de direito privado – Associação;
    1. estratégia vs estrutura:
      1. se a Lep vivenciou o estágio como G-CE, o que se espera é que o Quadro tenha fixado objetivos, metas e delineado estratégias alinhadas com as habilidades e as competências dos seus fundadores (a estrutura básica), o que não a impede de, doravante promover buscas ativas com vistas a complementar o Quadro com o preenchimento das lacunas correspondentes às necessidades identificadas;
      1. caso contrário, tudo pode acontecer, inclusive que tudo continue tal como antes da passagem de G-CE à Lep, ou mesmo nada pois, conforme já esclarecera Sêneca:

O arqueiro deve saber o que ele está tentando atingir; então deve apontar e controlar a arma por sua habilidade. Nossos planos malogram porque não têm objetivo. Quando um homem não sabe a qual porto ele está indo, nenhum vento é o vento certo[13].

  • a formalização, o desenvolvimento e o aperfeiçoamento das atividades seguirão o curso e o ritmo na razão direta do esforço e do comprometimento do Quadro. E dado que o CNPJ passa a se sobrepor sobre os CPF, a Administração deve se ocupar no sentido de que, sem prejuízo às livres iniciativas, as atividades e os empreendimentos da, agora Lep, contem com o envolvimento do maior número de integrantes;
    • enquanto um G-CE, as reuniões não apresentavam sinais de que eram um encontro de maçons; desde que constituída como uma Lep, para alguns cria-se a necessidade de, em todas as reuniões, independentemente do lugar (seja em um Templo ou não), introduzir elementos ritualísticos, notadamente na abertura no fechamento dos trabalhos. Todavia, não é um consenso e tampouco há normativa específica (pelo menos que se conheça), o que, em última análise, resulta que fica a critério da Administração, cujas práticas, se continuadas, dão então origem aos usos e costumes da Loja;
  • LEp: já constituída enquanto Loja, a próxima etapa, natural, é a maior dedicação aos estudos – por oportuno, recomenda-se a leitura dos primeiros textos desta Série, quando a questão (significado) do Estudo (combinado à Pesquisa) no contexto ora em foco já foi largamente abordada;
    • nesta etapa, para o maior aproveitamento dos estudos é possível recorrer a um expediente muito simples sugerido por Giannetti (2002): a escolha do tema a ser debatido em cada encontro deve se fazer acompanhar de um responsável pela elaboração do texto (de tamanho limitado) que, previamente distribuído, orientará as reflexões do Quadro. Parecem evidentes os objetivos do proponente: (i) eliminar a possibilidade de que no “dia D” a matéria a ser debatida seja de duvidosa relevância, o que, na ausência da iniciativa (leia-se: planejamento), teria aumentada a chance de ocorrência; (ii) proporcionar tempo para que cada um possa se preparar para qualificar o futuro debate; (iii) conferir direcionamento à reunião, evitando assim a habitual dispersão temática; e, ao (iv) assegurar que pelo menos um tenha domínio sobre o assunto, fica encaminhada, também, a coordenação da atividade. A limitação do tamanho do texto é uma estratégia para levar o redator à seleção, em meio à diversidade encontrada na bibliografia, dos assuntos julgados mais relevantes para serem levados a debate no grupo, mas também proporciona o inventário de questões subsidiárias que, por terem sido excluídas da seleção inicial, poderão ser oralmente expostas ao grupo, o que também evita os silêncios típicos de quando ninguém tem algo a acrescentar. É importante observar que, se o objetivo é a sabedoria, nada deve escapar ao gerenciamento, ser deixado ao acaso – a passagem do G-CE à condição de Lep, e depois à LEp, requer e pressupõe este amadurecimento do Quadro;  
    • nessa linha, sucede ao debate, a elaboração de um texto que explore os principais tópicos e análises realizadas, consolide as reflexões, assim como as questões que ainda restaram em aberto para futuros debates. É de se notar que os 2 (dois) textos, o de abertura e o de fechamento, são exercícios preparatórios para o terceiro, também a ser refinado pelo Quadro, mas já com o propósito de ser compartilhado, seja nas LS dos signatários, através das respectivas redes sociais, blogs abertos (públicos) ou mesmo submetido à publicação em veículos com Conselho de Avaliadores; assim,
    • e aos poucos a LEp, coletivamente, não só reúne um rol de referências bibliográficas (por oportuno, tanto os autores quanto as respectivas obras também devem ser objeto de debates), como aos poucos constitui um acervo com as suas produções autorais. E não menos importante, desenvolve e aprimora a atividade colaborativa (da pesquisa bibliográfica ao debate qualificado), exercita a comunicação escrita, se apresenta à comunidade relevante e, mediante a crítica externa pode aprimorar os seus procedimentos e enriquecer as suas iniciativas, empreendimento que pode ser sobremodo facilitado e alavancado a partir das leituras (e debates), entre tantos, de Adler e Doren (2010), Payot (2018), Riboulet (2019) e Sertillanges (2019), textos que certamente proporcionarão grande empuxo e qualificação às atividades da próxima etapa;
  • LEP: a ascensão na curva de experiência representada pelas etapas anteriores robustece e prepara a Loja para o que é (deve ser) a função precípua de uma LEP no ecossistema: a geração (através da pesquisa) e a difusão de conhecimentos inovadores, isto é, que acresçam e complementem a literatura já existente, esta vista como necessária, indispensável até, mas já então insuficiente à luz dos novos propósitos, razão pela qual (em complemento à etapa anterior) ela é agora considerada como o ponto de partida das reflexões que orientarão os empreendimentos (pesquisas) no sentido a responder às questões ainda em aberto, controversas, à espera de um olhar a partir de uma perspectiva diferenciada, etc. Por oportuno, se de um lado a ideia de inovação é ampla o suficiente para contemplar ajustes às especificidades (locais, conjunturais, etc.), de outro lado essa amplitude não pode servir para abranger (e justificar como inovadora) “qualquer coisa”, sobretudo quando fica à evidência (para os leitores mais instruídos) que aquele adjetivo decorre da falta de conhecimento da realidade já descrita na literatura. Como já está pacificado que às LEP não cabem produzir “mais do mesmo”, ressalta a importância de a etapa anterior (LEp) ser suficientemente amadurecida antes de passar à condição de LEP;
    • nessa etapa da sua trajetória, com elevado grau de maturidade, os processos internos já estão em grande medida institucionalizados:
      • porque elaborada com grande antecedência, salvo motivo de força maior, a agenda é rígida: todos sabem que no dia X, o tema Y será debatido e o condutor da reunião será A. Nada impede[14] que ocasionalmente pessoas de notório saber (em relação ao tema), Iniciadas ou não, sejam convidadas a participar dos debates. A agenda, é sabido, não se esgota com as atividades de Estudo e Pesquisa (E&P), mas as demais, administrativas e burocráticas, tanto quanto possível podem (idealmente devem) ser equacionadas com o recurso às tecnologias de comunicação à distância e assíncronas, para que o tempo de reunião presencial seja, predominantemente, alocado à função precípua da Loja;
      • não obstante o Quadro, já numeroso, se encontrar departamentalizado por áreas de competências (conhecimento especializado), não só é intenso o intercâmbio entre elas, como os integrantes (de acordo com as suas disponibilidades e condições de entrega) são estimulados a participar de mais de uma área ou subgrupo. Assim, ao contrário (mas sem prejuízo) dos agrupamentos espontâneos e por afinidade de temperamento e personalidade (típicos da primeira fase: G-CE), as aproximações no contexto de uma LEP são motivadas por afinidades temáticas, intelectuais, em busca de sinergias para satisfazer os anseios que resultarão na produção de novos conhecimentos (inovadores) e quiçá produtos-serviços (palestras, publicações, etc.);  
      • considerando que atualmente são raros os polímatas (como eram os maçons que integravam a Royal Society e outros), a departamentalização temática é também uma estratégia para superar as limitações individuais; contudo, nem mesmo os grupos conseguem ser proficientes em todos os assuntos, razão pela qual a Loja deve focar a sua atuação em algumas poucas áreas temáticas nas quais pode vir a ser a referência como, por exemplo:  Perspectiva Histórica, Rito(s), Simbologia, Maçonaria & Sociedade, Gestão, etc. Ademais, cada um desses temas guarda-chuva comporta desdobramento: a Perspectiva Histórica, em História Comparada (países, Ritos, períodos, etc.); a Maçonaria Brasileira, em regional, por jurisdição, Potências, etc.; a Maçonaria & Sociedade pode ser desdobrada em Beneficência & Filantropia e outras. Em síntese: a primeira departamentalização tende a ser conforme a estrutura já existente, produto da evolução espontânea da Loja, mas nada impede, à luz de novas diretrizes, a busca ativa para abrir novas áreas e desenvolver competências até então inexistentes. Por exemplo, se a Potência oferece 4 (quatro) Ritos, é de se esperar que pelo menos uma LEP conte com pelo menos um membro proficiente em cada um dos Ritos[15], e o mesmo raciocínio se aplica à História da maçonaria local. Note-se, também por isso, a conveniência da ação articulada entre as LEP, o poderá ser conduzido de moto-próprio ou induzido pela Potência;
      • os projetos de pesquisa, individuais ou elaborados a partir de parcerias internas ou entre as áreas (e/ou com a cooperação externa), são pautados e levados ao conhecimento do Quadro, cujos membros, após debate poderão ao não aderir à participação;
        • a sugestão de que a Loja tenha um foco de atuação favorece que ela (CNPJ) se constitua como uma referência (local, regional ou nacional) nas matérias às quais se dedica, mas nada impede que os seus integrantes (CPF) de escol também se envolvam e desenvolvam E&P sobre outros domínios;
    • experiente, seja através das iniciativas individuais ou para compartilhar os produtos-serviços dos trabalhos em equipe, a Loja participa ativamente dos Editais seletivos, quando submete os resultados das suas pesquisas e ensaios, etc. Ademais, mantém contato assíduo com outras Lojas e pesquisadores, nacionais e internacionais, com os quais eventualmente firma parcerias, inclusive com não-Iniciados, independentemente do gênero. Mantém-se, também, atualizada com as publicações dos E&P veiculados nos principais periódicos nacionais e internacionais;
    • em razão da projeção alcançada, a Loja é a referência que lidera no seu ambiente de influência institucional, além de geradora de conhecimentos, catalisa novas iniciativas mediante a transferência de tecnologia (o saber fazer no seu domínio), toma à frente no sentido à realização de eventos (seminários, concursos, cursos, etc. – presenciais ou à distância) e frequentemente é demandada para colaborar com as Lojas Simbólicas, mas também nos empreendimentos das suas congêneres; por fim,
    • o crescimento e o êxito alcançados, contrariando a boa norma, chegam mesmo a comprometer a estabilidade do planejamento, tantas são as demandas que para atendê-las a contento a Administração se vê compelida a solicitar a colaboração de todos e eventualmente dividir a equipe; assim, enquanto alguns realizam estudos internos, outros estão em pesquisa de campo, um terceiro grupo encontra-se em trânsito para apresentar um seminário. Planejar as novas estratégias e estruturas é o próximo passo natural.  

Finalmente, conforme esclarecido, as etapas (1 a 4) apresentadas e descritas acima, quando reunidas constituem um modelo esquemático que combina elementos reais com expectativas (razoáveis, coerentes) para bem caracterizá-las e discriminá-las. Ao não apresentar as LEP como um fenômeno único, pronto e acabado a partir da sua fundação (como se inexistissem perspectivas de crescimento, melhoria e diferenciação por especialização), mas antes como uma sucessão de etapas, o objetivo foi chamar a atenção, parafraseando Buda, de que “Toda grande caminhada começa com um simples passo”[16]; ademais, lembrar que nada surge por geração espontânea, é preciso intencionalidade e, no caso das LEP, cooperação, como de sorte ocorre com a maioria dos empreendimentos. Se assim não for, dificilmente uma LEP poderá ser considerada uma herdeira e seguidora da Loja-mãe, a Quatuor Coronati. E não dá para deixar de observar que este olhar em perspectiva vai plenamente ao encontro do que caracteriza as Escolas Iniciáticas: o estudo e as descobertas são graduais, mas há que ter objetivos e metas, um ideal a ser perseguido.

Para não estender em demasia este texto, no próximo e último número desta Série serão apresentados os entraves, mas também as oportunidades de E&P na Maçonaria, em particular no cenário brasileiro, com considerações desde os aspectos culturais, mais abrangentes, às questões políticas internas determinantes para que a cooperação, neste domínio, seja pouco mais do que uma bandeira discursiva, à conveniência, sem que sejam criados mecanismos e projetos efetivos.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ADLER, Mortimer J.; DOREN, Charles van. Como Ler Livros – o guia clássico para a leitura inteligente. São Paulo: É Realizações, 2010. ISBN 978-85-88062-89-4.

GIANNETTI, Eduardo. Felicidade: diálogos sobre o bem-estar na civilização. São Paulo: Cia. das Letras, 2002. ISBN 978-85-359-0297-6.

PAYOT, Jules. A Educação da Vontade. São Paulo: Kírion (CEDET), 2018. ISBN 978-85-94090-16-4.

PINHEIRO, Ivan A. Sobre as lojas (maçónicas) de estudos e pesquisas – VII. Disponível em Bibliot3ca Fernando Pessoa: https://bibliot3ca.com/sobre-lojas-maconicas-de-estudos-e-pesquisas-vii/. Publicado em 21.06.25.

______ . Sobre as lojas (maçónicas) de estudos e pesquisas – VIII. Disponível em Bibliot3ca Fernando Pessoa:  https://bibliot3ca.com/sobre-as-lojas-maconicas-de-estudos-e-pesquisas-viii/. Publicado em 09.07.25a.

______ . Sobre as lojas (maçónicas) de estudos e pesquisas – I. Disponível em Freemason: https://www.freemason.pt/sobre-as-lojas-maconicas-de-estudos-e-pesquisas-i/, publicado em 08.04.25b e também em Bibliot3ca Fernando Pessoahttps://bibliot3ca.com/wp-content/uploads/2025/05/sobre-as-lojas-maconicas-de-estudos-e-pesquisas-i.pdf.

______ . A Associação que abriga a Loja Maçônica: um espaço à criatividade, alcances e desdobramentos gerenciais. Disponível em Freemason: https://www.freemason.pt/a-associacao-que-abriga-a-loja-maconica/. Publicado em 17.08.23, acesso em 20.07.25.

PINHEIRO, Ivan A.; DUTRA, Lucas V.; FILARDO, José. O Repto da Modernização e a Arte Real. In: AMVBL – Academia Maçônica Virtual Brasileira de Letras (Org.). Os Desafios da Maçonaria na Contemporaneidade – tecnologia, olhares e impactos na sociedade. Brasília, DF: Independently Published, 2025, p. 55-81.

RIBOULET, Louis. Conselhos sobre o Trabalho Intelectual. Campinas, SP: Kírion (CEDET), 2019. ISBN 978-85-94090-15-7. 

SÊNECA, Lúcio A. Aprendendo a Viver – cartas a Lucílio. Porto Alegre: L&PM, 2009. ISBN 978-85-254-1718-3.

SERTILLANGES, Antonin-Dalmace. A Vida Intelectual – seu espírito, suas condições, seus métodos. Campinas, SP: Kírion (CEDET), 2019. ISBN 978-85-94090-19-5.


Notas

[1] MM, Pesquisador Independente, e-mail: ivan.pinheiro@ufrgs.br. Porto Alegre-RS, 19.07.25. O autor não só agradece a leitura e as considerações do Irmão Lucas V. Dutra, Mestre Maçom do Quadro da ARLS Presidente Roosevelt, 75, Or. de São João da Boa Vista, jurisdicionada à GLESP – Psicólogo, Professor Doutor em Psicologia, Especializado em Maçonologia (UNINTER), e-mail: dutralucas@aol.com, como também reafirma a sua responsabilidade pelo conteúdo, erros e omissões remanescentes.     

[2] Que podem ser consultados em https://bibliot3ca.com/ e também em https://www.freemason.pt/.

[3] Ambas, a autonomia e a liberdade foram conferidas para que as Lojas tenham flexibilidade de ajuste no sentido ao melhor desempenho das suas atividades, mas, a depender da Administração em particular, e do Quadro em geral, podem ser utilizadas para outras finalidades, inclusive o “nada fazer” ou dar origem aos modos exóticos de trabalhar, o que, cedo ou tarde, leva à existência de diferenças incompreensíveis entre as liturgias das Lojas, ainda que no âmbito do mesmo Rito e Potência.   

[4] Para que os integrantes se conheçam melhor, avaliem as suas possibilidades (expertises, disponibilidades, etc.) e amadureçam um plano de trabalho.

[5] Que inclusive podem, sem prejuízo de outras, firmar parcerias (Tratados de Amizade) com a LS-mãe.

[6] E na perspectiva adotada (Pinheiro, 2025a), tanto a Associação, quanto a LS e a LEP são Organizações.

[7] A sua equivalente, no cotidiano, é: “quem surge primeiro: o ovo ou a galinha?”.

[8] A hipótese da inexistência de restrições é uma idealização, pois de regra os recursos à disposição tendem a ser limitados. Todavia, o bom senso sugere que antes de dar início a qualquer empreendimento sejam vistas e revistas todas as condições, evitando-se aventuras e riscos que, não raro, repercutem sobre terceiros.

[9] 500 – 450 a.C.

[10] 384 – 322 a.C.

[11] Cadastro de Pessoa Física.

[12] Cadastro Nacional das Pessoas Jurídicas.

[13] Trata-se da epístola (carta) LXXI – Sobre o Bem Supremo -, de Sêneca (4 a.C. – 65) dirigida a Lucilio. Disponível em: https://www.estoico.com.br/1304/sobre-o-bem-supremo/. Acesso em 16.07.25. Outras Cartas podem ser vistas em Sêneca (2009).

[14] A menos da “questão ritualística” acima referida.

[15] Aqui, por certo, deve se aplicar a especialização por concentração espacial-regional de Lojas & Ritos; se em determinada região todas as Lojas praticam o Rito A, e sobre este que a LEP regional deve reunir proficiência.

[16] Disponível em https://www.pensador.com/frase/OTMxMTQw/, acesso em 16.07.25. Buda (563 – 483 a.C.). Há uma variação, atribuída a Lao-Tsé (? – 531 a.C.): “Uma longa viagem começa com um único passo”, disponível em https://www.pensador.com/frase/MTYxNQ/. Qualquer que seja a versão, ambas apontam que os grandes empreendimentos só são percebidos como tal (grandes) ao final, pois o processo se desenvolve passo a passo, dia após dia, pelo que demandam visão de longo prazo, tempo, paciência e tenacidade entre outros atributos, na Ordem, consideradas virtudes.