Bibliot3ca FERNANDO PESSOA

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RER – Cadernos de Estudos: IV

   Por Ivan A. Pinheiro[1]

Em Pinheiro (2024a, b, c), entre outros aspectos, fundamentalmente foram problematizadas: (1) as causas históricas e, por consequência, a dificuldade de, hoje e de modo categórico, estabelecer as fronteiras entre a Maçonaria & Religião[2]; bem como (2) a aceitação acrítica das Escrituras como pedra fundamental de toda e qualquer construção e análise simbólica no contexto da maçonaria e, sobretudo, as lições morais que daí podem advir. No que refere a (1), se de um lado é muito claro que a Maçonaria não alimenta intenções salvíficas e daí que tampouco pronuncia sacramentos, o que a torna inequivocamente distinta da Religião, de outro, o largo emprego pela primeira, tanto da cosmovisão quanto do ethos e do pathos próprios à segunda, favorece o surgimento de áreas nebulosas. Já no que tange à (2), para evitar as armadilhas e as contradições é preciso cautela e assumir a postura do exegeta: para além do texto, também apreciar o contexto, de regra poliédrico, o que naturalmente tende a aclarar a separação entre a realidade histórica vs elaboração teológica e, mais importante, aguçar o olhar para identificar quando as narrativas próprias do campo teológico são apresentadas como realidades provadas pela história.

   Especificamente em Pinheiro (2024c) foi apresentada uma das chaves de análise mais usuais para identificar e discriminar as posturas frente à divindade; em síntese: teísta, deísta, agnóstica ou atéia. A rigor, apenas os teístas deveriam integrar a Ordem pois, com efeito, muitas ritualísticas pressupõem esta postura. Todavia, em razão dos problemas e das inconsistências doutrinárias e práticas surgidas com o passar do tempo, a fim de solucionar conflitos e acomodar as divergências os critérios foram afrouxados e, hoje, as 3 (três) primeiras coabitam nas Lojas e, creio, há dúvidas quanto a presença da última em que pese a contrariedade à Ordem. Essa realidade sugere a insuficiência ou mesmo o esgotamento dessa chave de análise para discriminar, nos dias atuais, os Iniciados. Como evidência adicional, o fato de alguns optarem por referir aos Irmãos como dogmáticos vs adogmáticos; neste caso, o primeiro grupo reuniria os teístas, os deístas e os ateus – os 2 (dois) primeiros pela convicção da existência de uma divindade criadora, o terceiro pela sua inexistência -, enquanto que os agnósticos, pela falta de evidências (admitidas como provas irrefutáveis) da existência, mas também da inexistência divina, não assumem posturas categóricas (dogmáticas), colocando-se antes como observadores que eventualmente se posicionam ad hoc. Esse quadro, então, remete a um dos objetivos deste texto: apresentar uma chave de análise, senão alternativa, complementar no sentido a contemplar a realidade factual da Lojas. Paralelamente emerge o segundo objetivo: traçar um brevíssimo histórico, portanto em caráter introdutório, acerca do surgimento das crenças, algumas institucionalizadas como religiões, que compõem o pano de fundo em meio ao qual foi escrito o “Tratado da Reintegração dos Seres – TRS” (Pasqually[3], 2022), livro-texto seminal ao RER[4]; sendo este, então, o terceiro objetivo: o delineamento do contexto e a apresentação de alguns elementos, ainda em nível de grande abrangência, do TRS. O que se pretende, no que tange ao terceiro objetivo, é chamar a atenção para o fato de que o TRS não é uma obra isolada e tampouco exótica, mas antes um produto do seu tempo, e através da qual o autor claramente se posiciona frente aos debates e embates então em curso: razão vs fé.

   É ponto pacificado que para além das questões mais imediatas relativas à sobrevivência e à preservação da espécie (alimento, segurança, reprodução e descendência), muitas dentre as elaborações intelectuais do homem tiveram (e ainda têm) por motivação a busca pela compreensão do mundo, em geral sintetizada nas respostas às chamadas questões fundamentais: de onde viemos (a origem do Universo e da vida), para aonde vamos e qual a nossa razão de ser – o sentido da vida? Em meio a tanto, também as incompreensões frente ao mal, ao sofrimento, bem como acerca das limitações e impotências do homem, sobretudo frente à morte. As narrativas que organizam as respostas às questões fundamentais são então identificadas como cosmogonias ou teogonias, pois nem todas as cosmogonias têm (ou tiveram) o consórcio de alguma divindade. Todos os povos, e cada um, ao longo da história elegeu a sua cosmovisão.

   Em síntese, no início dos tempos foi a regularidade dos fenômenos (a alternância dos dias-noites, dos ciclos lunares, das estações do ano, dos solstícios e equinócios, das marés, dos ciclos das vidas animal e vegetal, etc.), mas também a irregularidade (eclipses, surgimento de cometas, meteoros, atividades sísmicas, extremos climáticos, etc.) que chamaram a atenção dos observadores mais atentos. E um salto na História, sem que se possa precisar a sequência, se concomitantemente ou após, desde cedo também foram estabelecidas[5] associações entre os eventos cósmicos (da ordem celeste), os acontecimentos e a vida na polis – guerras, doenças, abundância ou escassez na caça, coleta, colheita, etc. Entre tantos (Tarnas, 2005; Nay, 2007), um dos textos contemporâneos que bem ilustra a associação estabelecida é o de Ferry (2012, p. 126):

[…] reside no que chamei de o cosmológico-ético, ou seja, a ideia de que o bem e o mal, o justo e o injusto encontram uma definição e critérios objetivos em determinada representação da harmonia cósmica: se a ordem natural das coisas é desigual e hierarquizada, a cidade justa deverá, também ela, querendo ou não, refletir a hierarquia natural que existe no universo entre os seres – animais, vegetais e humanos.

É esta lógica, trazida aos tempos atuais por Ferry, que orientou uma das obras que posteriormente iria inspirar diversos pensadores, “A República” (Platão[6], 2000). Assim, de algum modo e em alguma medida, ainda que desconhecidos os mecanismos, os usos e costumes entre os homens passaram também a ser ditados pelo comportamento observado nos astros então alçados à condição de deuses antropomorfizados[7], isto é: dotadas de características humanas (pensamentos, vontades, vícios, virtudes, etc.), o que também equivale a dizer: poder para interferir nos destinos. Em outros termos, muito próximos à Maçonaria, tem-se aí a expressão de um dos 7 (sete) Princípios Herméticos, mais especificamente o segundo, o Princípio da Correspondência: “Assim como no alto, embaixo; assim como embaixo, no alto” (Três Iniciados, 2017, p. 30).

   Portanto, conhecer o comportamento dos céus poderia subsidiar, quiçá induzir e mesmo controlar os acontecimentos no plano terreno; e vice-versa, o que dará origem aos cultos com oferendas para a expiação, para a obtenção de graça, etc.  Surgiram, assim, na Antiguidade (na região do Crescente Fértil[8]) e no seio das primeiras civilizações, não só os mitos e as lendas (muitas a largo ainda hoje exploradas na Maçonaria: Ísis e Osíris, Elêusis, variações do Dilúvio, Orfismo, etc.) em resposta às questões fundamentais, como também os intérpretes e interlocutores entre os situados acima e os abaixo. Quem explora com muita clareza essa visão “naturalista” do surgimento das crenças (que em ampliação conceitual podem ser consideradas como as primeiras “hipóteses científicas”[9]) e que posteriormente serão incorporadas à Maçonaria, é Pike (2011)[10].

   Ademais, identificar padrões e associações (por vezes percebidas, equivocadamente ou não, como relações de causa-efeito) entre os fenômenos, não só é inerente à natureza humana como atitude submetida a contínuo refinamento; e se organizados (as associações e os padrões) em narrativas com encadeamentos lógicos, contribuem para a melhor compreensão da realidade, sobretudo do entorno: por que as coisas são (e ocorrem) tal como percebidas. Tamanho empreendimento tem sido um dos objetivos permanentes da humanidade, lato sensu: a busca pelo conhecimento – um portfólio de saberes, direta ou indiretamente, também comprometidos com as respostas às 3 (três) questões fundamentais.

   Todavia, aos poucos ganha força a percepção de que as reflexões apenas sobre os aspectos sensíveis da natureza eram insuficientes para dar conta de todas as questões e enigmas; o homem, então, se percebe constituído senão por 2 (duas), por 3 (três) dimensões: corpo, alma e espírito[11]. A transcendência (misteriosa e oculta) entra em cena, o que inevitavelmente levará aos sistemas de crenças, à magia, à teurgia e, por fim, às religiões institucionalizadas mediadas (posto que entre os acima e os abaixo), conforme já mencionado, pelos intérpretes e intermediários. Entretanto, mesmo frente à admissão da dualidade (matéria e espírito), a vida (o cotidiano, os usos e costumes, os objetivos, os valores, etc.), da Antiguidade ao Medievo era ordenada no sentido da elevação da matéria ao espírito que, juntos, constituíam uma Unidade[12] indissolúvel (Reale, 2014). Parte integrante desse ambiente, o entendimento de que o já então sacerdote é, de fato e de direito, um representante (quando não o próprio outorgante), no plano sensível, das forças ocultas e suprassensíveis. Na cultura ocidental os acontecimentos na Grécia antiga constituem as principais referências, mas fenômenos e especulações análogas, conforme já observado, foram constatadas do Ocidente (Velho Mundo) ao Oriente, inclusive no que viria a ser o Novo Mundo (as Américas).   

   Ao período mítico (orfismo e em alguma medida ao pitagorismo), quando então tudo é considerado como produto da vontade dos deuses, sucede o da filosofia natural (Reale, 2012), quando as preocupações (isto é, a busca pela resposta às questões fundamentais) se voltam para os elementos da natureza (água, fogo, ar e terra), de como eles se organizam, se combinam em proporções, se transformam e podem mesmo ser transmutados para dar forma ao mundo e à vida. É o início, do que muitos séculos após, será conhecida como a secularização da história. Esse esforço coletivo, durante os séculos que imediatamente antecederam a cristianismo, levou às primeiras concepções atomísticas, cujo modelo básico perdurou por cerca de 2 (dois) milênios e, mutatis mutandis, inspirou a primeira teoria atômica moderna, a de J. Dalton[13] que, por sua vez, somente viria a ser completada[14] ao final do século XX, e que hoje constitui o chamado Modelo Padrão.   

   Posteriormente, já na Modernidade, a dualidade já referida assumirá uma nova característica, vista então (por alguns) como necessária, indispensável mesmo, ao empreendimento científico nascente e calcado no empirismo: trata-se do dualismo cartesiano, a separação, em novos termos, da mente vs corpo (Matthews, 2007), promovendo então o rompimento da Unidade até então vista como indissolúvel que, lembre-se, dava sentido à vida. O dualismo cartesiano, ao acentuar o secularismo já em curso, não só inaugurou uma nova cosmovisão, reconfigurando os papeis e as relações entre o humano e o divino, como trouxe fricções entre o moderno pensamento científico, então emergente (baseado na razão e no empirismo) e a fé. Em curso a tendência referida como a dessacralização dos usos e costumes que, então, dará efetividade ao dualismo cartesiano (Garrett, 2008). Se o primeiro dualismo (o dos Antigos) era não dual, o novo dualismo (o Moderno) é, de direito e de fato, efetivamente dual. Em outros termos: o sentido da vida apreciado pela perspectiva do corpo não mais guardava correspondência com a perspectiva da alma. Para os críticos do novo dualismo, de regra os homens de fé, doravante um dos objetivos será o retorno à Unidade perdida, à união do que havia sido fragmentado, uma efetiva correção pois, afinal, havia se dado a separação do inseparável (mente[15] vs corpo), portanto algo a ser urgentemente reparado.

   A História, sabe-se, é longa, riquíssima, repleta de detalhes e idiossincrasias que não podem ser exploradas em um espaço tão limitado como este. Assim, e em resumo, com o passar dos tempos as lendas e os mitos reunidos em narrativas constituíram as cosmogonias (como, da inexistência ou do caos primordial se passou à ordem observada, como surgiu a vida?), algumas na forma de teogonias (isto é, com a interferência de entidades sobrenaturais). Todavia, tais como a ciência moderna, as lendas e os mitos, pouco a pouco, porém crescentemente também tiveram que fazer o enfrentamento às novas questões que, a reboque, foram trazidas pelas primeiras respostas.

   É importante notar que foi no curso e na longa busca pelas respostas às questões fundamentais que surgiram novas e inusitadas perguntas, em parte como produto da crítica às primeiras respostas – os mitos e as lendas. Portanto, o que a História revela é, primeiro, um encadeamento de “questões – buscas – respostas – novas questões – novas buscas – novas respostas” e assim sucessivamente em um processo até o momento sem fim à vista, efetivo moto-contínuo – marco do desenvolvimento científico e tecnológico –, pois fazer do incognoscível, cognoscível, é o objetivo, em perfeita sintonia com Gleiser (2018, p. 14): “O não saber é a musa do saber”. Ademais, não obstante a fricção mencionada, Stark (2021) chama a atenção para a proximidade e mesmo complementariedade entre a razão e a fé:

Dediquei um livro à resposta: é que a base verdadeiramente fundamental para a ascensão do Ocidente é uma fé extraordinária na razão e no progresso, e essa fé teve origem no cristianismo […] a ciência da fé, a teologia consiste em raciocínio formal acerca de Deus. A ênfase recai em descobrir a natureza de Deus, suas intenções, suas exigências, bem como em compreender como estas últimas definem a relação entre os seres humanos e Deus. E os pensadores cristãos têm feito isso, não através da meditação, novas revelações ou inspiração, mas através da razão (op. cit., p. 101)[16];

E citando Quinto Tertuliano[17]: “A razão é uma coisa de Deus, já que não há nada que Deus, Criador de tudo, não tenha provisionado, disposto e ordenado pela razão: nada que ele não tenha querido deveria ser manuseado e compreendido pela razão” (op. cit., p. 101) e, finalmente, cita Sto. Agostinho[18]: “O céu proíba que Deus odeie em nós precisamente aquilo pelo qual Ele nos fez superiores aos animais! O céu proíba que acreditemos de tal maneira a não aceitar ou procurar razões, já que não poderíamos sequer crer se não possuíssemos almas racionais” (op. cit., p. 102). A propósito, São Tomás de Aquino, no séc. XIII, já havia defendido que a razão e a fé podem andar de mãos juntas, uma em complemento a outra.

   Em que pese as incontáveis respostas (às questões fundamentais, bem como às demais), todas, umas mais outras menos, se revelaram temporárias e, não sem exagero, apesar do acervo de conhecimento acumulado, as dúvidas não só persistem, como dia a dia tantas outras se somam. Gleiser (2018, p. 23) precisa essa realidade:

[…] vemos que, quando a Ilha do Conhecimento cresce, nossa ignorância também cresce, delimitada pelo perímetro da Ilha, a fronteira entre o conhecido e o desconhecido: aprender mais sobre o mundo não nos aproxima de um destino final – cuja existência não passa de uma suposição alimentada por esperanças infundadas -, mas, sim, leva a novas perguntas e mistérios. Quanto mais sabemos, melhor entendemos a vastidão de nossa ignorância e mais perguntas somos capazes de fazer, perguntas que, previamente, nem poderiam ser sonhadas.

Ainda que funcionais em muitos aspectos, pois já há séculos proporcionam o desenvolvimento, o progresso, o conforto e o bem-estar das civilizações, em razão das limitações[19] evidenciadas pelas grandes teorias e modelos explicativos, permanentemente colocados em xeque, como é o caso do Big Bang, do Modelo Padrão, do Evolucionismo, da Teoria da Relatividade, da Mecânica Quântica, dos Estudos da Mente (neurociências), entre outros, há fortes indícios de que somente a emergência de novos paradigmas possibilitarão avanços no estado da arte nos mais variados domínios do conhecimento.   

   Ora, de um lado o estado da arte revela ter chegado aos limites do que à luz do conhecimento e das técnicas atuais pode ser deslumbrado, bem como são grandes (e por vezes se apresentam como intransponíveis) os óbices à expansão das fronteiras que, se ampliadas e a ter por base o que afirma Gleiser, conduzem ao paradoxo: quanto maior o conhecimento, também maior a ignorância. Há, pois, claras evidências de impasses. Parece estar a ruir por terra o que foi difundido como o “Deus das lacunas”: a divindade só entra(va) em cena para explicar o que até então a ciência não explica(va); mas tão logo esta esteja(tivesse) apta para ocupar a lacuna, Deus cede(ria) o lugar. Mas o que ora se verifica é que as lacunas, ao invés de diminuírem, estão aumentando … daí que, s.m.j. (contrário ao senso da Modernidade?), ao invés de menos o que se tem é cada vez mais Deus!?!

   De outro lado, desde o início dos tempos, para a maioria das religiões “deus” (ou os seus análogos), por definição, é inescrutável, inatingível, incognoscível, portanto, só pode minimamente ser apreendido mediante a negação sistemática, a base da teologia apofática[20]. As próximas citações, de Dionísio[21] (2015a), auxiliam a compreensão ao que se diz:

[…] à medida que o homem se eleva em direção aos céus, o olhar que ele dirige ao mundo espiritual se simplifica e seus discursos se abreviam. Do mesmo modo, quando penetrarmos nas trevas que estão além de todo pensamento, nossas palavras não serão apenas concisas: na verdade, a linguagem e o pensamento nos faltarão […] e quanto mais ele se eleva, mais a linguagem falta, e, quando tiver chegado ao final da ascensão, silenciará completamente e se unirá com o inefável (op. cit., p. 41);

[…] a Causa transcendente de todos os seres não é desprovida de existência, nem de vida, nem de razão, nem de inteligência. Ele não é um corpo. Ela não tem figura, nem forma, nem qualidade, nem quantidade, nem espessura […] Nenhuma dessas coisas pode ser atribuída a ela (op. cit., p. 47)

[…] Deus não é nem alma, nem inteligência; não é nem imaginação, nem opinião, nem razão, nem entendimento, não é palavra nem pensamento. Ele não pode ser nomeado ou compreendido […] (op. cit., p. 53); e,

Sendo Ele a Causa perfeita e única de todas as coisas, tem uma natureza absolutamente simples – livre e além de toda a limitação – e está além não somente de toda afirmação quanto de toda negação (op. cit., p. 54).

   À época que Pasqually escreveu o TRS – no coração do Iluminismo -, as promessas da Modernidade ecoavam com larga expectativa, aceitação e otimismo quanto ao futuro do conhecimento em si mesmo (passível de ampliação contínua) e as consequências (vistas positivas) para a civilização. Todavia, passados quase 3 (três) séculos, ganha força o ceticismo de Gleiser[22] que, em texto mais recente (2024), ressalta o imperativo das iniciativas sustentáveis – a ressacralização da natureza, o que inclui o ser humano. Já a mensagem de Dionísio, em que pese ser um objetivo a priori inalcançável, desde há tempos e ainda hoje, pelos mistérios que encerra, está muito presente nas Ordens Iniciáticas, como se pretende a Maçonaria. Talvez porque em razão dos significados ocultos, que geram uma busca sem fim, no que se equipara ao empreendimento científico, mais do que presente, Dionísio tem crescentemente ganhado adeptos. Assim, o que se observa é que dois caminhos que haviam tomado distância um do outro, hoje apresentam uma inusitada convergência no sentido ao inescrutável. Se a ciência (que se dedica à matéria, aos fatos objetivos, às evidências empíricas) e a fé[23] (a alma-espírito, da tal se ocupa a teologia) já andaram juntas (Unidade indissolúvel), e se depois ficaram às turras (desde o Renascimento-Modernidade: dualismo cartesiano), hoje parece que se reencontraram, pelo menos no que tange às possibilidades e ao alcance do que pode vir a ser conhecido[24], o que, em alguma medida aproxima a racionalidade de onde se acreditava distante, a exemplo de Ritos tal como o RER, mas sobretudo no que refere à resposta para a terceira das questões fundamentais: qual o sentido da vida? Visto por essa perspectiva o RER é, simultaneamente, Moderno e Antigo.  

   Dessarte, retornando à problematização inicial, a da insuficiência da categoria “posicionamento frente à Deus”, bem como das suas variáveis (teísmo, deísmo, agnosticismo e ateísmo) tradicionalmente adotadas pela Maçonaria mas que revelam algum desalinhamento frente à realidade, ora se traz à reflexão a síntese dos mitos teo-cosmogônicos apresentada por Gleiser (1997): um quadro de referências em formato de uma árvore de decisão que tem início a partir da pergunta fundamental:

  1. Existe um começo?
    1. Sim – há um início dos tempos e
      1. a criação
        1. se deu a partir da ação de um ou mais deuses
        1. surgiu a partir do nada, do vazio
        1. do embate entre o Ser (ordem) vs não-Ser (caos), ambos integrantes do Absoluto primordial;
    1. Não – o Universo sempre existiu, daí que
      1. não há mitos de criação, e a existência (o Universo)
        1. pode ser eterna, contínua
        1. ou ser rítmica, com infinitos ciclos de criação e destruição.

   Conforme se observa, a pergunta focal é redirecionada: não é se Deus existe ou não, seguida da que refere à natureza deste mesmo Deus, mas antes alude à natureza do Universo, se teve ou não um início? Ainda que as narrativas e os desdobramentos da árvore decisória guardem algumas semelhanças com “os posicionamentos frente à Deus”, o quadro de referências sugerido por Gleiser oferece opções combinatórias mais afins, conforme adiante ficará mais claro, com a realidade fática. Para Pasqually, por exemplo, Deus é coeterno com o Universo, se confunde com o Tudo (1.2), a causa primeira e necessária de Aristóteles; não obstante há um momento inicial (de emanação) quando então surgem os primeiros seres e entes, em forma espiritual e amalgamados[25] com o Tudo. Posteriormente, não por amor ou diletantismo, mas em resposta a circunstâncias específicas e alheias ao pensamento (projeto original), ocorrerá a emancipação de alguns entes e, então somente mais tarde, frente à nova contingência, haverá a criação (1.1) do universo material (o cosmos, a Terra e a vida humana), cuja dinâmica, sobretudo da vida humana, será determinada pelo embate apontado em 1.1.1.3. A criação, portanto, não é uma obra direta de Deus, mas mediada por um demiurgo que combina elementos platônicos e gnósticos. Ademais, ao longo da obra há passagens que sugerem o entendimento tipificado em 1.2.1.2. Como foi dado a observar, é chegado, então, o momento de avançar um pouco mais sobre a contribuição de M. de Pasqually.

   Martinez de Pasqually (MP), a seu modo e conforme adiante ficará mais claro (na sequência desta série), traz a sua própria resposta às questões fundamentais; assim, “O Tratado da Reintegração dos Seres” (Pasqually, 2022) é, também, a apresentação da física e da metafísica de Pasqually que, sobretudo pelo empreendimento de J. B. de Willermoz (JBW) e L. C. de Saint-Martin[26], posteriormente foram incorporadas ao RER. E é importante não perder de vista: O Tratado da Reintegração dos Seres (TRS) foi concebido no contexto da Maçonaria (Ordem) dos Elus Cohen, exclusiva de MP; todavia, com a morte inesperada deste, bem como a ocorrência de outros eventos, JBW percebeu a oportunidade de criar uma nova Maçonaria, a Retificada – mais detalhes sobre este tema podem ser vistos em Pinheiro (2022)  E para tal foi necessário não só esclarecer pontos obscuros[27] do TRS como, por se tratar de obra incompleta, complementá-la (a partir de conjecturas) e adaptá-la ao novo empreendimento, um Rito assumidamente cristão; empresa levada a cabo por JBW e outros.

   Por oportuno, um parêntese: desde os precursores, muitos estudiosos têm se dedicado, a fundo, com vistas a desvelar as mensagens escamoteadas por entre as linhas do TRS, assim como a sua lógica interna, as lições e mesmo as recomendações que sugere. Ou seja: todo o foco é dirigido sobre a obra, pelos Maçons Retificados, Iniciados em outras Ordens e estudiosos em geral. Ademais, desde que o cristianismo foi estabelecido como um dos pilares do RER, e por extensão o templarismo como símbolo axiológico, praticamente todas as reflexões (e aqui refiro tão somente ao RER) passaram a orbitar no entorno do eixo cristianismo-templarismo.

   Nesta série de ensaios uma nova estratégia é proposta, que se não exclui a primeira, ao redirecionar o foco amplia o espectro da visão e, por consequência, traz novos entendimentos. Afinal, em meio às tantas cosmogonias e teogonias existentes à sua época, não seria o caso de primeiro (ou mesmo simultaneamente) perguntar por que MP teria decidido por escrever a sua própria versão? Excluída a hipótese da vaidade e do orgulho, pois seria um contrassenso à essência da sua própria construção, uma das mais provável é a da ausência de uma cosmovisão que fosse ao encontro da sua percepção e entendimento, não só da natureza humana, mas também do processo civilizacional, cuja história em grande medida se confunde pela ocupação em responder as 3 (três) questões fundamentais. Com efeito, o TRS ao reinterpretar a cosmogonia judaica (mais especificamente o Gênesis), agrega e combina elementos de várias tradições; e talvez porque excessivamente ocupados com o selo cristão[28] que identifica o RER, no Brasil os estudos têm passado ao largo das digitais que identificam:

  • a presença do pitagorismo – a noção de Unidade, o significado e o peso dos números na economia da doutrina. Boyer (2018, p. 57-8), por exemplo, afirma: “Los números son para Martínez de Pasqually coeternos a Dios. “Dios siendo el ser necessario que existe por sí mismo, contiene por lo tanto toda eternidade, todo número””;
  • as concepções legadas pelos filósofos gregos conhecidos como “naturalistas” – das essências espirituosas (enxofre, sal e mercúrio) aos princípios elementares (fogo, água e terra), mas também a harmonia das esferas e a ideia do Deus necessário enquanto primeiro motor (de Aristóteles)[29], raciocínio posteriormente retomado e expandido por Sto. Tomás de Aquino[30], nas suas 5 (cinco) vias (por vezes referidas como provas) que, mediadas pela razão, não só atestam a existência de Deus, como o colocam como o ser necessário;
  • a visão (composição) atomista da realidade – “produto final” da concepção naturalista;
  • o platonismo – do mundo ideal-intangível-real vs mundo imperfeito-material-imagem; e, também,
  • o neoplatonismo. Nas palavras de Vivenza (2013, p. 30): “La única cuestión que debe importarnos es saber lo que piensa y afirma el Régimen Rectificado, y resulta que este Régime fundamenta precisamente sus doctrinas essenciales em las tesis neoplatónicas de Orígenes y agostinianas” – postulado do pecado original.

   Dessarte, uma leitura contextualizada do TRS permite identificar, para além do mito da Queda[31] e das classes espirituais – que têm o seu correspondente nas hierarquias celestes de Dionísio (2015b) -, a presença não só das digitais assinaladas, como de outras, a exemplo do gnosticismo ao postular o corpo enquanto prisão da alma, e também da cabala[32], inicialmente a judaica explorada pelo próprio MP (como se nota no peso e significado atribuído aos números), posteriormente acrescida, pelos pais fundadores, da cabala cristã[33]. De um lado nada surpreendente, porque largamente disseminadas no ambiente cultural de MP, mas por outro traz dificuldades ao conjunto da obra à luz da ortodoxia, sobretudo quando a ela se agrega a outra dimensão: o cristianismo. Somente com alargamento e flexibilidade de visão tantos elementos podem ser combinados, caso contrário são as incongruências que ganham a maior expressão.

   Ampliadas dessas perspectivas o TRS ganha novas dimensões: para além daquela mais visível – esotérica e transcendente -, pode ser apreciado como mais um esforço (um midrash) à luz das cosmovisões e das efervescências ideológicas da sua época, tudo ordenado no sentido a responder às questões fundamentais.

   E do outro lado, no que tange ao cristianismo, é preciso cautela. Porque MP deixou a sua obra inconclusa, ele não teceu considerações sobre essa matéria – mas tudo indica que o faria; assim, tudo o que a ela refere no contexto do RER é fruto da elaboração dos pais fundadores (cristãos católicos e reformistas) após a sua morte. Todavia, não há como conceber o cristianismo à margem da doutrina trinitarista, ausente no TRS. Não obstante os esforços de J. B. Willermoz, católico fervoroso, no sentido a conciliar e dar consistência lógica ao sistema (Regime, do primeiro ao sexto grau)[34], as dificuldades são evidentes; por exemplo, de regra, a ritualística, quer das Lojas Ordinárias ou formadas para as Recepções, requer, para o seu adequado entendimento, a leitura, a análise e a interpretação simbólica – vide, por exemplo, Pinheiro (2024d) –  realizadas a partir do Quadro Universal[35], este, uma síntese esquemática (desenho elaborado por L. C. de Saint Martin) baseada do TRS. Todavia, por desconhecimento, à simples menção ao “3 (três)” nas ritualísticas de pronto induz os desavisados à associação direta com à Trindade Cristã quando, salvo menção explícita, deveria ter a sua compreensão à luz da física e da metafísica pasqualina. Daí a referência anterior de que a ênfase no aspecto “cristão” do RER, embota a percepção da multiplicidade das fontes implícitas que inspiram e conferem a singularidade do TRS. Nem tudo o que afirma o TRS tem o seu correspondente direto no cristianismo, daí que sobre este nada deve ser buscado naquele, mas antes nas Escrituras; ainda que muito do caminho no sentido à Reintegração (doutrina do RER) siga a letra do cristianismo, mas também do estoicismo e de outras tradições, inclusive da Escola Cínica. Contudo, nem tudo são inconsistências e contradições: um dos maiores problemas teológicos do cristianismo (mas não do judaísmo) é a questão da teodiceia – da existência do mal frente a um Deus dito bom e amoroso com a sua criação – que, no contexto da Reintegração é mais facilmente resolvida pois, afinal, o homem não é sua criação direta.  

   Em meio às lacunas, às dúvidas e aos impasses é importante atentar para um período histórico conhecido como protocristianismo, também referido como “cristianismo primitivo”: o dos 3 (três) primeiros séculos da História do cristianismo sem Jesus, quando foram produzidas inúmeras concepções geradoras de grandes debates a partir dos acontecimentos havidos nos primeiros 33 anos – acerca da natureza de Jesus, da sua filiação, do seu retorno, se o cristianismo era um movimento à parte ou um ramo do judaísmo, etc. Questões que só começaram a ser definidas a partir do I Concílio de Nicéia[36] com a edição, entre outras deliberações, do Credo (documento fundador do cristianismo) e outros que viriam a dar estrutura ao que Chevitarese (2024) denomina de “autoproclamada ortodoxia cristã” (op. cit., p. 95) – a base do catolicismo. Assim, porque Religião e Maçonaria ocupam campos distintos, mesmo se declarando um Rito cristão, o RER não se obriga a seguir os cânones, nem da Igreja Católica e tampouco das demais denominações; deste modo, no contexto Retificado, também ao cristianismo deve ser aplicado o alargamento e a flexibilidade de visão já mencionadas.

   É importante não perder de vista que, se sob ocupação romana à época do surgimento do cristianismo, desde há 3 (três) séculos, quando conquistada por Alexandre, o Grande da Macedônia, a Palestina sofria a aculturação helenística; nada mais eloquente desta expressão cultural do que o fato de o Novo Testamento ter sido escrito em grego, e não em hebreu ou aramaico. Ademais, a região era passagem obrigatória entre 2 (dois) dentre os mais importantes polos econômicos, políticos e religiosos do período: o Egito e a Babilônia. Portanto, a Palestina era a mais evidente expressão do multiculturalismo. Entretanto, passado o tempo, lembrando que a ocupação romana se estendeu até o séc. V, as tintas gregas serão matizadas. Assim, no que tange à doutrina da retificação há dois ambientes (espaços-tempos) possíveis e entre os quais, com a devida cautela[37], o trânsito é admitido: 1) quando apreciada no ambiente do protocristianismo, é natural que os tons e as referências gregas (ideais, valores, usos e costumes, autores, etc.) ganhem maior relevância, com destaque à liberdade e à flexibilidade de pensamento sem prejuízo à lógica; 2) mas se considerado o período pós-niceno (católico), é também natural que a pigmentação romana ganhe maior expressão; ademais, porque já instituída a ortodoxia, algumas ideias e autores, considerados heréticos, a rigor e em princípio, estarão proscritos de toda e qualquer consideração.  

   Em síntese: ao ampliar a visão e estabelecer paralelismos e analogias com a evolução do pensamento filosófico-científico, bem como descolar do cristianismo católico, a leitura e o entendimento do TRS, bem como dos seus comentaristas, não apenas se tornam mais compreensíveis, como têm ampliado o seu alcance e público, pois nem tudo é esotérico e transcendente como à primeira vista é dado a perceber, mas antes, entre tantas, mais uma abordagem no curso da trajetória humana.

Referências Bibliográficas

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Notas

[1] Mestre Maçom. O autor não expressa o ponto de vista das Lojas, Obediências ou Potências das quais participa, mas tão somente exerce a sua liberdade de pensamento e expressão, daí porque muitas vezes comunica na primeira pessoa do singular. E-mail: ivan.pinheiro@ufrgs.br. Por oportuno eu agradeço a leitura da versão preliminar deste texto realizada pelo Irmão Lucas Vieira Dutra, Mestre Maçom do Quadro da ARLS Presidente Roosevelt, 75, GLESP, Oriente de São João da Boa Vista. Porto Alegre-RS, 11.05.24.      

[2] No Brasil, um Estado laico, o que se observa é um caleidoscópio religioso; todavia, dado que a tradição dominante se expressa com as cores do vetor judaico-cristão, neste texto, salvo menção em contrário, “religião” corresponde ao construto evocado pelo referido vetor.

[3] 1710? – 1774.

[4] Sigla utilizada para referir tanto ao Regime quanto ao Rito Escocês Retificado, distinção que, quando necessária, se fará no corpo do texto.

[5] Pelos mais diversos povos, sem que muitos tivessem tido qualquer contato entre si; mas o que ora mais importa referir são os gregos, porque historicamente fundantes da civilização ocidental da qual somos herdeiros e em cuja cultura estamos imersos.

[6] 428/427 – 348/347 a.C.

[7] Nada surpreendente pois, quem, a não ser um seu semelhante (ao observador), dotado de vontade e força, poderia mover o sol e a lua, mas também manter fixas as estrelas? Quem, que não fosse dotado de sentimentos e noções de justiça, poderia punir e recompensar os observadores?

[8] Mas também alhures, salientando o que alguns autores (R. Guénon, A. Huxley, A. Faivre) identificarão como perenialismo (philosophia occulta ou perennis); a partir dos fenômenos dados à observação, a formação de narrativas e tradições (sabedoria) muito semelhantes, ainda que dos povos não se tenham registros que atestem o estabelecimento de contato entre si.

[9] Por certo que não se está, aqui, aludindo à moderna compreensão de ciência, mas ainda enquanto abraçada pela filosofia.

[10] Sobre o tema, mais especificamente no Vol. IV, Cap. XIV – Príncipe do Tabernáculo, p. 87-176.

[11] A controvérsia alma vs espírito requer um texto à parte. Ademais, se alma, espírito, mente, psiquê, inteligência, razão, entre outros, não são termos intercambiáveis, também não são objetos de consenso conceitual. Quando oportuno, se observará mais rigor.

[12] A grafia, iniciada com a letra maiúscula, é para deixar claro que não se está, aqui, a referir à unidade numérica, aritmética, ao numeral 1 (um), algo que remete, por aproximação conceitual, à ideia do Uno, do Absoluto, à Mônada, à Célula Primordial, entre outras denominações encontradas na literatura.

[13] 1766 – 1844.

[14] Força de expressão, pois no domínio da ciência nada é definitivo. Alguém teria dito: “ela é um livro aberto, com vários autores e cuja história não tem fim”. O atual Modelo Padrão, por exemplo, enfrenta diversos questionamentos, isto é, as evidências empíricas não confirmam as previsões teóricas.

[15] De autor para autor as expressões variam: mente, alma, espírito, intelecção, psique, etc. Embora não sejam sinônimas, não cabe, no momento, entrar detalhes discriminatórios. Oportunamente o assunto será retomado.

[16] Destaques no original.

[17] Um dos primeiros pensadores e formuladores cristãos (160 – 220), apologista, se manifestou contra as heresias; é da sua lavra uma das primeiras referências à Trindade.

[18] Aurélio Agostinho de Hipona (354 – 430), teólogo, filósofo, um dos Pais da Igreja.

[19] Leia-se: paradoxos – teoria (dedução) vs prática (evidências empíricas).

[20] O Prof. Marcelo Andrade alerta para os riscos da teologia apofática que, no limite, induz ao ateísmo, o apego e a ênfase ao materialismo. Vide, p. ex., o podcast “A Verdade sobre a Cabala”. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=tB45z6vJab8. Acesso em: 10.05.24.

[21] Séc. V/VI. d.C.

[22] O foco de Gleiser são as fronteiras da ciência e das tecnologias, mas o desencanto com as promessas da Modernidade se estende a outros domínios, notadamente o social, no que tange ao acesso e à distribuição das riquezas, dos confortos e da qualidade de vida (saúde, educação, moradia, etc.). Em razão desse quadro, em meio a tantos (Heller e Fehér, 1998; Sennett, 1999) que abordaram o fenômeno a partir das diferentes perspectivas que oferece, Bobbio (1986) ressalta até mesmo a existência de ameaças à democracia.

[23] Não se faz necessário, aqui, o rigor terminológico.

[24] Mas enquanto para alguns trata-se de uma curiosidade, para outros é a confirmação de uma Verdade desde há muito revelada.

[25] Alguns dirão: no tempo em que tudo era energia pura.

[26] Embora estes tenham sido, sem dúvida, os seus maiores expoentes, o RER é um produto coletivo, produto de um amplo debate e negociações ocorridas em várias e longas reuniões. Assim, é em reconhecimento ao mérito que habitualmente somente a esses se alude, por vezes também denominados de pais fundadores.

[27] Alguns ainda persistem.

[28] Cabe lembrar que originalmente o movimento cristão, com a chegada do Messias, se apresentava como um desdobramento natural do judaísmo.

[29] 384 – 322 a.C.

[30] 1225 – 1274.

[31] Como não estabelecer paralelos, por exemplo, entre a segunda Queda (a ser analisada em futuro texto) e o Mito de Prometeu.

[32] Por oportuno, diz-se que MP era marrano, isto é, um judeu convertido a contragosto.

[33] Inaugurada por G. Pico della Mirandola (1463-1494).

[34] No RER há, oficialmente, 6 (seis) Graus: os 4 (quatro) primeiros, simbólicos, constituem a Ordem Externa (também referidos como Ordem Maçônica); os demais, a Ordem Interna (também referidos como Cavalaria Cristã). Não obstante, são largamente explorados na literatura mais 2 (dois) Graus: os Professos e os Grandes Professos. Sobre esses não se tecerão comentários, pelo menos não nos primeiros textos desta série, mas é certo, lembrando que uma das raízes do RER derivam da Maçonaria Elus Cohen, que alguns elementos do TRS terão o seu entendimento completado ou ressignificado para os chegarem a esse estágio, como de sorte ocorre na Maçonaria em geral: cada ascensão é um convite à releitura dos Graus anteriores, como sói acontece nas Escolas Iniciáticas.  

[35] Uma analogia para que se tenha a exata dimensão do Quadro Universal: este está para o TRS assim como a Árvore da Vida está para a Cabala (luriânica); é uma poderosa ferramenta visual para a compreensão textual do TRS.

[36] 325.

[37] Como afirma o dito popular: “não cabe misturar alhos com bugalhos”, evitando, assim, inconsistências e contradições.