Tim Harford (Financial Times, 09/11/22) escreveu bom artigo sobre por qual razão muitas vezes o melhor é simplesmente desistir. Serve para minha reflexão: devo ou não me aposentar?

“Sou uma lutadora, não uma desistente”, disse Liz Truss, ex-primeira-ministra do Reino Unido, um dia antes de desistir. Ela estava ecoando palavras proferidas há mais de 20 anos pelo parlamentar Peter Mandelson, embora Mandelson tenha mostrado o bom senso de expressá-las depois de ter vencido uma luta política, e não perdido uma.

É uma questão intrigante, no entanto. Ser um “lutador” não é inteiramente um elogio. Em certas circunstâncias, é uma qualidade premiada, mas não é uma palavra que eu usaria no meu currículo ou, mais particularmente, no meu perfil no Tinder.

Já quanto ao termo “desistente”, no entanto, não há grandes dúvidas. Trata-se, inequivocamente, de um insulto. É estranho, porque além de termos brigas demais no mundo, a frequência de desistências está longe de ser a ideal. Somos teimosos demais, apegando-nos a uma ideia, um trabalho ou um parceiro romântico, mesmo quando fica claro que cometemos um erro.

Há poucas ilustrações melhores disso do que a atual popularidade viral dos casos de “desistência discreta”, ou “quiet quitting”, quando jovens trabalhadores esgotados se recusam a trabalhar além das horas contratadas ou a assumir responsabilidades além das descritas em seus cargos. É um termo mais poético do que “fazer corpo mole”, como nós da Geração X teríamos chamado 25 anos atrás exatamente o mesmo comportamento. É também uma reação perfeitamente compreensível quando se está sobrecarregado e mal pago. No entanto, se você está sobrecarregado e mal pago, uma reação melhor na maioria dos casos não seria desistir discretamente, mas simplesmente desistir.

Não quero dizer isso como menosprezo à Geração Z. Lembro-me de, aos meus 20 e tantos anos, sentir-me totalmente infeliz em um emprego, e também me lembro do grau de pressão social para que aguentasse por mais alguns anos de forma a não deixar buracos em meu currículo. Um CV esburacado tem seus custos, é claro.

Mas, se você é um jovem formado, o mesmo vale para passar dois anos de sua vida em um trabalho que você odeia, enquanto acumula habilidades, experiência e contatos em um setor que deseja deixar. A maioria das pessoas me alertou para os custos de desistir; apenas os mais sensatos me alertaram sobre os custos de não desistir.

Toda desistência abre espaços para que se tente algo novo. Tudo para o que você diz “não” é uma oportunidade para dizer “sim” em outra frente.

Em seu novo livro, “Quit” (desista, em inglês), Annie Duke argumenta que, quando avaliamos se devemos ou não desistir de algo, nossos preconceitos cognitivos pesam na balança a favor da persistência. E o valor da persistência é superestimado.

Trata-se de algo óbvio para um bom jogador de pôquer — e Duke costumava ser uma jogadora de pôquer muito boa. “A desistência ideal pode ser a habilidade mais importante que diferencia os grandes jogadores dos amadores”, escreve, acrescentando que, sem a opção de desistir de uma mão, o pôquer não seria um jogo de habilidade. Jogadores experientes abandonam cerca de 80% de suas mãos na popular variante “Texas Hold’em”. “Compare isso a um amador, que vai ficar com suas cartas iniciais mais da metade do tempo.”

Quais são esses preconceitos cognitivos capazes de nos levar a persistir quando deveríamos parar?

Um deles é o efeito do “custo incorrido”, no qual vemos os custos passados como uma razão para manter determinado rumo. Se você está em seu shopping center de luxo favorito, mas não consegue encontrar nada a seu gosto, o tempo e o dinheiro gastos para chegar até lá deveriam ser irrelevantes. Mas não são. Exercemos pressão sobre nós mesmos para justificar o transtorno que já tivemos, mesmo que isso signifique mais desperdício. A mesma tendência se aplica desde relacionamentos até megaprojetos multibilionários. Em vez de reduzir nossas perdas, jogamos “dinheiro bom” em cima de dinheiro ruim.

(A falácia do custo incorrido é notícia velha para economistas, mas foi preciso o Prêmio Nobel Richard Thaler apontar que, se era comum o suficiente para ter um nome, também era comum o suficiente para ser considerada como parte da natureza humana.)

“viés do status quo” também tende a nos levar a perseverar quando devemos parar. Destacado em um estudo de 1988 pelos economistas William Samuelson e Richard Zeckhauser, o viés do status quo é a tendência a reafirmar decisões anteriores e a aferrar-se a manter o rumo em que estamos, em vez de fazer uma escolha ativa para fazer algo diferente.

Duke sente-se frustrada com a forma como retratamos essas escolhas de status quo. “Não estou pronto para tomar uma decisão”, dizemos. Duke, acertadamente, observa que não tomar uma decisão é, por si só, uma decisão.

Há alguns anos, Steve Levitt, coautor de “Freakonomics”, criou um site no qual as pessoas que se encontram diante de decisões difíceis podiam registrar seus dilemas, jogar uma moeda para ajudá-las a escolher e depois voltar para dizer o que fizeram e como se sentiram a respeito. Frequentemente, essas decisões eram de alta importância, como deixar um emprego ou terminar um relacionamento.

Levitt concluiu que as pessoas decidindo a favor de grande mudança (ou seja, os desistentes) ficaram significativamente mais felizes seis meses depois do que aqueles que decidiram contra a mudança (ou seja, os lutadores). A conclusão: se você chegou ao ponto em que está disposto a jogar uma moeda para ajudá-lo a decidir se deve desistir, você já deveria ter desistido há algum tempo.

“Sou um desistente, não um lutador.” Não é um grande lema político. Mas, como regra geral para a vida, já vi piores.


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Tim Harford (Financial Times, 09/11/22) escreveu bom artigo sobre por qual razão muitas vezes o melhor é simplesmente desistir. Serve para minha reflexão: devo ou não me aposentar?

“Sou uma lutadora, não uma desistente”, disse Liz Truss, ex-primeira-ministra do Reino Unido, um dia antes de desistir. Ela estava ecoando palavras proferidas há mais de 20 anos pelo parlamentar Peter Mandelson, embora Mandelson tenha mostrado o bom senso de expressá-las depois de ter vencido uma luta política, e não perdido uma.

É uma questão intrigante, no entanto. Ser um “lutador” não é inteiramente um elogio. Em certas circunstâncias, é uma qualidade premiada, mas não é uma palavra que eu usaria no meu currículo ou, mais particularmente, no meu perfil no Tinder.

Já quanto ao termo “desistente”, no entanto, não há grandes dúvidas. Trata-se, inequivocamente, de um insulto. É estranho, porque além de termos brigas demais no mundo, a…

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